Jabutis no PL das eólicas em alto-mar elevam conta de luz em 11%

Se Senado aprovar medidas, tarifa de energia teria um adicional de R$ 658 bilhões até 2050

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Brasília

A tarifa de energia dos brasileiros vai aumentar 11%, de uma vez só, caso o Senado aprove o PL (Projeto de Lei) das eólicas em alto-mar sem retirar as emendas que desvirtuaram a proposta. O baque tarifário ainda teria o efeito de elevar inflação, reduzir poder de compra das famílias e comprometer a competitividade dos produtos da indústria brasileira.

Os jabutis, como são chamadas no jargão político as alterações sem associação com a medida original, vão agregar um sobrecarga de R$ 658 bilhões, até 2050, no custo da energia para os consumidores.

Na média, serão R$ 25 bilhões ao ano de novas despesas que beneficiam diferentes setores empresariais, mas representam um aumento de 70% nos custos de subsídios a serem pagos pelos consumidor de energia.

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Vista da Usina Termeletrica Presidente Médici Candiota III, em Candiota, no interior do Rio Grande do Sul; PL que regulamenta as eólicas em alto mar prorroga subsídio para o carvão - 13.12.21 - Danilo Verpa/Folhapress

Os custos com subsídios, já previstos em R$ 405 bilhões no período, com essa nova leva, subiriam para casa de R$ 1 trilhão.

A projeção não considera o comportamento da inflação, que atualiza contratos do setor. Então, os valores tendem a ser superiores. No entanto, o estudo traz o custo a valor presente. Em números de hoje, seria como acrescentar, de uma vez só, R$ 287 bilhões na conta de luz.

As projeções foram feitas pela PSR, uma das mais qualificadas empresas de dados e modelagens de cenários do setor no Brasil, e divulgadas nesta quinta-feira (14).

O trabalho foi encomendado por oitos entidades da área de energia que se declaram preocupadas com a escalada de aumento no custo de energia promovida por medidas propostas e aprovadas pelo Congresso.

"Cada dia é um projeto de lei novo. Ficou muito simples jogar na conta de luz sem dizer de onde vai vir a receita", afirmou Marcos Aurélio Madureira, presidente da Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica), uma das entidades que patrocinam o estudo.

"Gera uma nova despesa, gera um novo incentivo para alguém, mas não traduz aquilo num aumento de receita, simplesmente joga no preço da energia. Isso está tornando o setor de energia inviável. O consumidor não consegue pagar. Isto é uma constatação de todas as entidades que estão juntas nessa iniciativa. Não podemos continuar desta forma", afirmou Madureira.

De acordo com ele, é importante que os consumidores saibam das iniciativas legislativas. "Muitas vezes um projeto chega ao Congresso e, rapidamente, é votado, sem avaliação. O que estamos fazendo aqui é trazer informações, dados e análises para que as decisões sejam tomadas."

No caso do texto que regulamenta as eólicas em alto-mar, foram apensados ao texto original 179 PLs. Ainda assim, ele foi aprovado na Câmara em 29 de novembro com larga margem, 403 votos a favor e 16 contra.

Até o PT, partido do governo, foi orientado a apoiá-lo. Como o texto foi proposto pelo Senado, voltou para análise da Casa vizinha.

As entidades têm feito contatos com senadores e o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Os primeiros sinais são de rejeição dos jabutis.

No entanto, já circula a informação de que uma MP (medida provisória) pode ser assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), na segunda-feira (18), trazendo parte dos jabutis que podem ser rejeitados no Senado.

A apresentação do estudo foi feita, em entrevista coletiva, pelo presidente da PSR, Luiz Barroso, executivo que já comandou a EPE (Empresa de Pesquisa Energética), responsável pelo planejamento do setor.

"Custos não são biodegradáveis, não desaparecem ao longo do tempo. Serão pagos", afirmou Barroso. "E, como ex-presidente da EPE, eu posso afirmar que muitos deles estão sendo criados por decisões que não fazem sentido técnico."

A PSR traçou estimativas de impacto financeiro para todos os nove jubutis incluídos no PL. A mudança que mais pesa vem da alteração da Lei da Eletrobras, que obriga a instalação de 8 GW (gigawatts) de térmicas a gás.

O PL preserva 4,25 GW como usinas a gás, mas prevê a separação da despesa com as obras e determina que o fornecimento de energia seja inflexível (fique a disposição em tempo integral). A alteração elevou o custo de R$ 151 bilhões para R$ 309 bilhões.

Os 4,9 GW restantes deixariam de ser ofertados em térmicas e passariam a ser gerados em PCHs (pequenas centrais hidrelétricas). A medida aumenta a conta para o consumidor com esse item de R$ 42 bilhões para R$ 182 bilhões.

A prorrogação por 36 meses para uma empresa renovável acessar o direito ao desconto de 50% pelo uso do fio de projetos de geração renovável faz com que uma despesa antes de R$ 116 bilhões suba para
R$ 229 bilhões.

A contração de PCHs no lugar de algumas dessas térmicas não melhorar a situação. Os custos desse item sobem de R$ 42 bilhões para R$ 182 bilhões.

A postergação do prazo para subsídio para MMGD (Micro e Mini-Geração Distribuída), em sua maioria projetos solares, tem impacto pesado também. No prazo atual, geraria um custo de R$ 36 bilhões, mas, com as mudanças, a despesa vai para R$ 137 bilhões.

A alteração com maior impacto ambiental, a manutenção de operação de usinas a carvão por um período mais prolongando, também pesa no bolso. O custo subiria de R$ 15 bilhões para R$ 107 bilhões.

A postergação do Proinfa teria uma elevação de R$ 45 bilhões para R$ 69 bilhões.

Dois custos são criados pelo PL: a construção de planta de hidrogênio na região Nordeste, pelas estimativas da consultoria adicionaria R$ 28 bilhões a conta de energia, e a obrigatoriedade de um projeto de energia eólica na região Sul custaria mais R$ 5 bilhões.

O grupo de entidades que tenta retirar os jabutis do PL representa toda a cadeia do setor elétrico.

Além da Abradee, que representa distribuidoras, estão na iniciativa: Abrace, que reúne grandes indústrias; ABCE, que representa concessionárias de energia elétrica; Abraceel, entidade dos comercializadores; Abrage, das geradoras de energia elétrica; Apine, dos produtores independentes; e duas entidades que representam consumidores —Anace e Frente Nacional de Consumidores de Energia.

"Um projeto de lei como esse das eólicas offshore, criado para promover a transição energética e o desenvolvimento sustentável das fontes renováveis de energia no Brasil, não pode se tornar um instrumento de manobras para contratações compulsórias, reservas de mercado e manutenção de subsídios a fontes de geração que já são competitivas", afirmou o presidente da Anace, Carlos Faria.

"Além disso, o atual governo não pode compactuar com esse tipo de atitude, tendo em vista o compromisso —assumido durante o período de transição, no final do ano passado— de reduzir os custos da energia. Infelizmente, com esse tipo de medida, estamos seguindo em direção contrária."

Estudos com projeções dependem de uma série de hipóteses, e os resultados mudam conforme os critérios adotados. A primeira projeção sobre os efeitos do PL, feita pela Abrace Energia, entidade que reúne grandes consumidores, estimou que o custo das medidas chegaria a R$ 39 bilhões.

A diferença vem da metodologia e das premissas. Enquanto a Abrace avaliou o PL como um todo, a PSR fez a comparação com a despesa de cada item. Entre as premissas que diferem está o valor do combustível. A PSR foi mais conservadora nas projeções.

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