Descrição de chapéu The New York Times

Gorda, cachorra, cara de cavalo: é assim que Trump fala de mulheres

Presidente dos EUA ataca mulheres com críticas à aparência e comparação com animais

Washington | The New York Times

O presidente Donald Trump referiu-se à atriz de filmes pornô Stephanie Clifford como “cara de cavalo” num tuite na terça-feira (16), somando-a a uma longa lista de mulheres que ele já atacou com alusões humilhantes à aparência delas, zombarias sobre suas necessidades fisiológicas e comparações com animais.

O presidente lançou seu assalto verbal quando estava exultando perversamente com a decisão tomada por um juiz federal de rejeitar uma ação por difamação movida contra ele por Clifford, conhecida profissionalmente como Stormy Daniels.

O advogado da atriz reagiu chamando o presidente de “misógino repulsivo”. Clifford –que recebeu US$ 130 mil do ex-advogado de Trump para fazer silêncio sobre a relação sexual que alegou ter tido com Trump— respondeu no Twitter, chamando o presidente pelo apelido “Tiny” (“Toquinho”).

Combinação de fotos mostra a atriz Stephanie Clifford, conhecida como Stormy Daniels, e o presidente dos EUA, Donald Trump
Combinação de fotos mostra a atriz Stephanie Clifford, conhecida como Stormy Daniels, e o presidente dos EUA, Donald Trump - Brendan McDermid, Joshau Roberts/Reuters

O tuite de Trump chegou nos dias finais de um ciclo eleitoral parlamentar em que os candidatos republicanos já estão tendo dificuldade em atrair o eleitorado feminino. É pouco provável que a linguagem usada pelo presidente os beneficie.

Apesar de ser espantoso, o comentário do presidente sobre Clifford –que, numa autobiografia recente, fez uma descrição explícita da genitália de Trump— não chegou a representar uma anomalia para ele.

Trump já acusou mulheres de terem rostos “gordos e feios” e de afastarem os eleitores com seu visual. Chamou uma mulher de “canalha maluca e chorona” e disse que outra era uma “cachorra” com “rosto de porca”.

Ele disse que o intervalo que Hillary Clinton fez durante um debate presidencial em 2015 para ir ao banheiro foi “nojento demais” para ser comentado. Ele já zombou de mulheres frequentemente por estarem acima do peso.

“Esse discurso é o tipo de coisa que vem provocando o repúdio de eleitoras republicanas com instrução superior que votaram em Trump em 2016, mas vêm se distanciando dele”, comentou Debbie Walsh, diretora do Centro de Mulheres Americanas e Política na Universidade Rutger.

Descrevendo o comentário do presidente como coisa digna de adolescente, Walsh disse: “Não dá para continuar a ser o partido no poder se os eleitores que você procura atrair são homens brancos com mais de 60 anos”.

O recurso de Trump à zombaria de tipo adolescente ilustra por que até os republicanos animados com o reforço que receberam após a confirmação do juiz Brett Kavanaugh para a Suprema Corte continuam cautelosos em suas previsões para as eleições parlamentares: nunca se pode prever quando este presidente vai se desviar da mensagem desejada, como fez na terça-feira com Clifford.

“Dizer que isso é indecoroso vindo de qualquer homem, o que dirá do presidente dos Estados Unidos, é pouco”, tuitou o deputado republicano Ryan A. Costello, da Pensilvânia, que vai se aposentar. “E é evidente que esse comportamento incentiva garotos adolescentes a se sentirem autorizados a tratar garotas pelos mesmos termos. É tudo altamente embaraçoso.”

Alguns dos comentários de Trump foram feitos antes de ele ser presidente. Poucas semanas antes de sua eleição, os americanos ficaram sabendo que Trump havia se gabado de poder “agarrar as mulheres pela xoxota”. Desde que chegou ao poder ele continua a fazer comentários grosseiros sobre o corpo de mulheres, frequentemente testando até onde o público é capaz de tolerar o “vocabulário de vestiário” de um presidente.

Uma porta-voz da Casa Branca se negou a dar declarações para este artigo.

A seguir, alguns dos ataques mais chocantes do presidente contra mulheres ao longo dos anos.

Rostos de mulheres

Quando ataca mulheres, como fez com Stephanie Clifford em seu tuite da terça-feira, Trump muitas vezes critica o rosto delas.

Quando enfrentou seus rivais pela candidatura presidencial republicana, em 2016, Trump zombou na televisão do rosto de Carly Fiorina, dizendo que as pessoas não votariam na ex-executiva-chefe da Hewlett-Packard devido à aparência dela.

