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As razões das empresas que decidiram manter trabalho 100% remoto

Vagas remotas anunciadas no LinkedIn dos Estados Unidos caíram pela metade no último ano

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Alex Christian
BBC News Brasil

Os dias de trabalho totalmente remoto já passaram para a maioria dos trabalhadores.

De acordo com dados do LinkedIn de julho de 2023, compilados pela BBC Worklife, houve uma diminuição de 50% em relação ao mesmo mês do ano anterior nas vagas remotas anunciadas na plataforma nos Estados Unidos, e uma queda de 21,5% no Reino Unido.

No entanto, mesmo com muitas empresas passando a adotar exigências mais rígidas de retorno aos locais de trabalho, há algumas que ainda permanecem ou fazem a migração para o sistema remoto.

A tendência é mais comum em empresas tecnológicas, especialmente as startups, que são fortemente capacitadas para a tecnologia e que investiram para manter uma força de trabalho remota.

Vista de cima mostra uma pessoa sentada no chão, acariciando um gato enquanto trabalha com o computador no colo. No chão também estão jogados papéis, um calendário, uma caneca de café e um pedaço de pizza
Ilustração - Catarina Pignato

Durante a pandemia, por exemplo, o Airbnb adotou um programa no modelo "viva e trabalhe em qualquer lugar", que é mantido até agora.

O site de negociação de imóveis Zillow mudou para uma política permanente de trabalho em qualquer lugar em 2020, anunciando posteriormente que pagaria o mesmo salário aos funcionários que se mudassem de sua sede em Seattle.

Ou seja, há algumas empresas –tanto multinacionais como startups– que ainda adotam o emprego remoto.

Podem ser as últimas de uma "espécie em extinção". No entanto, a recusa das empresas em ceder à tendência do regresso ao escritório também pode servir como prova de conceito de que amarrar os trabalhadores ao modelo presencial como faziam antes da pandemia não é a única forma –nem mesmo a melhor forma– de trabalho.

'Forma melhor de trabalhar'

Durante o confinamento na pandemia de Covid-19, algumas empresas consideraram a mudança para o trabalho remoto como algo relativamente simples.

Fundada em 1995, a Vista produz itens de marketing físico e digital para pequenas empresas.

A sua força de trabalho de 6,7 mil pessoas inclui funcionários presenciais em fábricas de impressão na América do Norte e na Europa, assim como equipes espalhadas por vários departamentos financeiros, RH e design de produtos em 15 países.

Com sede em Venlo, na Holanda, a Vista adotou o modelo remoto para seus funcionários de escritório em agosto de 2020.

"Trabalhar em casa era inicialmente uma necessidade, mas não vimos isso como uma solução provisória", diz Dawn Flannigan, de Massachusetts, vice-presidente da Cimpress, empresa que controla a Vista.

"Em vez disso, pensamos que era uma oportunidade de adotar uma forma melhor de trabalhar e repensar a nossa estratégia de captação de talentos."

A mudança para o trabalho virtual significou revisar décadas de práticas presenciais, diz Flannigan.

"Queríamos seguir o caminho dos dias de trabalho não lineares, para que as equipes pudessem trabalhar com mais flexibilidade. Isso significava confiar mais na documentação, treinar os funcionários em ferramentas colaborativas e definir agendas melhores para que houvesse menos reuniões e formar novas equipes responsáveis por tornar as pessoas eficazes no trabalho remoto."

A Vista mudou o modo de trabalho dos funcionários para totalmente remoto
A Vista mudou o modo de trabalho dos funcionários para totalmente remoto - Reprodução via BBC News Brasil

Ao fazer isso, a Vista avalia que conseguiu desenvolver melhor o talento da equipe de funcionários, melhorar os resultados e aumentar o envolvimento dos trabalhadores, diz Flannigan.

Ela cita uma pesquisa interna de junho de 2023 sobre a força de trabalho, na qual 87% dos funcionários disseram que a política remota da empresa melhorou a "harmonia entre vida profissional e pessoal".

Sem dias fixos de trabalho presencial, a Vista também alterou a sua integração.

Seus antigos escritórios em todo o mundo foram transformados em centros de colaboração com mesas compartilhadas, permitindo que as equipes optem por ocasionalmente trabalhar pessoalmente e fazer reuniões.

"Nós projetamos um programa de 100 dias especificamente para treinar iniciantes na adaptação ao trabalho remoto", diz Flannigan.

"Isso inclui oportunidades de networking, onde incentivamos os membros da equipe a se reunirem em um espaço colaborativo, se apresentarem e construírem suas relações de trabalho."

