Descrição de chapéu PIB juros Selic

PIB do terceiro trimestre perde força, mas consumo ainda garante taxa positiva

Atividade econômica tem leve avanço de 0,1%; resultado divulgado pelo IBGE vem acima do esperado

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Rio de Janeiro e São Paulo

O PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil perdeu força no terceiro trimestre deste ano, mas ainda apresentou leve variação positiva de 0,1% em relação aos três meses imediatamente anteriores. É o que indicam dados divulgados nesta terça-feira (5) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

O resultado ficou acima da mediana das estimativas do mercado financeiro, que esperava contração de 0,3%, segundo a agência Bloomberg.

Pedestres circulam em área comercial da rua Sete de Setembro, no centro do Rio de Janeiro - Eduardo Anizelli - 31.ago.2023/Folhapress

Pelo lado da demanda por bens e serviços, o PIB do terceiro trimestre contou com a contribuição positiva do consumo das famílias, que subiu 1,1% após avançar 0,9% no segundo trimestre.

O desempenho do consumo, conforme o IBGE, foi puxado pela retomada do mercado de trabalho e pelas transferências de programas sociais. Neste ano, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) recriou o Bolsa Família, que substituiu o Auxílio Brasil.

"O consumo veio um pouco mais forte do que o esperado. A gente esperava um crescimento, mas com alguma desaceleração em relação ao segundo trimestre. Acabou surpreendendo para cima", diz a economista Natalia Cotarelli, do Itaú Unibanco.

Ainda pelo lado da demanda, os investimentos produtivos na economia brasileira, medidos pela FBCF (Formação Bruta de Capital Fixo), caíram 2,5% no terceiro trimestre. Foi a quarta baixa consecutiva desse componente. O IBGE associou o resultado aos juros em patamar ainda elevado.

"É um reflexo da política monetária contracionista, com queda na construção e também na produção e importação de bens de capital. Todos os componentes que mais pesam nos investimentos caíram neste trimestre", disse a coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis.

Preocupação para 2024

A desaceleração do PIB de julho a setembro vem após a atividade econômica registrar desempenho mais robusto e acima do esperado na primeira metade de 2023. A perda de ímpeto preocupa parte dos analistas.

"Isso mostra o problema que a economia terá para crescer no próximo ano. A FBCF, por exemplo, está negativa, foi muito ruim", afirma o economista Claudio Considera, do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).

Segundo o pesquisador, além dos juros elevados, a incerteza sobre projetos como a Reforma Tributária também contribuiu para travar os investimentos.

"O que é preocupante é essa questão do investimento. Tem muito a ver com uma certa incerteza do empresário para investir. Não está muito claro o que pode acontecer com a Reforma Tributária, que pode ser descaracterizada. O empresário não sabe ainda o que vai pagar de imposto", diz Considera.

Desaceleração após impulso da safra

O PIB havia sido impulsionado pela agropecuária no primeiro trimestre, quando o crescimento chegou a 1,4%, e por parte dos serviços e da indústria no segundo, quando a alta foi de 1%. Houve revisões nos dados desses trimestres.

Inicialmente, os resultados sinalizavam um avanço maior de janeiro a março (1,8%) e uma alta menor de abril a junho (0,9%). O IBGE relacionou as duas revisões à agropecuária, já que o instituto incorporou novas estimativas do setor.

A variação de 0,1% no terceiro trimestre marca a terceira taxa positiva do PIB em sequência. Com o resultado, o indicador renovou o maior patamar da série histórica, com dados desde 1996. Também opera 7,2% acima do nível pré-pandemia, do quarto trimestre de 2019.

Pelo lado da oferta, 2 dos 3 grandes setores econômicos avançaram de julho a setembro. Tanto a indústria quanto os serviços registraram alta de 0,6%. A agropecuária, por outro lado, caiu 3,3%, sob impacto do fim da safra de soja.

A queda no campo, segundo Palis, era esperada com o fim da colheita. A pesquisadora do IBGE avaliou que 2023 está sendo um bom ano para a agropecuária, que acumula alta de 18,1% até o terceiro trimestre.

Nos serviços, o instituto destacou os avanços de atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados (1,3%) e imobiliárias (1,3%). O comércio desacelerou para 0,3%.

"O crescimento de serviços dialoga bastante com o aumento no consumo das famílias. Ambas as séries se encontram nas máximas históricas", disse a economista Claudia Moreno, do C6 Bank.

