Descrição de chapéu The New York Times

Reeleição de Justin Trudeau mostra polarizações no Canadá

Partido do premiê perdeu assentos no Parlamento e deve fazer aliança com sigla de esquerda

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Dan Bilefsky Ian Austen
Montreal | The New York Times

O Canadá é frequentemente visto como um modelo de harmonia. Mas a eleição de segunda-feira (21) sugere um país mais dividido.

Em grande parte da costa leste, o Partido Conservador teve dificuldades. Nas planícies do oeste, o primeiro-ministro Justin Trudeau e seu Partido Liberal foram barrados. Uma outra sigla, que defende a independência da província de Québec do Canadá, cresceu.

O premiê reeleito do Canadá, Justin Trudeau - Carlo Allegri/Reuters

O 43º pleito geral resultou na perda de assentos no Parlamento para o Partido Liberal de Trudeau: de 177 antes da votação para 157.

Em outras palavras: embora tenha vencido as eleições mais uma vez, o atual premiê não tem maioria absoluta, o que lhe impede de governar sozinho —lhe faltaram 15 assentos para tal.

Em segundo lugar vieram os conservadores, que elegeram 122 deputados.

O resultado das eleições ecoa divisões em outros países do mundo onde o regionalismo está se intensificando e a divisão urbano-rural aumenta.

O Reino Unido tem o brexit. Os Estados Unidos têm Trump. E, após a eleição no Canadá, separatistas nas províncias ocidentais estão novamente pedindo #Wexit, o movimento que quer separar a província de Alberta, uma espécie de Texas canadense, do resto do país.

"O regionalismo é uma das características definidoras do país, e isto ficou claro nestas eleições", diz Andrew McDougall, cientista político na Universidade de Toronto. "Os líderes políticos podem tentar superar as divisões, mas muitas vezes não há nada que possam fazer a respeito."

Shachi Kurl, diretor-executivo do Angus Reid Institute, empresa de pesquisas sem fins lucrativos, disse que os resultados mostraram que o Partido Liberal e o Conservador, que antes atraíam apoiadores de todo o país, não podem mais fazê-lo.

Os conservadores e seu líder, Andrew Scheer, político de carreira que é contra o aborto e fez comentários depreciativos sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo, foram desproporcionalmente apoiados pelos eleitores nas províncias do oeste do Canadá.

Os liberais de Trudeau foram eleitos em grande parte por eleitores das províncias do leste.

Ainda assim, embora a eleição tenha enfatizado as polarizações no Canadá, Trudeau conquistou um segundo mandato e uma vitória para sua agenda liberal em questões como mudança climática e direitos das mulheres e das minorias.

Sua vitória apertada, com os conservadores levando um pouco mais do voto popular, foi uma absolvição após uma campanha violenta. Ele foi incansavelmente atacado por acusações de que havia intimidado sua ex-ministra da Justiça, uma indígena, e sua imagem foi manchada pela publicação de fotos antigas dele fantasiado como uma caricatura racista.

Mas a perda da maioria que Trudeau conquistou em 2015, um resultado penoso, mostra que ele, pessoalmente, e não apenas sua plataforma liberal, é divisor, com grande parte de seu apoio emanando das áreas urbanas.

 

Muitos cidadãos urbanos e instruídos do leste se deliciaram com a imagem pública progressista de Trudeau, e seu talento para projetar uma face positiva do Canadá no cenário global.

Mas ele é uma figura odiada entre muitos conservadores ocidentais, que o consideram hipócrita.

O partido de Trudeau terá que governar com o apoio de siglas menores. A expectativa é que faça uma aliança com o esquerdista Partido dos Novos Democráticos. Juntas, as duas siglas vão somar 180 assentos. 

Poucas questões demonstraram mais claramente a divisão regional que a mudança climática, que galvanizou os eleitores.

Trudeau, com a intenção de polir suas credenciais ambientalistas, introduziu um imposto nacional sobre o carbono em seu primeiro mandato. Em uma tentativa de também satisfazer os eleitores de Alberta, província rica em petróleo, ele gastou bilhões de dólares do governo para ampliar um oleoduto de Alberta à costa do Pacífico.

Mas no final isso lhe trouxe pouco retorno político. Seu partido foi exterminado em Alberta e Saskatchewan, onde a plataforma dos conservadores contra os impostos do carbono foi bem aceita, e ele perdeu apoio na Colúmbia Britânica, onde a extensão do oleoduto enfrentou forte oposição.

Andrea Perrella, professor de ciências políticas na Universidade Wilfred Laurier, em Waterloo, província de Ontário, disse que as divisões regionais do Canadá se baseiam principalmente em questões práticas, e não ideológicas.

"Não é que as pessoas se mudem para Fort McMurray porque gostam da indústria de petróleo e gás e acreditam que a mudança climática é uma farsa. Você se muda pelo trabalho", disse ele sobre a cidade de Alberta, na região das areias betuminosas. "Se você pegasse a indústria de petróleo e gás e a colocasse no centro de Montreal, a população a apoiaria."

O regionalismo da eleição ficou especialmente proeminente em Québec, província de língua majoritariamente francesa, onde o Bloco Quebequense, partido expressamente regional que apoia a soberania do Québec, conquistou 32 assentos —uma façanha.

Há apenas alguns meses, o partido estava em frangalhos. Mas seu líder, Yves-François Blanchet, teve uma recuperação dramática ao explorar a política de identidade e se comprometer a defender os direitos dos quebequenses e da língua francesa em Ottawa.

Durante a campanha política, Blanchet criticou a interferência do governo federal nos assuntos de Québec e alertou para que o Executivo não contestasse uma lei local que proíbe juízes, professores e policiais de usar símbolos religiosos, como lenços de cabeça e turbantes, enquanto estiverem trabalhando.

A lei enfureceu os defensores dos direitos humanos em outras partes do país, incluindo Trudeau, que sinalizou que poderia contestá-la no tribunal.

No entanto, a eleição também mostrou que, diferentemente de outros países, o populismo anti-imigrante tem apelo limitado como plataforma nacional no Canadá, país vasto e escassamente povoado que depende da imigração.

O maior perdedor da eleição foi Maxime Bernier, líder populista que adota o apelido de "Mad Max" e pressionou contra a imigração e o que ele chama de "multiculturalismo radical" e "histeria da mudança climática". Seu Partido Popular foi excluído do Parlamento sem que nenhum candidato, incluindo Bernier, ganhasse um único assento.

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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