Na pandemia, empresárias faturam com produtos sexuais para o prazer feminino

Criados por e para mulheres, itens vão de vibrador do tamanho de batom a lubrificante com jambu

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São Paulo

Negócios liderados por empresárias e voltados ao bem-estar sexual feminino ganharam fôlego na pandemia e já planejam, para os próximos meses, lançar mais produtos —como vibradores, géis e cosméticos, muitos com ingredientes naturais.

Além de ser impulsionado pelo distanciamento social, o mercado ganhou importância ao dar visibilidade a questões como o prazer da mulher, a falta de informações qualificadas sobre suas necessidades e os tabus que ainda repelem possíveis consumidoras.

 A empresária Marília Ponte, que lançou em agosto do ano passado o Bullet Lilit, em seu escritório no Tatuapé, em SP
A empresária Marília Ponte, que lançou em agosto do ano passado o Bullet Lilit, em seu escritório no Tatuapé, em SP - Gabriel Cabral/Folhapress


A questão despertou, inclusive, a atenção de grandes empresas. Na sexta (9), a Amaro lançou uma linha de "sexual wellness" composta por vibradores e lubrificantes, entre 50 produtos de nove marcas.

Segundo a empresa, a ideia é investir em um mercado com potencial de expansão, que vem ganhando mais espaço com a pandemia. A expectativa é ter um tíquete médio de R$ 800 para vibradores e R$ 69 para cosméticos.

Uma das marcas parceiras da iniciativa é a Lilit, comandada pela empresária Marília Ponte, 26, que investiu R$ 200 mil para lançar um vibrador em agosto de 2020. Oito meses depois, teve faturamento de R$ 460 mil reais, com alcance de 1.800 clientes. "Nunca se falou tanto de bem-estar sexual", diz ela.

Estabelecer uma ligação entre bem-estar e relações sexuais de qualidade faz sentido porque elas ajudam na disposição física e mental e podem até evitar problemas de saúde, diz Regina Navarro Lins, psicanalista e escritora.

Mesmo com esses benefícios, uma parcela das novas consumidoras —que não se sentia à vontade em ir até um sex shop físico— foi atraída pela facilidade das compras online, que dispararam na pandemia, afirma Marília.

A empresária diz que esse desconforto, da compra ao momento de usar, foi um tema recorrente nas entrevistas feitas com mais de 3.000 mulheres nas rodadas de desenvolvimento do vibrador —algumas disseram guardar o item em locais de difícil acesso, para evitar que ele fosse visto.

Foram essas pesquisas que indicaram que os planos de lançar "a Ferrari" dos vibradores não seria viável —já que muitas participantes queriam usar um vibrador, mas não sabiam por onde começar.

"Tivemos que dar um passo atrás e entender que a gente não ia conseguir posicionar um produto superdiferenciado porque ninguém ia entender o diferencial", diz Marília.

Como resultado, ela lançou o Bullet Lilit (R$ 289), um vibrador na cor bordô recarregável. "Ele é pequeno, potente e discreto, atributos-chave para muitas mulheres no seu primeiro vibrador."

Até 2010, produtos do mercado erótico voltados a relacionamentos tinham muito apelo, diz Paula Aguiar, consultora no segmento há 20 anos. "O setor cresceu em torno da mulher que queria apimentar a vida íntima", afirma ela, também à frente da Escola de Negócios Mercado Erótico.

Os meses de distanciamento proporcionaram uma oportunidade para mulheres conhecerem mais o próprio corpo, diz a especialista. "Isso também faz parte de uma transformação cultural em relação à sexualidade. A palavra-chave agora é naturalizar."

Em 2018, a artista plástica Heloisa Etelvina, 39, e a designer de moda Izabela Starling, 34, decidiram criar um sex shop online voltado ao prazer da mulher, a Pantynova.

"Nossa insatisfação era não nos sentirmos representadas. A gente queria falar do assunto de forma mais leve, bem-humorada, como se isso fizesse parte da rotina de autocuidado", diz Izabela. A marca assumiu para si a produção de conteúdo, vídeos e fotos do site, com identidade visual marcada por cores vibrantes, flores e folhagens.


Inserida em um mercado já aquecido, o aumento de vendas da Pantynova foi ainda mais favorável após a chegada da pandemia. Na comparação entre os anos de 2020 e de 2019, o crescimento da empresa atingiu a marca de 544%.

Em dezembro, a empresa lançou uma linha de lubrificantes (R$ 35,81 a R$ 54,90) livres de sulfatos, petrolatos e parabenos para competir com marcas comerciais, encontradas em farmácias —um deles, com jambu na fórmula. No primeiro mês, mil unidades dos géis foram vendidas. Além deles, seis novos vibradores e novos cosméticos estão a caminho.

Até influenciadores digitais, que antes não respondiam mensagens sobre parcerias, começaram a usar e falar sobre os produtos. "As pessoas tinham um certo tabu. Na pandemia, virou um assunto que rende like", diz Izabela.

As mulheres viveram uma repressão de sexualidade ao longo da história, com uma ideia de sexo ligada à procriação, diz Regina Navarro Lins.

"Prazer era para o homem. Essa mentalidade começou a se transformar depois da revolução sexual, mas essa mudança começou nos anos 1960 e ainda está em curso", diz.
Para a marca Feel, essa transformação também passa pelo diálogo com diferentes momentos da vida da mulher, incluindo gravidez, puerpério e menopausa.

O negócio lançou, em outubro, dois produtos que se esgotaram em dois meses —um gel íntimo com aloe vera (R$ 89,90) e um blend com óleo de coco que reduz pelos encravados, assaduras e irritações pós-depilação (R$ 77).

Em janeiro, a Feel foi selecionada para o programa de aceleração da GB Venture, do Grupo Boticário, mas ainda busca R$ 550 mil para aplicar em pesquisa e desenvolvimento com a expectativa de lançar dois produtos nos próximos 18 meses.

Segundo a fundadora, Marina Ratton, 35, a marca também vai participar de rodadas abertas de captação por meio da Wishe Women, grupo focado em startups lideradas por mulheres, que permite o investimento de pessoas físicas. "Precisamos de dinheiro para desenvolver, mas ainda é difícil ter investidores homens que se conectem a projetos como esse. Mulheres entendem melhor essa dor."

Marina Ratton, fundadora da marca de bem-estar sexual Feel
Marina Ratton, fundadora da marca de bem-estar sexual Feel - Paulo Liebert/Divulgação
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