Brasileira é personal trainer em academia feminina na Arábia Saudita

Permissão para mulheres se exercitarem é recente; escolas não tinham educação física para meninas

Flávia Mantovani
São Paulo

Em 2015, quando a personal trainer gaúcha Gabriela Delfino chegou à Arábia Saudita, não havia educação física para as meninas nas escolas e as mulheres não podiam frequentar academias de ginástica.

Hoje, os esportes estão liberados para as estudantes e algumas academias femininas receberam licença para funcionar. Moradora da cidade de Al Khobar, Gabriela, 29, tornou-se instrutora em uma delas.

A brasileira Gabriela Delfino em Al Khobar, na Arábia Saudita, onde mora
A brasileira Gabriela Delfino em Al Khobar, na Arábia Saudita, onde mora - Arquivo Pessoal

“Tenho que trabalhar noções básicas com as alunas, porque são mulheres que cresceram sem nenhum contato com o esporte e têm dificuldade de equilíbrio, de coordenação motora”, conta, acrescentando que o cenário está mudando para melhor.

“Tem muita mulher interessada em se mexer. Já existem grupos de corrida femininos, times de basquete, passeios ciclísticos”, conta.

Em janeiro deste ano, o príncipe herdeiro Mohammed Bin Salman permitiu que mulheres frequentassem estádios esportivos pela primeira vez em décadas, como uma das reformas de seu plano de modernização de um dos países mais conservadores do mundo.

Como o ambiente é exclusivamente feminino, dentro da academia as sauditas usam roupas de ginástica comuns. Para correr em ambiente externo, porém, vestem a abaya, túnica preta tradicional no país.

Segundo Gabriela, já existem abayas esportivas, adaptadas pelas próprias sauditas para melhorar a mobilidade na prática de exercício.

Ela conta que, assim como as academias, restaurantes, estádios e outros ambientes nos país são segregados entre homens e mulheres —muitas vezes, elas só podem entrar em áreas reservadas para famílias.

Menciona, também, que as sauditas recebem concessões, como lugar preferencial em filas de bancos e lojas e vaga reservada em estacionamentos. “Não vou discordar que a gente tem privilégios por ser mulher, como motorista que abre porta, carrega sacola. Mas isso me incomoda porque sou independente, gosto de carregar minhas coisas”, diz.

Seu maior problema, porém, era não poder dirigir. Tanto que ela tirou carteira logo depois que passou a ser permitido. “Eu me sentia muito dependente antes. Agora melhorou. Eu tinha medo de ser xingada ou agredida no trânsito, mas está tudo indo bem, me sinto respeitada”, diz.

Segundo Gabriela, a alta demanda gerou fila de espera para tirar carteira de motorista, mas ainda são poucas as mulheres que ela vê dirigindo nas ruas. “Algumas sauditas preferem a comodidade de manter um motorista. Outras fazem questão de tirar a carteira para ter essa escolha.”

Apesar da falta de liberdade para dizerem o que pensam, ela percebe, nas sauditas com as quais convive, a vontade de obter mais direitos. “Elas estão contentes com as mudanças que vêm acontecendo, mas querem mais.”

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