“Vocês podem imaginar isso como o rosto de nosso próximo presidente?”, disse Trump em entrevista à revista “Rolling Stone”. “Ok, ela é mulher e eu não deveria falar mal dela, mas realmente, pessoal, vamos lá. Fala sério!”

Mais tarde ele negou que estivesse aludindo à aparência de Fiorina, dizendo à CNN que estava falando da “persona” dela. Mas comentários semelhantes sobre outras mulheres têm sido uma constante em seu repertório.

Durante sua vendeta prolongada com a atriz de televisão Rosie O’Donnell, Trump a descreveu como tendo “rosto gordo e feio”. Em 2016 ele retuitou uma foto pouco elogiosa de Heidi Cruz, a esposa do senador republicano Ted Cruz, do Texas, um de seus rivais nas primárias. A legenda da foto: “Imagens valem mil palavras”.

Numa edição de 1992 da revista “New York”, Trump foi citado como tendo dito que a patinadora artística olímpica alemã Katarina Witt seria considerada bonita apenas “se você curte mulheres de pele ruim e corpo de jogador de futebol americano”.

Mulheres como animais

O presidente frequentemente expressa sua ira comparando mulheres com animais, em um esforço para desumanizar seus adversários que ele também emprega contra homens.

Depois que sua ex-assessora Omarosa Manigault Newman publicou um livro com revelações sobre a Casa Branca, “Unhinged” (Desequilibrado), Trump reagiu chamando-a de “aquela cachorra” e “canalha maluca e chorona”.

Não foi muito diferente da linguagem que ele usou no início dos anos 1990, quando enviou a Gail Collins, então colunista do New York Newsday, uma cópia de uma coluna que ela havia escrito. Collins, que hoje tem uma coluna de opinião no New York Times, recorda que Trump rabiscou vários insultos sobre a coluna, chamando-a de “cachorra e mentirosa” e dizendo que ela tinha “rosto de porca”.

Necessidades fisiológicas femininas

Num comício de campanha em dezembro de 2015, Trump chamou a atenção para o fato de Clinton ter feito uma pausa para ir ao banheiro durante um debate presidencial democrata anterior. Ele arrancou aplausos de seus partidários.

“Eu sei onde ela foi –é nojento. Não quero falar disso”, falou Trump. “Não, é nojento demais. Não falem, é nojento.”

Em agosto de 2015 Trump sugeriu que a jornalista Megyn Kelly, então da Fox News, tinha sido dura com ele quando estava mediando um debate republicano porque estaria menstruada. Na noite após o debate Trump disse: “Dava para ver que havia sangue saindo pelos olhos dela, sangue saindo por todo lugar.”

Já presidente e vivendo na Casa Branca, Trump, em 2017, sombou de Mika Brzezinski, da MNBC, dizendo que ela tinha “QI baixo” e que “estava sangrando muito de um lifting facial” numa reunião social em seu resort na Flórida na véspera do Ano Novo.

Na segunda-feira (15) Trump insinuou uma imagem perturbadora quando disse a jornalistas que cumprirá sua promessa de doar US$1 milhão a uma entidade beneficente apenas se puder testar “pessoalmente” o DNA da senadora Elizabeth Warren. E acrescentou: “Não será algo que vai me dar prazer”.

Peso e forma física

O mais comum talvez seja a fixação de Trump com a aparência geral das mulheres. Ele frequentemente utiliza a aparência delas para fazer pouco-caso de suas habilidades, inteligência ou eficiência, ou às vezes das três coisas. Atacar o visual de uma mulher tornou-se a resposta padrão que o presidente dá às suas críticas e rivais mulheres.

Em 2016, quando Jessica Leeds disse que Trump a apalpou em um avião na década de 1980, ele comentou: “Ela não seria minha primeira escolha, podem acreditar”. No caso de Natasha Stoynoff, ex-redatora da revista “People” que acusou Trump de tê-la assediado durante uma entrevista, Trump negou a acusação e disse: “Deem uma olhada na página dela no Facebook, vocês vão entender”.

Em março de 2012 Trump atacou a cantora e atriz Cher por ter criticado candidatos republicanos, dizendo no Twitter que ela deveria “parar com as cirurgias plásticas que dão errado e com as declarações negativas”.

Scott Reed, veterano estrategista republicano que preside questões políticas na Câmara de Comércio dos EUA, implorou com o presidente na terça-feira para não se distrair lançando invectivas contra mulheres, como fez no passado.

“Precisamos de uma dose forte de disciplina na mensagem vinda da Casa Branca nos próximos 20 dias”, disse Reed. “Sem isso, estas eleições parlamentares serão uma aposta de alto risco.”

Tradução de Clara Allain

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