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Entenda a diferença entre dividendos e Juros sobre Capital Próprio

Câmara aprovou na sexta (15) a MP que altera a regra do JCP, muito utilizado pelos bancos para remunerar acionista

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São Paulo

A distribuição de dividendos e o pagamento do chamado JCP (Juros sobre Capital Próprio) são duas formas utilizadas pelas empresas brasileiras para remunerar seus acionistas.

O governo federal discute com o Congresso neste momento mudanças no JCP, mecanismo criado logo após o Plano Real, mesma época em que se optou por isentar a distribuição de dividendos aos acionistas. Essa isenção também deve ser revista no próximo ano.

De forma resumida, o dividendo corresponde à parcela do lucro que já foi tributada na empresa, com Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, e está isenta na distribuição para o acionista pessoa física.

O JCP é a parcela do ganho que não foi tributada na empresa. Quando esse valor é pago a pessoas físicas, incide o Imposto de Renda retido na fonte de 15%. Investidores institucionais e fundos de pensão, por exemplo, são isentos.

Ele funciona como uma espécie de dedução, ou seja, reduz a tributação sobre o lucro da companhia. Dessa forma, aumenta o valor que pode ser distribuído. Por isso, há uma complementaridade entre os dois mecanismos que, ao final, aumentam a remuneração e reduzem o imposto para o investidor.

Na prática, é como se o lucro das empresas fosse tributado de uma única vez. A parcela distribuída na forma de JCP, com IR na fonte de 15%. A parcela excedente, com IRPJ/CSLL de 34% (alíquota nominal nas grandes empresas de capital aberto).

Nos bancos, um dos setores que fazem uso mais amplo desse mecanismo (respondem por 30% do JCP pago), IRPJ e CSLL chegam a 40%.

O uso do JCP se aplica apenas às grandes empresas tributadas pelo lucro real. Em geral, aquelas com faturamento acima de R$ 78 milhões/ano.

Versão aprovada na Câmara

Mudanças no JCP foram aprovadas na Câmara nesta sexta (15), dento da MP que trata do impacto de subvenções de ICMS na arrecadação federal. A versão atual do texto mantém a dedutibilidade prevista hoje na lei, mas limita o alcance do que pode ser remunerado a título de JCP.

Poderão fazer parte do cálculo apenas recursos de fato transferido para as atividades da empresa. Com isso, o texto aprovado procura vincular o aumento da dedução à variação do patrimônio da empresa que esteja relacionado a investimentos e ao crescimento do negócio.

Por que o governo quer mudar o JCP

O JCP é uma versão brasileira de algo que também é utilizado em outros países, o chamado ACE (allowance for corporate equity, na sigla em inglês), que também permite essa dedução.

Como explica o economista Rodrigo Orair (atualmente na Secretaria de Reforma Tributária do Ministério da Fazenda) no livro "Progressividade Tributária e Crescimento Econômico", um primeiro objetivo do mecanismo era atenuar o efeito da inflação sobre os lucros das empresas, em substituição à correção monetária do balanço que vigorou antes do Plano Real.

Posteriormente, argumentou-se que o JCP, assim como o ACE, busca equiparar o tratamento tributário do financiamento das empresas via dívida (capital de terceiros), com despesa de juros dedutíveis da base de cálculo do IRPJ, e via aportes do sócio ou proprietário (capital próprio), criando também uma dedução.

Na exposição de motivos do projeto enviado pela Fazenda ao Congresso para extinguir o JCP, o governo afirma que esse objetivo não foi alcançado e que o único efeito que se busca é reduzir a carga de tributos.

Além disso, o país estaria incentivando a distribuição do lucro (via dividendo ou JCP) e não a retenção do dinheiro para reinvestimento com as regras atuais.

A Fazenda aponta ainda que a legislação permite artifícios contábeis, não existentes em outros países, para ampliar o uso do mecanismo.

Por fim, o governo diz que o JCP é pago a pessoas que representam menos de 2% da população brasileira, com um valor médio anual de R$ 30,6 bilhões de 2016 a 2020 declarados à Receita Federal.

Tentativas de mudança

O JCP é calculado aplicando-se a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo, atualmente em 6,55% ao ano) sobre o patrimônio líquido da empresa para calcular o valor a ser deduzido dos tributos sobre o lucro da empresa. Essa taxa visa simular o que seria o custo do endividamento.

A aplicação de uma TJLP de 6,55% ao ano sobre um patrimônio líquido de R$ 100 milhões, por exemplo, gera um desconto de R$ 655 mil sobre o lucro total que será pago como JCP —desde que dentro dos limites previstos na lei.

Em 2015, a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) propôs limitar o desconto da TJLP a 5% e elevar a tributação do acionista a 18%, mas a proposta não foi para a frente. Em 2021, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tentou acabar com o benefício fiscal, também sem sucesso.

Em entrevista recente à Folha, o economista Manoel Pires propôs alternativas para uma reforma do JCP. Entre elas, o cálculo com base no crescimento do patrimônio líquido e não mais sobre o PL total, o que prioriza o investimento, utilizar o essa variação em um período limitado, desvincular a dedução da remuneração do acionista (para incentivar o reinvestimento e não a distribuição) e avaliar como o mecanismo poderia ser utilizado para beneficiar micro e pequenas empresas.

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