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Primeira Turma do STF reclama de juízes do trabalho e rejeita CLT para motorista de app

Moraes afirma durante voto que motoristas têm liberdade para aceitar corrida que desejarem e fazer seu horário de trabalho

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Brasília

A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) rejeitou por unanimidade vínculo de emprego entre motorista e aplicativo, enviou o tema ao plenário —para a análise de todos os ministros— e pediu ainda o levantamento das decisões da Justiça do Trabalho que desrespeitam a jurisprudência da corte.

O colegiado atendeu ao pedido feito pela empresa Cabify e cassou decisão do TRT-3 (Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região), de Minas Gerais.

O tribunal havia determinado que a carteira de trabalho do motorista fosse assinada, como as regras previstas na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

Ponto de encontro de passageiros que usam aplicativos de transporte no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo - Rubens Cavallari-12.mai.23/Folhapress

No recurso levado ao Supremo, chamado de reclamação, a empresa alegou, porém, que a decisão anterior ignorava o entendimento da corte constitucional sobre a validade da terceirização.

A defesa do aplicativo defendeu que a jurisprudência do STF "fixou tese no sentido de admitir outras formas de contratações civis, diversas da relação de emprego".

Os ministros Cristiano Zanin, Luiz Fux e Cármen Lúcia seguiram o voto do relator do caso, o ministro Alexandre de Moraes. Uma cadeira da turma está vazia desde que Luís Roberto Barroso assumiu a presidência do tribunal e Rosa Weber se aposentou. Cabe recurso na própria turma.

O relator afirmou, durante a leitura do voto, que os motoristas do aplicativo têm liberdade para aceitar a corrida que desejarem e fazer o seu horário de trabalho.

"Ele [motorista] tem liberdade de ter outros vínculos, atua em outras coisas, não se prende pelo vínculo da exclusividade", disse, ao acrescentar que esta é "uma nova forma que possibilitou o aumento de emprego e de renda".

Moraes também citou que, durante a pandemia da Covid-19, engenheiros e advogados procuraram os apps para complementar renda. Nessa situação, poderiam ser chamados de microempreendedores.

"Em que pese eu ter ficado conhecido como comunista de uns tempos para cá —socialista, comunista, esquerdista—, eu na verdade defendo a livre concorrência, o direito à propriedade", disse o ministro.

Em que pese eu ter ficado conhecido como comunista de uns tempos para cá —socialista, comunista, esquerdista—, eu na verdade defendo a livre concorrência, o direito à propriedade

Alexandre de Moraes

ministro do STF

Zanin afirmou que precedentes do STF já consagraram a liberdade econômica e de organização de atividades produtivas. O STF considera também lícitas outras formas de pactuação das forças de trabalho.

"Não vejo nesse caso uma relação típica de trabalho da CLT, mas outra forma de contratação que, eventualmente, pode merecer outra legislação que discipline a relação", afirmou.

Cármen Lúcia, por sua vez, afirmou ter preocupação com os trabalhadores chamados de "uberizados", que lidam com a falta de regulamentação específica e direitos sociais, o que, segundo ela, não significa adotar o modelo da legislação trabalhista.

Moraes já havia cassado a decisão do TRT-3 em maio, em decisão monocrática, agora confirmada pelos colegas. Contra a decisão, em tese, cabe outro tipo de recurso, chamado de embargos de declaração.

Não vejo nesse caso uma relação típica de trabalho da CLT, mas outra forma de contratação que, eventualmente, pode merecer outra legislação que discipline a relação

Cristiano Zanin

ministro do STF

O pedido de vínculo de emprego havia sido negado na 31ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, em abril de 2022. Em junho do mesmo ano, a 11ª Turma do TRT-3 determinou, por maioria de votos, o reconhecimento da relação.

A Cabify não atua mais no Brasil desde meados de 2021, quando, durante a pandemia, anunciou a decisão de encerrar o serviço no país.

Em outro caso sobre o tema da uberização, os ministros da Primeira Turma decidiram encaminhar a disputa para o plenário, onde atuam todos os integrantes. Trata-se de uma reclamação envolvendo motorista e o Rappi.

O objetivo é firmar um entendimento sobre o assunto e evitar que mais queixas do tipo cheguem ao STF. Neste caso, a Justiça do Trabalho também reconheceu o vínculo, e Moraes suspendeu o processo.

As reiteradas decisões dos magistrados trabalhistas levaram ministros a externar críticas. Segundo os integrantes da corte, há uma insistência de magistrados do trabalho em descumprir decisões da corte.

Os ministros requisitaram o levantamento dos casos. Fux defendeu envio de um ofício ao CNJ sobre o que chamou de "disfuncionalidade" e que sejam devolvidos todos os processos de reclamação para que se aplique a jurisprudência do STF.

Fux afirmou que "não é nada louvável" o número de reclamações contra decisões da Justiça do Trabalho "que se obstinam a não cumprir a decisão do STF".

"Nós temos tanta coisa a fazer. É um péssimo exemplo de descumprimento de decisão do Judiciário partindo do próprio Poder Judiciário. Temos um trabalho insano com essas resistências de tribunal de trabalho em não aceitar a jurisprudência do STF, e isso precisa de uma providência", afirmou.

Nós temos tanta coisa a fazer. É um péssimo exemplo de descumprimento de decisão do Judiciário partindo do próprio Poder Judiciário

Luiz Fux

ministro do STF

Moraes disse que, com o julgamento destes casos, os ministros "voltaram à discussão da reiterada desobediência e descumprimento pela Justiça do Trabalho das decisões do STF".

"Quase 40% das reclamações que recebemos são contra decisões da Justiça do Trabalho. A questão de, teoricamente, ideologicamente, academicamente, não concordar, não justifica a insegurança jurídica que vem gerando diversas decisões", disse.

O ministro acrescentou que o plenário da corte já decidiu em processos anteriores que a Constituição Federal não impõe uma única forma de estruturar a produção.

"O princípio constitucional da livre iniciativa garante aos agentes econômicos liberdade para eleger suas estratégias empresariais dentro do marco vigente. A proteção constitucional ao trabalho não impõe que toda e qualquer prestação remunerada de serviços configure relação de emprego", disse.

Ele também lembrou que o STF fixou a tese de que é lícita a terceirização de toda e qualquer atividade meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre o contratante e o empregado da contratada.

"Na terceirização, compete à contratante verificar a idoneidade, a capacidade econômica da terceirizada e responder solidariamente por descumprimento eventual de normas trabalhistas", disse.

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