Navio-hospital americano com mil leitos está com apenas 20 pacientes

USNS Comfort atracou em Nova York para tratar pacientes que não estão com Covid-19

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Nova York | The New York Times

As expectativas em torno do navio-hospital da Marinha americana Comfort eram tão grandes que, quando ele chegou ao porto de Nova York nesta semana, multidões de pessoas, esquecendo momentaneamente as restrições do distanciamento social, comprimiram-se em Manhattan para terem um vislumbre dele.

Mas na quinta-feira (2) o enorme navio branco, que as autoridades prometerem que levaria socorro a uma cidade à beira da catástrofe, estava praticamente vazio, enfurecendo executivos dos hospitais da cidade. Os mil leitos do navio estavam quase todos desocupados, e sua tripulação de 1.200 membros, ociosa.

Apenas três pacientes haviam sido transferidos para o navio, disseram autoridades, apesar de os hospitais de Nova York estarem tendo dificuldade em encontrar espaço para os milhares de contaminados com coronavírus. Outro navio-hospital da Marinha, o Mercy, que atracou em Los Angeles, recebeu até agora um total de 15 pacientes.

Navio-hospital da Marinha americana Comfort atracado no distrito de Manhattan, em Nova York - Carlo Allegri - 30.mar.20/Reuters

“Para falar francamente, é uma piada”, comentou Michael Dowling, diretor do Northwell Health, o maior sistema hospitalar de Nova York. “Todo mundo pode dizer ‘obrigado por montarem estes lugares maravilhosos e abrirem estes espaços cavernosos’. Mas estamos em uma crise aqui, em um campo de batalha.”

O Comfort foi enviado a Nova York para aliviar a pressão sobre os hospitais da cidade, tratando pacientes com problemas que não sejam a Covid-19, a doença provocada pelo coronavírus.

Na semana passada o presidente Donald Trump saiu de nove dias de isolamento parcial na Casa Branca para viajar até Norfolk, Virgínia, para acompanhar pessoalmente a partida do navio para Nova York, dizendo que o Comfort desempenharia um “papel crítico”. A chegada do navio a Nova York na segunda-feira foi saudada como um dos poucos momentos de otimismo em uma época sombria para a cidade.

Mas a realidade vem sendo outra. Uma confusão de protocolos militares e obstáculos burocráticos vêm impedindo o Comfort de receber muitos pacientes.

Além de suas regras rígidas para impedir que pessoas contaminadas com o vírus subam a bordo do Comfort, a Marinha também está se negando a tratar toda uma série de outros problemas de saúde. Diretrizes repassadas aos hospitais incluíram um lista de 49 condições médicas que podem excluir um paciente de ser admitido no navio.

Ambulâncias não podem levar pacientes diretamente até o Comfort –elas precisam primeiro levá-los a um hospital da cidade para passarem por uma avaliação demorada, que inclui um teste de coronavírus, e então buscá-los novamente para levá-los até o navio-hospital.

Em última análise, disseram Dowling e outros, se o Comfort se recusar a aceitar pacientes com Covid-19, não restarão muitos pacientes que ele possa receber. E, dada a propagação forte da doença em Nova York, onde até quinta-feira (2) já havia quase 50 mil contaminados, separar os pacientes entre os que têm e os que não têm Covid-19 não faz sentido.

Para Dowling, a solução é abrir o Comfort para pacientes com coronavírus.

“É ridículo”, comentou. “Se vocês não vão nos ajudar a tratar as pessoas para as quais precisamos de ajuda, qual é sua finalidade?”

Questionado sobre as críticas expressas por Dowling, o Departamento de Defesa citou as declarações de Trump sobre o Comfort em seu briefing diário. O presidente disse apenas que o navio não aceitaria pacientes com o coronavírus.

Na noite de quinta-feira (2) o governador de Nova York, Andrew Cuomo, chegou a um acordo com Trump para levar pacientes com Covid-19 para o centro Javits de convenções, em Manhattan, outro local de atendimento alternativo operado pelas Forças Armadas e que possui 2.500 leitos hospitalares.

“Hoje pela manhã pedi que a urgência da questão fosse considerada, e o presidente acaba de me informar que concordou com o que Nova York pediu”, disse Cuomo em declaração à imprensa.

Não foi mencionada a possibilidade de fazer o mesmo com o Comfort.

O capitão Patrick Amersbach, comandante dos funcionários médicos a bordo do Comfort, disse em entrevista coletiva que suas ordens são, por enquanto, aceitar apenas pacientes que tenham tido resultado negativo para o vírus. Ele disse que se receber ordens de aceitar pacientes com coronavírus, o navio poderá ser reconfigurado para possibilitar isso.

“Se nossa missão mudar, faremos o que pudermos para cumprir essa missão”, disse.

Tradução de Clara Allain

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