Tomas Chamorro-Premuzic, professor de psicologia empresarial na Universidade College, em Londres, diz que grandes organizações que tradicionalmente dependem do trabalho presencial são provavelmente tão capazes quanto a Vista na criação de um local de trabalho remoto.

No entanto, acrescenta, ainda preferem frequentemente o padrão presencial, não porque sejam necessariamente limitadas pelo trabalho virtual, mas porque são, na verdade, limitadas por uma predisposição para espaços de trabalho físicos.

"As ferramentas, vantagens e motivos para uma empresa ser totalmente remota são os mesmos para um grande conglomerado e para uma pequena startup de tecnologia", diz Chamorro-Premuzic.

"Mas a principal diferença é que empresas mais antigas tendem a manter suas próprias tradições e hábitos."

Ou seja, as empresas que seguem o caminho da Vista são raras –mas ainda é possível encontrá-las. Isso pode significar apenas reavaliar a norma adotada do modelo presencial para o remoto.

Começando no modelo remoto

Novas empresas também estão lançando negócios totalmente remotos.

A startup de recrutamento TestGorilla, por exemplo, foi fundada em 2019 em Amsterdã já com modelo de trabalho remoto e, como a contratação nesses moldes aumentou durante a pandemia, a empresa também cresceu.

Outras empresas começaram com trabalho presencial, mas mudaram para o modelo remoto logo que começaram a crescer.

Riannon Palmer é fundadora da agência de relações públicas Lem-uhn. Lançada em 2021, inicialmente tinha um espaço de trabalho em Londres sob uma política informal flexível e híbrida, em que os funcionários escolhiam os dias de trabalho presencial.

Mas, em maio de 2023, à medida que a empresa crescia, Palmer decidiu estabelecer um modelo totalmente remoto. Posteriormente, adotou uma política em que permitia que os funcionários trabalhassem de qualquer lugar.

A escolha de não ter escritórios é filosófica, e não financeira, afirma Palmer. "É uma forma de tornar as pessoas mais felizes e mais engajadas em seu trabalho. Ser uma empresa remota significa confiar que os funcionários saberão onde trabalham melhor e permitir que sejam produtivos –seja lá o que isso signifique para eles."

Por ter um modelo de trabalho flexível, Palmer diz que a Lem-uhn tem uma vantagem na contratação, visto que a maioria das empresas de relações públicas decidiu retornar aos escritórios.

"Isso significa que você pode atrair talentos diversificados e de alto nível, mesmo quando você está apenas começando. Ser remoto significa ter mais inclusão e variedade nas equipes."

À medida que as empresas optam por endurecer suas medidas para retomar o trabalho presencial, a justificativa dos chefes se concentra frequentemente na alegação de que a colaboração presencial é fundamental para a aprendizagem e para o desenvolvimento, para o planejamento a longo prazo e também para a cultura do local de trabalho.

Mas Flannigan diz que esses recursos podem ser promovidos entre equipes distribuídas. "A cultura não é definida por paredes. É baseada em valores, na forma como você trabalha."

'Estar remoto é um modelo operacional'

Mais de três anos depois de a pandemia forçar a maior parte dos trabalhadres a ficarem em casa por necessidade, empregadores como a Vista e a Lem-uhn adotam o trabalho virtual como filosofia.

Por isso, tomaram decisões existenciais distintas sobre a forma como operam como empresas, explica Chamorro-Premuzic.

Isso significa que as organizações que priorizam o controle remoto geralmente compartilham qualidades semelhantes.

"Um modelo totalmente virtual tem maior probabilidade de agradar aos trabalhadores, que preferem a autonomia", diz Chamorro-Premuzic.

"E provavelmente devem ter mais confiança: não precisam ver onde e como as pessoas trabalham. Portanto, provavelmente tratarão os funcionários como adultos e lhes darão liberdade e flexibilidade, o que geralmente aumenta o desempenho."

À medida que o número de funções de trabalho em casa diminui, a procura ultrapassa largamente a oferta: os dados do LinkedIn nos EUA mostram que 44% de todas as candidaturas de emprego na plataforma em julho eram para funções remotas.

Chamorro-Premuzic afirma que essa relativa escassez significa que esses empregadores serão cada vez mais cobiçados no mercado de trabalho.

Em muitos casos, essas organizações apelam aos funcionários que não só querem trabalhar com flexibilidade, mas também querem fazer isso em empresas com visão de futuro.

"Isso vai além de apenas dizer 'trabalhe em casa e fique atrás de um monitor'", diz Flannigan.

"Estar remoto é um modelo operacional, não uma vantagem. É inspirador e capacitar as pessoas a trabalhar onde for mais produtivo para elas e medir isso por resultados, em vez de um local físico como um escritório."

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