Benefício a setor de eventos gera renúncia de até sete vezes o previsto, diz governo

Receita aponta perdas de até R$ 32 bilhões com Perse em 2023, ante estimativa inicial de R$ 4,4 bilhões

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Brasília

O benefício fiscal concedido ao setor de eventos vai gerar em 2023 uma renúncia de arrecadação de até sete vezes os R$ 4,4 bilhões indicados no demonstrativo de gastos tributários para o PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) de 2024, conforme projeção do governo Lula (PT).

Em nova estimativa, a Receita Federal apontou perdas tributárias entre R$ 17 bilhões e R$ 32 bilhões neste ano com a medida. O valor definitivo só será conhecido em meados de 2024.

O cálculo foi usado pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) como justificativa para pedir a extinção gradual do Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos) na apresentação da MP (medida provisória) que trata do tema ao chefe do Executivo.

Ministro Fernando Haddad (Fazenda) anuncia novas medidas em busca de equilíbrio das contas públicas - Pedro Ladeira - 28.dez.2023/Folhapress

"Tendo em vista o impacto fiscal do benefício, associado à ausência de estudos que demonstrem a relevância e a eficácia do gasto indireto, propõe-se a sua revogação", escreveu Haddad em mensagem endereçada ao presidente Lula.

No ato do anúncio das novas medidas econômicas, na quinta-feira (28), Haddad afirmou que a renúncia já alcançava R$ 16 bilhões anuais e que esse era um número conservador.

Criado de forma emergencial durante a pandemia de Covid-19, o Perse foi renovado neste ano até 2026. "Decidiu-se prorrogar por mais cinco anos com o seguinte compromisso, que esse programa ficaria limitado a R$ 4 bilhões ao ano de renúncia fiscal", disse.

"Acontece que estamos fechando o primeiro ano com mais de R$ 16 bilhões de renúncia fiscal. Isso é a parte informada pelo contribuinte, não temos noção do que não foi informado e não foi pago", continuou.

Na exposição de motivos, Haddad apontou também que a Receita Federal alertou durante a discussão com o Congresso Nacional que "os valores efetivamente usufruídos pelos contribuintes poderiam ser substancialmente maiores."

Durante as negociações, o governo teve que ceder aos parlamentares e manter benefícios a empresas aéreas e de entretenimento para conseguir aprovar outras propostas de interesse da área econômica.

As mudanças tributárias que levarão à extinção do Perse serão realizadas gradualmente nos próximos dois anos. Devido à noventena —regra que determina prazo de 90 dias para alteração de alíquota– alguns tributos voltarão a ser exigidos a partir de 1º de abril de 2024.

É o caso de CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).

Por causa do princípio da anualidade, as empresas ainda estarão isentas de pagamento de IRPJ (Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas) no ano que vem. A cobrança plena de tributos sobre o setor de eventos será retomada a partir de 2025.

Nos cálculos do governo, a extinção gradual do benefício irá somar R$ 6,01 bilhões aos cofres públicos em 2024.

Os representantes de setores afetados receberam as medidas anunciadas por Haddad com preocupação. Eles argumentam que as propostas geram insegurança jurídica e colocam empregos em risco.

No documento endereçado a Lula, Haddad também detalhou como será feita a reoneração gradual da folha de pagamento e ressaltou que a Constituição autoriza o estabelecimento de alíquotas diferenciadas "em razão da atividade econômica, da utilização intensiva de mão de obra, do porte da empresa ou da condição estrutural do mercado de trabalho".

O ministro disse ainda que a seleção de quem seria contemplado pelas novas regras "teve como norte a importância da política atual para os setores desonerados, de modo a não criar grandes distorções em relação ao que já estabelece a política e manter determinado nível de desoneração para aqueles setores em que há maior relevância do benefício."

Quanto à revogação da alíquota reduzida da contribuição previdenciária aplicável a municípios de até 142 mil habitantes, o titular da Fazenda destacou que a renúncia de receitas poderia agravar a situação deficiente do orçamento de seguridade social.

"Muitos dos municípios mais desfavorecidos economicamente têm a maior parte de seu capital circulante dependente dos valores pagos pela Previdência Social a seus habitantes. Portanto, em caso de insubsistência do regime, justamente as pessoas de baixa renda e os municípios menores teriam maiores prejuízos", afirmou.

A medida gerou reação da CNM (Confederação Nacional de Municípios), que criticou a decisão do governo de revogar o benefício sem apresentar alternativas. Em nota, a entidade disse que estuda medidas para atuação em favor dos municípios e que pressionará o governo Lula por respostas.

Para limitar as compensações tributárias decorrentes de decisões judiciais, Haddad traçou um panorama do cenário. Segundo o ministro, a expectativa é que, ao fim de 2023, seja ultrapassada a marca de R$ 1 trilhão em débitos compensados nos últimos cinco anos.

"Comparando-se o período de janeiro a agosto de 2023 com o mesmo período de 2022, houve aumento nominal de 14,3% dos valores compensados", disse.

Haddad aponta que, a partir de 2019, os créditos judiciais têm representado 38% dos créditos utilizados em compensações realizadas por meio do programa de pedido de restituição, ressarcimento ou reembolso e declaração de compensação. No período de 2005 a 2018, esse percentual era de 5%.

Na avaliação feita pela Fazenda, 90% dos créditos judiciais utilizados em compensação são relativos à exclusão do ICMS da base de cálculo dos tributos.

No pedido, o ministro argumenta que a medida busca "resguardar a arrecadação federal ante a possibilidade de utilização de créditos bilionários para a compensação de tributos".

A alteração valerá para decisões judiciais sobre créditos tributários acima de R$ 10 milhões, com prazo máximo de cinco anos para utilização desses créditos. Isso significa, por exemplo, que uma empresa que tem R$ 1 bilhão em crédito poderá fazer a compensação ao longo de cinco anos no valor de R$ 200 milhões anuais.

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