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Chocolate mais caro? Fundos apostam alto no cacau e impulsionam preços recordes

Operadores de mercado aportaram US$ 8,7 bilhões em contratos futuros da commodity nas bolsas de Londres e Nova York, maior volume já registrado

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Susannah Savage
Londres | Financial Times

Os fundos de hedge, que se assemelham aos fundos multimercado no Brasil, correram para o mercado de cacau desde o final do ano passado, impulsionando uma alta recorde nos preços da matéria-prima do chocolate, que já estavam subindo por conta de colheitas ruins na África Ocidental

Especuladores fizeram aportes de US$ 8,7 bilhões (cerca de R$ 43 bilhões) em contratos futuros do cacau em Londres e em Nova York, apostando que os preços continuarão a subir, após a maior alta já registrada em dólares, segundo dados da Commodity Futures Trading Commission, agência do governo americano que regula os mercados futuros e de opções.

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Colheita de cacau em assentamento Dois Riachões, em Ibirapitanga, Bahia - Raphael Muller/Folhapress

As apostas, que renderam lucros exorbitantes para os fundos de hedge, ajudaram a elevar o preço em Londres da commodity, que fechou o mercado na última sexta-feira (16) com um recorde de 4.757 libras (quase R$ 30 mil) por tonelada, mais que o dobro do preço registrado há um ano.

Já os contratos futuros do cacau de Nova York dispararam para US$ 5.888 (R$ 29 mil) por tonelada, também uma máxima histórica.

Enquanto o mau tempo e as doenças que afetam as árvores de cacau nas principais regiões produtoras da matéria-prima do mundo, na África Ocidental, desencadearam a alta de preços, a corrida dos fundos de hedge agravou sua intensidade, segundo analistas, operadores de mercado e corretores.

Os fundos de hedge provavelmente têm hoje sua "maior exposição ao risco em relação ao cacau que já tiveram", diz Martijn Bron, que foi chefe global de negociação de cacau e chocolate da gigante de commodities agrícolas Cargill até 2022.

"Os fundos de hedge não são a causa do aumento", diz ele, "mas, em um ambiente de mercado com menor liquidez, eles podem amplificar movimentos de mercado fundamentados de forma extrema", completa.

Justin Grandison, diretor de corretagem de cacau no ABN AMRO Bank, lembra que houve "um fluxo forte de dinheiro em commodities agrícolas" após a crise financeira global. Mas muitos desses fundos foram "arrasados cerca de seis a oito anos atrás", depois que eventos climáticos inesperados e crises geopolíticas fizeram suas apostas azedarem. "Agora eles estão retornando", diz Grandison.

Hoje, a maioria são fundos sistemáticos que usam algoritmos para seguir tendências de mercado, afirma o especialista.

O cacau foi o maior contribuinte para os lucros dos fundos de hedge neste ano, de acordo com uma carteira compilada pela Société Générale, que visa simular uma estratégia típica no setor.

"Diversos operadores de mercado que não estavam negociando cacau há muito tempo agora entraram", diz Harold de Boer, diretor administrativo da Transtrend, um fundo de hedge quantitativo com sede em Roterdão, na Holanda.

Grandes processadores de cacau, que transformam os grãos em manteiga de cacau, estão lutando para encontrar suprimento suficiente para atender à demanda dos fabricantes de chocolate, alertam analistas e operadores de mercado.

A concentração das apostas dos fundos de hedge e a consequente volatilidade do mercado de cacau tornaram mais difícil para os processadores protegerem sua exposição às oscilações de preços, de acordo com Darren Stetzel, vice-presidente de commodities agrícolas da corretora StoneX.

Mas os preços mais altos nos mercados futuros ainda não afetam diretamente o fluxo dos produtores em Gana e Costa do Marfim, que juntos produzem a maior parte do suprimento mundial de grãos.

Os agricultores ganenses estão recebendo entre US$ 1.800 e US$ 1.900 (em torno de R$ 9.000) por tonelada de cacau e os produtores marfinenses, cerca de US$ 1.600 (R$ 8.000), de acordo com Fuad Mohammed Abubakar, chefe da Ghana Cocoa Marketing Company, órgão governamental que estabelece os preços praticados pelos agricultores. Na Costa do Marfim, Le Conseil Café-Cacao desempenha o mesmo papel.

Os preços hoje refletem vendas feitas entre 12 e 18 meses atrás, diz Abubakar. "Os preços atuais serão refletidos nos bolsos dos agricultores no início da nova temporada, no começo de outubro."

Mas, de acordo com Grandison, essas medidas de fixação de preços podem prejudicar a capacidade do mercado de responder aos preços mais altos atuais e atingir um novo equilíbrio entre oferta e demanda.

"Em anos passados, preços mais altos eram vistos como benéficos para o produtor e permitiam o reinvestimento. No entanto, com os preços estabelecidos pelos governos com base em vendas futuras para o ano, [os agricultores] estão perdendo oportunidades", diz ele.

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