Como ser seu próprio chefe e não misturar a pessoa física com a jurídica

Empreendedor individual precisa ter disciplina para fazer autogestão e manter rede de contatos

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São Paulo

Quem empreende sem funcionários e é seu próprio chefe precisa ter disciplina redobrada para gerir, ao mesmo tempo, tempo e dinheiro tanto da pessoa física quanto da jurídica.

“É difícil fazer isso na prática, mas empresa e vida pessoal são duas caixinhas distintas. Cada uma deve ter seu tempo e seu dinheiro”, diz Marcelo Nakagawa, professor de empreendedorismo no Insper.

Paola Poloni Cogo, 35, dona da Di Clô, empresa especializada em cinnamon rolls (rolinhos de canela), tem dificuldade de gerenciar o tempo.

“Eu trabalho com gastronomia, vendo aos fins de semana. De quinta a domingo é quando há mais pedidos, então é difícil administrar isso. A gente chega atrasado aos eventos da família”, diz.

Paola Poloni Cogo, 35, dona da Di Clô, empresa que produz cinnamon rolls (rolinhos de canela), em São Paulo 
Paola Poloni Cogo, 35, dona da Di Clô, empresa que produz cinnamon rolls (rolinhos de canela), em São Paulo  - Gabriel Cabral/Folhapress

Mas os problemas do empreendedor individual vão além da falta de tempo. Paola conta que já teve, por seis anos, um comércio de sapatos online e que não controlava bem a parte financeira. “Eu começava o processo e abandonava”, diz. Agora ela afirma ter procurado ajuda profissional para aprender sobre marketing, autogestão e finanças.

Um outro ponto importante para quem é chefe de si mesmo, diz Nakagawa, é o networking. Mesmo sem colegas ou funcionários, o empreendedor precisa, de alguma forma, buscar uma rede de contatos.

Foi isso que ajudou Camila Tyrrell, 45, dona da Tyrrell Desenvolvimento Humano, empresa de treinamento que trabalha em parceria com o RH de empresas, a seguir na ativa durante a pandemia.

“Antes, eu nunca precisei fazer marketing. Meus serviços eram muito no boca a boca, e assim me conheciam”, relembra a empresária, à frente da companhia há 12 anos.

Em tempos pré-pandêmicos, o foco era preparar líderes para se comunicar com seus funcionários, mas isso mudou com a crise. Camila ficou sem faturar nada durante seis meses e, então, aproveitou a proximidade com seus clientes para buscar soluções que funcionassem melhor em tempos de quarentena.

Uma delas foi fazer intervenções teatrais em reuniões de equipe. “Meus clientes me deram insights. Um deles disse que havia tantas reuniões remotas que as pessoas ficavam de saco cheio e não prestavam atenção, o que causava retrabalho.” Daí a ideia das interrupções com performances, para prender a atenção dos ouvintes e tornar o ambiente menos monótono.

“As boas relações que construí me permitiram ir caminhando. Meus clientes trocam ideia comigo. Às vezes me ligam pra conversar, sem ter a ver com trabalho.”

A rede de contatos a ajudou a recuperar parte do faturamento, hoje entre R$ 2.000 e R$ 3.000 por mês. Longe ainda dos cerca de R$ 15 mil de outrora, mas ela espera que, com o fim da pandemia, as cifras voltem a subir.

“Eu também melhorei na parte financeira. Antes eu misturava pessoa jurídica e pessoa física, aí não sobrava para reinvestir. Como não havia tanta diferença entre meu faturamento e meu lucro, por ser um serviço intelectual, eu não olhava muito para isso.”

Já Guilherme Luiz Lund Leitão, 59, dono da marca Hora de Chocolate, tem plena noção de seus custos e de sua capacidade de produção. Ele empreende sozinho desde 1990, quando tinha uma companhia de desenvolvimento de software. Mesmo assim, teve percalços ao mudar de área.

“Minha dificuldade são as vendas. Como na informática os clientes dependiam do meu sistema, eles me chamavam. Não precisava anunciar.”

Para impulsionar seu negócio, buscou ideias de outros empresários. “Melhorar a qualidade das fotos no Instagram foi uma ótima sugestão, e veio por meio de conhecidos, do networking”, afirma.

Quanto à divisão do tempo entre empresa e família, Guilherme, que é divorciado, faz questão de deixar ao menos uma tarde livre durante os dias úteis da semana para passar com a filha pequena. “Ela entende que tenho que trabalhar. Por ora tenho conseguido administrar isso, mas é preciso planejamento”, afirma.

A Hora de Chocolate existe há pouco mais de dois anos e fatura entre R$ 3.000 e R$ 4.000 mensalmente.

Um outro dilema comum entre empresários que tocam sozinhos suas operações é saber a hora de contratar alguém. Paola, da Di Clô, relembra de quando pensou que não daria mais conta do negócio sem ter ajuda.

“Um dia não consegui dizer ‘não’ para uma cliente, mesmo depois de já ter começado meu processo de produção. Aí o produto não saiu no padrão de qualidade que quero. Me desesperei e chorei. Pensei que ter alguém me ajudaria muito”, relembra.

Ela, entretanto, não contratou ninguém porque avaliou que ainda não tinha capacidade financeira para tal. Hoje, a Di Clô, que tem pouco mais de um ano, fatura cerca de R$ 3.000 por mês e quase tudo é reinvestido na empresa.

Para Vanessa Alves, que é consultora do Sebrae-SP, o empreendedor tem mesmo de basear possíveis contratações em sua gestão financeira, não no achismo. “É necessário fazer contas, saber quanto você teria de vender a mais para que valha a pena ter um funcionário”, afirma.

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