Na indústria, o IBGE ponderou que o único crescimento mais acentuado foi registrado pelo setor de eletricidade e gás, água, esgoto e atividades de gestão de resíduos (3,6%). Houve influência do crescimento do consumo de energia.

"Está sendo um ano bom para o setor, sem problemas hídricos e com bandeira verde. Também foi muito quente, o que favoreceu o consumo de eletricidade e de água", apontou Palis.

Por outro lado, a construção, ainda na indústria, caiu 3,8% no terceiro trimestre. "Este ano não está sendo muito bom para a construção, que está sendo muito afetada por crédito e juros", afirmou Palis.

De julho a setembro de 2023, o Brasil ainda registrou sinais positivos no mercado de trabalho, de acordo com dados do próprio IBGE.

A geração de vagas de emprego formal e o aumento da renda média e da massa salarial foram vistos como fatores de estímulo para o consumo de bens e serviços.

O BC (Banco Central) até iniciou em agosto o ciclo de cortes da taxa básica de juros (Selic), mas analistas alertam que o reflexo dessa medida tende a aparecer com algum atraso na atividade econômica.

Com o aperto da política monetária e o fim do impulso da safra agrícola, instituições financeiras passaram a prever perda de fôlego para o PIB no terceiro trimestre. O que não aparecia na maioria das previsões era a variação positiva.

Alta próxima de 3% em 2023

Natalia Cotarelli, do Itaú Unibanco, diz que o PIB deve ficar na faixa de 0% a -0,1% no quarto trimestre. A projeção do banco para o acumulado de 2023 segue em 2,9%.

O C6 Bank, por sua vez, prevê alta de 3% neste ano –a estimativa tem leve viés de baixa. Já o BNP Paribas continua enxergando crescimento de 3,1% para a atividade econômica em 2023.

Nesta terça, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), reafirmou que a economia brasileira vai crescer 3% no acumulado do ano.

Carla Argenta e Matheus Pizzani, da CM Capital, afirmam que o consumo das famílias foi o grande destaque positivo do trimestre. A balança comercial brasileira também trouxe contribuições positivas, ratificando a importância do país na produção de commodities.

Já o recuo do investimento por quatro trimestres consecutivos acende um "sinal amarelo" sobre a capacidade produtiva nacional e torna o Brasil mais dependente do exterior para atender a própria demanda doméstica.

"A indústria local deve enfrentar um último trimestre e, especialmente, um 2024 difícil, com seus motores de crescimento doméstico e externo aparentemente comprometidos."

Em nota, a Fiesp (federação das indústrias de São Paulo) afirma que o "respiro" da indústria de transformação no penúltimo trimestre do ano, um crescimento de 0,1%, provavelmente não será suficiente para reverter o cenário de fraco dinamismo do setor no ano. No acumulado em 12 meses, o setor recua 0,2%. Para o ano, a entidade continua esperando crescimento do PIB de 3,1%.

David Becker e Natacha Perez, do Bank of America, afirmam que o resultado do trimestre passado reforçou as chances de um crescimento de 3% neste ano. Para 2024, a projeção é um avanço de 2,2%.

"A redução das taxas de juros e melhores condições do mercado de crédito deverão trazer resultados positivos para o próximo ano. O consenso [projeção da pesquisa Focus] deve subir dos atuais 1,5% nas próximas semanas."

Luis Otávio Leal, economista-chefe da gestora G5 Partners, revisou a projeção do ano de 2,8% para 3,0%, com expectativa de crescimento de 0,1% no quarto trimestre e de 1,9% em 2024.

"Continuamos com a expectativa de que o resultado para o 4° trimestre será positivo e que poderá ser favorecido pelo programa Desenrola de renegociação de dívidas, pelas festas de final de ano, pelos grandes festivais de música que ocorreram em novembro e pelo pagamento do 13°."

CÁLCULO DO PIB

Produtos, serviços, aluguéis, serviços públicos, impostos e até contrabando. Esses são alguns dos componentes do PIB, calculado pelo IBGE, de acordo com padrões internacionais. O objetivo é medir a produção de bens e serviços no país em determinado período.

O levantamento é apresentado pela ótica da oferta (o que é produzido) e da demanda (como os produtos e os serviços são consumidos). O PIB trimestral é divulgado cerca de 60 dias após o fim do período em questão, trazendo dados preliminares.

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