Ferramentas de inteligência artificial (IA) aumentam o risco de uma guerra nuclear e sua aplicação na indústria bélica pode deixar o mundo à beira da destruição.
A conclusão é de um relatório recente do centro de estudos americano Rand Corp.
O trabalho contempla usos militares de tecnologias de “machine learning” (aprendizado de máquinas) que também inspiram gigantes civis —em 2016, Google, Amazon, Microsoft e Apple investiram US$ 30 bilhões em pesquisas, diz a consultoria McKinsey.
Estão destacados os possíveis ganhos, como a maior precisão das armas e o potencial de mitigar erros humanos.
O potencial destrutivo, contudo, sobressai. Segundo o estudo, atribuir a sistemas de IA o controle sobre armas nucleares pode ser o primeiro passo para a extinção humana.
Nos meios militares, já há sistemas cujas redes imitam o cérebro humano e dispositivos capazes de aprender a andar, combater incêndios, evitar radares e tomar decisões a partir de algoritmos.
“Não é mais um cenário de filmes”, diz Andrew Lohn, coautor do estudo e especialista em IA para fins pacíficos, como identificar sons de baleias e prever placares de jogos de basquete.
Elon Musk, o bilionário que planeja colonizar Marte, concorda. Em março, o fundador da Tesla disse que os avanços em IA são a mais provável causa de uma 3ª Guerra Mundial.
“Eu estou muito perto da vanguarda em IA e ela me assusta pra cacete.”
Musk citou a tecnologia AlphaGo Zero, que aprendeu sozinha o jogo chinês de estratégia Go. Após três dias de “estudo”, a máquina derrotou o campeão mundial por 100 a 0.
As potências mundiais parecem concordar com ele.
Vladimir Putin, presidente da Rússia, já disse que essa corrida tecnológica vai decidir a liderança do mundo.
Entre outros projetos, seu governo planeja um submarino que, caso o país seja atacado, atravessa oceanos com uma ogiva para revidar.
Já a China, que ambiciona ser a líder mundial em IA até 2030, desenvolveu um algoritmo que pode ativar rede de drones militares, à semelhança dos enxames de abelhas.
Os EUA testam barcos autônomos que rastreiam e atacam submarinos a milhares de km. E, segundo os russos, já usam na Síria drones com mísseis capazes de rever curso e alvos sem ação humana.
'DEDOS NERVOSOS'
Como Musk, da Tesla, o relatório da Rand Corp conclama um “diálogo internacional urgente”.
Mas na quarta revolução industrial, um consenso não depende só de governantes, ponderam entidades como a Unoda (escritório da ONU para o desarmamento) e a Federação de Cientistas Americanos.
Como esses processos vêm sendo conduzidos em grande parte pelo setor privado, o debate terá de incluir acionistas.
Embora considerem inovações científicas benéficas, especialistas veem com preocupação o desenvolvimento delas com motivações militares.
A ideia é fixar regras e evitar riscos à dissuasão nuclear.
Esse equilíbrio tem um preceito simples: a garantia de retaliação imediata, com destruições de metrópoles, danos perenes sobre o meio ambiente e milhões de mortes.
A indisposição em correr esses riscos impediu que a disputa entre EUA e União Soviética evoluísse para um confronto durante a Guerra Fria.
Tecnologias inteligentes, porém, podem convencer o adversário de que está vulnerável. Isso fomentaria nova busca por igualdade e colocaria em dúvida o poder de reação, ampliando a predisposição a atacar.
“Sistemas autônomos não precisam nem matar para tornar uma catástrofe mais provável”, diz Edward Geist, pesquisador da Rand Corp, especialista em segurança nuclear e um dos autores do estudo.
Para ele, o emprego militar de IA “pode fazer líderes pensarem que vão ser derrotados caso hesitem, tornando os dedos mais nervosos ao gatilho”.
Disposição, medo e dissuasão são conceitos e sentimentos humanos, e sobram exemplos em que ações de pessoas foram decisivas para corrigir diagnósticos de máquinas.
Foi assim com o soviético Stanislav Petrov (1939-2017) em 26 de setembro de 1983.
O então tenente-coronel era o responsável por uma estação de rastreamento nos arredores de Moscou quando radares, alertas e sirenes denunciaram cinco mísseis partindo dos EUA em direção ao país.
À época, a União Soviética estava convicta de que seria atacada de surpresa pelos americanos, então sob o governo do republicano Ronald Reagan (1911-2004), cuja retórica incluía referir-se ao país como “império do mal”.
O russo, porém, estranhou que o inimigo tivesse escolhido iniciar o apocalipse com apenas cinco mísseis.
O protocolo previa ordenar imediatamente um ataque nuclear de retaliação, mas ele registrou alarme falso.
Petrov tinha razão: as máquinas haviam confundido com rastros de mísseis o que na verdade eram raios de sol refletidos por topos de nuvens.
Inteligência artificial em arsenais
REALIDADE
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NO PAPEL
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