Descrição de chapéu Diplomacia Brasileira

Bolsonaro recua e decide enviar Mourão à posse de Fernández na Argentina

Presidente brasileiro tinha desistido de mandar representante para cerimônia, mas mudou de ideia

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Brasília e Buenos Aires

O presidente Jair Bolsonaro decidiu enviar seu vice, o general Hamilton Mourão, para a posse do presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández.

Foi a terceira vez que Bolsonaro mudou de ideia sobre a ida à cerimônia. Primeiro, ele disse que não iria. Após consultar sua equipe ministerial, decidiu enviar o ministro da Cidadania, Osmar Terra.

No último fim de semana, resolveu não enviar ninguém e disse que o embaixador brasileiro na Argentina representaria o país. Nesta segunda, pressionado por empresários e diplomatas, Bolsonaro recuou e decidiu mandar Mourão.

Segundo relatos à Folha, parlamentares, empresários e diplomatas pressionaram o presidente para que mudasse de postura, alegando que a ausência de um enviado poderia afetar o fechamento de futuros negócios entre os países.

O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, e o vice, Hamilton Mourão, cantam o hino nacional durante cerimônia no Palácio do Planalto nesta segunda (9)
O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, e o vice, Hamilton Mourão, cantam o hino nacional durante cerimônia no Palácio do Planalto nesta segunda (9) - Evaristo Sa/AFP

Bolsonaro disse que achou melhor mandar um representante “para não dar a entender que estamos fechando as portas para a Argentina”. Ele lembrou que o vizinho é o maior parceiro comercial do Brasil na América do Sul. 

“De comum acordo, resolvemos dar uma sinalização para Argentina, conversei com o Mourão e ele falou que era uma missão”, afirmou.  

Segundo o vice-presidente, ele foi chamado ao gabinete do presidente na tarde desta segunda, enquanto Bolsonaro estava reunido com uma equipe de ministros: Paulo Guedes (Economia), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), Jorge Oliveira (Secretaria-Geral) e Augusto Heleno (GSI).

Mourão disse não ter sido informado sobre os motivos que fizeram o presidente mudar de ideia, mas afirmou que ouviu de Bolsonaro se ele se importava de representá-lo na posse de Fernández.

"Eu vejo como gesto político de boa vontade com o novo governo argentino", disse à Folha

O vice disse ainda que o presidente pediu que ele levasse os cumprimentos e desejo de boa sorte ao novo líder argentino, mas não soube dizer se o presidente brasileiro telefonará para o colega. 

Mourão deve embarcar às 20h desta segunda para Buenos Aires. O evento será realizado na terça (10). 

O presidente disse que cogitou mandar o ministro da Economia, Paulo Guedes, mas depois avaliou que o vice seria mais adequado, dando mais peso ao gesto diplomático.

“É questão de economia, sim. Já está se falando há algum tempo que seremos pragmáticos”, afirmou. “Vamos continuar fazendo negócios com eles, para eles interessa fazer comércio conosco.”

Bolsonaro disse esperar que a relação entre os dois países “dê certo” apesar de discordar do viés ideológico de alguns integrantes da futura equipe de ministros de Fernández.

“Acho que dá para conviver. Analisando a equipe do presidente eleito, a gente sabe que alguns têm restrições àqueles nomes, pelo viés ideológico.”

Bolsonaro é crítico de Fernández por seu posicionamento político de esquerda e de proximidade com Cristina Kirchner, sua vice, aliada dos ex-presidentes brasileiros Dilma Rousseff e Lula. 

Após o resultado das urnas, no fim de outubro, o presidente brasileiro decidiu não ligar para o argentino para cumprimentá-lo pela vitória. Ele dirigiu uma série de críticas ao candidato eleito por ele ter declarado apoio à liberdade do ex-presidente Lula. 

O presidente havia desistido de enviar um representante após a ida do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ao país vizinho na semana passada. 

