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The New York Times Eleições EUA 2020

Como democratas vão se destacar em campanha sem corpo a corpo devido ao coronavírus?

Primárias entram em nova fase marcada pela ausência de contato e limitação de deslocamentos

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Matt Flegenheimer
The New York Times

Na sexta-feira (13), em vez de um discurso sobre os males americanos diante de moradores de Ohio ou da Flórida, estados onde ocorrerão prévias democratas em breve, Bernie Sanders fez um discurso sobre os males americanos diante de bandeiras num hotel em Vermont, estado pelo qual é senador.

Horas depois, o ex-vice-presidente Joe Biden segurou um celular e espremeu os olhos diante de uma câmera dentro de uma sala antisséptica situada num estado, Delaware, mas que ostentava a bandeira de outro, Illinois, cujas prévias ocorrem nesta terça-feira (17).

Durante esse “debate virtual”, ele perguntou se estava sendo transmitido ao vivo. Perambulou um pouco pelo espaço, como frequentemente faz sobre o palco, mas procurando não sair do enquadramento.

O ex-vice-presidente e pré-candidato democrata Joe Biden após falar sobre o coronavírus em Wilmington, Delaware
O ex-vice-presidente e pré-candidato democrata Joe Biden após falar sobre o coronavírus em Wilmington, Delaware - Saul Loeb - 12.mar.20/AFP

Biden reconheceu que, naquela transmissão, sua performance havia sido irregular, algo que, dessa vez, não foi culpa sua. “Lamento que este tenha sido um esforço tão desconjuntado”, disse ele, aludindo a uma série de falhas técnicas que ocorreram “por causa das conexões”.

As conexões. Elas são complicadas hoje em dia —para os candidatos, para os eleitores, para os americanos de todas as vertentes que estão socialmente distanciados.

E, com a campanha presidencial avançando por uma nova fase marcada pela ausência de contato e a limitação de deslocamentos devido ao coronavírus, o mundo político já tomou consciência do que está perdendo.

A política é tradicionalmente feita ao vivo, pessoalmente, e, apesar das proezas mais recentes de propaganda e arrecadação de fundos digitais, a era do smartphone não mudou esse panorama.

As selfies que se espalham pelas redes sociais foram feitas pessoalmente. As histórias que os candidatos relatam sobre os bons homens e mulheres dos Estados que acabaram de visitar geralmente dependem de eles terem encontrado esses bons homens e mulheres cara a cara.

Então, como ficamos hoje? O que vai vir agora? Quem podemos esperar que reinjete energia numa campanha? Alguém vai manifestar empatia visceral por videoconferência? Quem vai conseguir mobilizar as massas para alcançarmos as melhores práticas que evitem a transmissão do vírus?

“Ainda somos pessoas que precisam desse elemento humano”, ponderou Karen Finney, estrategista democrata de longa data e ex-conselheira de Hillary Clinton e Stacey Abrams. “Não existe nada que substitua eventos presenciais.”

O evento presencial mais importante da história, historicamente falando –ou seja, a eleição—, mergulhou em confusão.

Dois Estados, Louisiana e Geórgia, adiaram suas primárias devido ao coronavírus. Outros, entre os quais Flórida, Illinois, Ohio e Arizona, que votam nesta terça-feira (17), pretendem seguir adiante, porém.

Mas para os candidatos que competem nessas disputas, ser limitados a uma transmissão ao vivo via internet é um empecilho grave.

Apesar de suas muitas diferenças, todos os últimos quatro presidentes se distinguiram por uma capacidade de brilhar pessoalmente.

Barack Obama, com seus discursos elevados e inspiradores; Donald Trump, com seus comícios descontrolados; Bill Clinton e George W. Bush, pelo talento de formar conexões imediatas com eleitores em ambientes e situações menores, não ensaiadas.

Os três principais candidatos em 2020 estão sendo privados de algumas de suas forças políticas principais durante o hiato. No caso de Trump, os eventos públicos são quase um oxigênio para ele, mobilizando sua base e dando-lhe o feedback e a adulação ao vivo pelos quais ele tanto anseia.

Os melhores momentos de Joe Biden frequentemente ocorrem com os eleitores depois que ele deixa o palco, destacando sua empatia de modo melhor do que quando faz declarações públicas –e destacando também sua disposição de distribuir apertos de mãos, de ombros e qualquer outra coisa ao seu alcance.

(Essas interações com eleitores também podem levar a outros momentos que podem não ser benéficos para ele, como sua discussão carregada de palavrões com um operário em Michigan que sugeriu que Biden quisesse confiscar armas.)

No caso de Sanders, em parte graças à juventude e à habilidade técnica da base de apoio do senador, sua campanha talvez tenha sido a mais ágil e experiente a lidar com reuniões virtuais e eventos movidos por mídia social, já muito antes do surto de coronavírus.

Mesmo assim, Sanders agora se vê privado de uma vantagem crucial, na medida em que está perdendo para Biden no total de delegados: o entusiasmo e a presença de seus seguidores em seus comícios, algo que seus aliados dizem ser prova de que sua revolução encontra eco entre muitas pessoas, mesmo que os resultados das primárias nem sempre tenham confirmado isso.

A confusão criada pelo vírus acontece em um momento em que a corrida democrata tem apenas dois candidatos principais, ambos amplamente conhecidos.

Com Biden saindo à frente de Sanders em seu total de delegados, alguns democratas imaginavam que o ritmo da campanha fosse se acalmar um pouco nas próximas semanas e meses.

“Nosso campo de pré-candidatos se estreitou para dois indivíduos muito conhecidos, muito bem definidos, que estão presentes há muito tempo na política americana”, comentou Meredith Kelly, ex-diretora de comunicações da campanha presidencial da senadora Kirsten Gillibrand.

“Acho que isso terá menos impacto sobre a corrida presidencial do que sobre uma primária congressional, em que os candidatos são realmente desconhecidos.”

Tradução de Clara Allain

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