Reforma Tributária ganha mais exceções no Senado, e relator faz concessão a estados

Relator incluiu regimes específicos para turismo, saneamento e concessionárias, além de elevar fundo regional a R$ 60 bi

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Brasília

Pouco mais de três meses após a aprovação na Câmara, o texto da Reforma Tributária ganhou exceções benéficas a setores e atividades, além de garantir a estados mais R$ 20 bilhões anuais em um fundo a ser bancado pela União.

O relator no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), apresentou parecer nesta quarta-feira (25) e incluiu regimes específicos para setores como turismo, agência de viagens, saneamento e concessionárias de rodovias.

No texto, ele propôs ainda uma nova categoria de alíquota para profissionais liberais como advogados e médicos que estão fora do Simples Nacional —em geral, sociedades com faturamento anual superior a R$ 4,8 milhões.

O relator da Reforma Tributária no Senado, senador Eduardo Braga (MDB-AM), em pronunciamento
O relator da Reforma Tributária no Senado, senador Eduardo Braga (MDB-AM), em pronunciamento - Roque de Sá - 25.out.2023/Agência Senado

O senador, por outro lado, decidiu dividir a classificação dos produtos da cesta básica. O objetivo é restringir a isenção total dos tributos a uma lista menor de itens, chamada de Cesta Básica Nacional, enquanto a cesta estendida teria apenas um desconto de 60% na alíquota.

Contribuintes de baixa renda poderão pedir a devolução do imposto por meio do chamado "cashback". O parecer também prevê o mesmo mecanismo na conta de luz dos mais vulneráveis.

Interlocutores do governo são cautelosos em analisar o efeito das mudanças sobre a alíquota do novo IVA (Imposto sobre Valor Agregado), que já era estimada entre 25,45% e 27%, uma das mais altas do mundo.

Novas exceções podem ampliar ainda mais a cobrança. Porém, os cálculos exatos ainda serão feitos por técnicos.

A avaliação é que o parecer tem pontos positivos, como a trava contra uma desoneração muito ampla da cesta básica. No entanto, o aumento das exceções vai na direção contrária da expectativa do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de que o Senado restringisse benesses concedidas pela Câmara.

O relator rebateu as críticas e ressaltou que "o ótimo é inimigo do bom".

"Esse relatório está mais enxuto do que veio da Câmara. Quem estiver fazendo essa conta [de que exceções foram ampliadas], queria que me mostrasse na conta", disse.

A previsão é que a PEC (proposta de emenda à Constituição) seja apreciada em 7 de novembro na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e em 9 de novembro no plenário do Senado.

O texto prevê a fusão de PIS, Cofins e IPI (tributos federais), e ICMS (estadual) e ISS (municipal) em um novo sistema será dual: parte da alíquota será administrada pela União por meio da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), e a outra, por estados e municípios pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).

Também será criado um Imposto Seletivo sobre bens e serviços considerados prejudiciais à saúde (como cigarros e bebidas alcoólicas) ou ao ambiente, à exceção dos produzidos na Zona Franca de Manaus.

As alíquotas definitivas de cada tributo serão detalhadas depois, em lei complementar. Porém, o relator introduziu uma trava: a carga sobre o consumo não poderá ser maior do que a média observada entre 2012 e 2021 —um patamar próximo a 12,5% do PIB (Produto Interno Bruto).

A reforma prevê uma cobrança padrão sobre a maior parte do consumo, uma alíquota reduzida (equivalente a 40% do valor cheio) para alguns bens e serviços e, agora, uma alíquota intermediária (equivalente a 70% da cobrança integral) para profissões liberais.

Na alíquota reduzida, foram contemplados serviços de saúde e educação. Braga decidiu ainda criar um regime específico para os serviços de transporte coletivo de passageiros rodoviário intermunicipal e interestadual, ferroviário, hidroviário e aéreo, que antes estavam com alíquota reduzida.

A mudança acaba beneficiando as grandes companhias aéreas, que haviam ficado de fora de qualquer tratamento diferenciado. A versão aprovada na Câmara contemplava apenas serviços de aviação regional.

Sobre as concessões de rodovias, Braga argumentou que o risco de elevação da carga poderia provocar protestos. "O Brasil quase quebrou com a greve dos caminhoneiros [em 2018], por causa de centavos no óleo diesel. Imagina aumentar 25% de IVA no pedágio dos caminhoneiros", afirmou.

O senador retomou ainda o artigo que prorroga incentivos fiscais a montadoras dos polos automotivos do Nordeste e do Centro-Oeste até 2032.

Coordenadora do Núcleo de Pesquisas em Tributação do Insper, Vanessa Canado disse que o aumento no número de exceções reduz os ganhos econômicos esperados com a reforma e impõe alíquota maior para os demais contribuintes.

"Aumentou a complexidade. Piorou o nível de eficiência econômica do tributo", disse ela, ressalvando que ainda assim o novo sistema será melhor que o atual.

Braga também criou uma alíquota de até 1% no Imposto Seletivo sobre a extração de petróleo e minérios, inclusive para exportação, o que deve afetar companhias como a Petrobras e a Vale. O argumento é que a exploração dos recursos causa "danos ao território nacional".

O presidente do IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás), Roberto Ardenghy, afirmou que a medida preocupa. Segundo ele, a tributação extra deverá ter impacto nos preços.

Nas discussões federativas, o relator elevou a R$ 60 bilhões o aporte anual do governo federal no FNDR (Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional). Governadores queriam R$ 75 bilhões.

Pela proposta, o aumento extra de R$ 20 bilhões será distribuído ao longo de dez anos. Em 2034, haverá um incremento de R$ 2 bilhões ao ano, até alcançar R$ 60 bilhões a partir de 2043.

O novo modelo inviabiliza a continuidade do uso de isenções e créditos presumidos, e o FNDR será usado por estados para conceder incentivos locais.

Pelo texto, 70% dos recursos serão distribuídos com base nos coeficientes do FPE (Fundo de Participação dos Estados), critério que beneficia o Norte e Nordeste, que têm menor renda per capita. Os outros 30% serão repartidos com base na população, o que deve contemplar Sul e Sudeste, com mais habitantes.

O texto aprovado pela Câmara previa valores progressivos, começando em R$ 8 bilhões em 2029 e subindo mais R$ 8 bilhões ao ano, até alcançar R$ 40 bilhões anuais a partir de 2033.

Em seu parecer, o relator também tenta colocar um ponto final na polêmica em torno do Conselho Federativo, instância que ficaria responsável pela arrecadação e distribuição do IBS. O parecer de Braga esvazia o Conselho e o converte em um comitê gestor.

Colaborou Eduardo Cucolo

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