Segundo assessores presidenciais, Maia foi um dos que pressionaram para que Bolsonaro fizesse um gesto diplomático em direção à Argentina. Ele telefonou na tarde desta segunda para avisar o presidente da Câmara sobre a mudança de planos. 

Antes de viajar para a Argentina, na quinta-feira (5), Maia se encontrou com Bolsonaro e o comunicou que faria a visita. No sábado (7), ambos voltaram a se reunir no Palácio da Alvorada e, segundo assessores presidenciais, trataram do assunto. ​

Pela manhã, questionado sobre o assunto, Bolsonaro disse que ainda estava analisando a lista de convidados de Fernández para a posse e negou que a relação comercial entre Brasil e Argentina fosse sofrer qualquer alteração com a mudança de governo no país vizinho. 

"Estou analisando a lista de convidados. Quando eu assumi aqui, eu não convidei algumas autoridades também. E o nosso comércio com a Argentina continua sendo da mesma forma. Sem problema nenhum, não vai interferir em nada", disse ao sair do Palácio da Alvorada.

Irritado com o tema da pergunta, ele encerrou a entrevista. 

Nos últimos dias, o presidente foi informado por diplomatas brasileiros que a ausência de um representante brasileiro na cerimônia de posse teve uma repercussão negativa no país vizinho, o que poderia afetar negociações futuras.

No final de semana, Bolsonaro havia informado ao ministro da Cidadania, Osmar Terra, que ele não representaria mais o país na solenidade.

Como Maia já havia se reunido com Fernández na semana passada e transmitido uma mensagem ao argentino, Bolsonaro avaliou que o encontro já fora um gesto diplomático suficiente.

Na reunião com Fernández, Maia disse que Bolsonaro pediu para informar o eleito que o presidente brasileiro defende a cooperação entre os dois países e a preservação dos acordos comerciais.

Ausente na solenidade de posse, Bolsonaro romperá uma tradição. Será a primeira vez em 17 anos que um presidente brasileiro não participará da cerimônia no país vizinho, principal parceiro comercial do Brasil na América do Sul. 

Em 2002, o então presidente Fernando Henrique Cardoso não compareceu à posse de Eduardo Duhalde, nomeado pelo Congresso Nacional após a renúncia de Adolfo Rodríguez Saá.

Nos anos anteriores, no entanto, o tucano marcou presença nas cerimônias de Fernando de la Rúa, em 1999, e de Carlos Menem, em 1995. 

Duhalde assumiu na esteira da renúncia de de la Rúa, sucedido durante oito dias por Saá, após uma das maiores crises econômicas e sociais da Argentina. 

Ele deixou a Casa Rosada, na época, de helicóptero, em meio a um aumento da dívida externa argentina e pressionado por um movimento social que causou 39 mortes e deixou mais de 400 feridos.

O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, chegou a ser cogitado para representar Bolsonaro, mas o presidente desistiu porque o chanceler comparou, em entrevista à mídia local, Fernández a uma matrioska, com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva dentro.

Após a vitória do argentino, Bolsonaro afirmou que não iria a Buenos Aires para a cerimônia e também não cumprimentou Fernández, diferentemente dos presidentes dos Estados Unidos, Donald Trump, e do Chile, Sebastián Piñera, aliados do brasileiro e identificados com a direita.

Fernández é aliado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, ainda candidato, o visitou na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba. O petista cogitou comparecer à cerimônia de posse, mas acabou desistindo.

Durante a campanha eleitoral, Bolsonaro defendeu publicamente a reeleição de Mauricio Macri, o que foi avaliado como um erro estratégico pelo núcleo moderado do Palácio do Planalto, para o qual o mandatário deveria ter se mantido distante da disputa para não afetar a relação comercial entre os países.

Recentemente, Bolsonaro moderou o tom. Disse, na semana passada, que, apesar de não ter uma afinidade ideológica com o governo eleito no país vizinho, não rasgará contratos e manterá uma relação pragmática com a Argentina.

"Nós temos de honrar contratos. Não podemos rasgar acordos, porque perdemos credibilidade", disse.

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