Descrição de chapéu The New York Times

Por que todos falam de George Floyd, mas não sobre Breonna Taylor?

Técnica de emergência médica foi morta pela polícia em março deste ano

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Alisha Haridasani Gupta
The New York Times

Na sexta-feira (5), Andrea Ritchie, pesquisadora no Centro Barnard de Pesquisas sobre Mulheres, somou-se a milhares de outras pessoas nos EUA para participar de um protesto que pedia justiça para George Floyd. Ela entoou orgulhosamente o nome dele diante do Centro Barclays, no Brooklyn, em Nova York.

"Mas fiquei chocada porque não ouvi ninguém dizer o nome de Breonna Taylor em momento algum", disse Ritchie, referindo-se à técnica de emergência médica de Louisville, no Kentucky, que foi morta pela polícia em março, semanas antes da morte de Floyd.

Policiais irromperam no apartamento de Taylor, que era negra, enquanto ela dormia, durante uma investigação tarde da noite que usava um chamado "mandado sem aviso".

Manifestantes marcham em protesto contra as mortes de Breonna Taylor e George Floyd em Louisville=
Manifestantes marcham em protesto contra as mortes de Breonna Taylor e George Floyd em Louisville= - Bryan Woolston - 29.mai.20/Reuters

Seu namorado, Kenneth Walker, disse que pensou que alguém estivesse arrombando o apartamento, então atirou e feriu um policial. Os policiais retribuíram e atiraram em Taylor pelo menos oito vezes, em sua própria casa.

A mãe dela moveu um processo contra a Polícia Metropolitana de Louisville no final de abril, e pessoas começaram a ir às ruas da cidade para exigir justiça em maio. Nenhum dos policiais no caso dela foi preso ou demitido, mas o FBI está investigando o ocorrido.

Ainda assim, o caso de Taylor continua amplamente desconectado da discussão nacional que acontece em torno de Floyd —nenhuma celebridade se ofereceu para pagar por seu funeral ou colocou anúncios de página inteira nos jornais dedicados a ela, e poucas marcas lançaram campanhas em seu nome.

Em uma tentativa de recolocar a história de Taylor nas redes sociais, na semana passada usuários começaram a usar o hashtag #SayHerName (diga o nome dela). Mas até isso se transformou em #SayHisName (diga o nome dele), comentou Ritchie.

"Todas as vidas negras importam", disse ela, acrescentando que esse movimento deveria estar tentando abordar a brutalidade policial contra homens e mulheres negros e pessoas LGBTQ, que também enfrentam a violência dos agentes da lei.

"Não estamos tentando competir com a história de Floyd; queremos completar a história", disse Ritchie, que também é autora do livro "Invisible No More: Police Violence Against Black Women and Women of Color" (chega de invisibilidade: a violência policial contra mulheres negras e mulheres de cor).

A senadora Kamala Harris refletiu esse sentimento na quinta-feira (4). "Não podemos esquecer das mulheres negras em nossa busca por justiça", escreveu no Twitter.

A exclusão do nome de Breonna Taylor é a última manifestação de uma antiga questão: as experiências de brutalidade policial das mulheres negras quase sempre são deixadas fora do quadro, recebendo muito menos atenção da mídia ou da política.

Há anos, as mulheres negras enfrentam uma dupla discriminação, de gênero e racial.

Segundo um estudo de 2017 do Instituto de Pesquisas de Políticas para Mulheres, as mulheres negras continuam subrepresentadas no sistema político americano; as mulheres negras têm maior propensão a ocupar empregos que não têm benefícios e proteções cruciais; mais mulheres negras vivem na pobreza do que qualquer outro grupo; as mulheres negras experimentam taxas mais altas de violência de parceiros; e as barreiras de gênero no acesso a tratamentos de saúde são mais altas para as mulheres negras do que para as brancas.

A pandemia de Covid-19 aprofundou todas essas fissuras. O índice de desemprego entre mulheres negras está hoje em 16,4%, comparado com 15,5% para as mulheres em geral, segundo o Departamento de Estatísticas do Trabalho dos EUA. Isso as deixa em posições cada vez mais precárias.

No que se refere a interações com a polícia, as mesmas tendências raciais que se aplicam aos homens negros se aplicam às mulheres negras, disse Ritchie. As mulheres negras têm maior probabilidade que as brancas de ser atropeladas em semáforos de trânsito, segundo dados da Iniciativa de Políticas Prisionais.

Elas também são mais inclinadas que as mulheres brancas a serem presas, e atualmente formam a maior porção de mulheres em cadeias locais, comparadas com outras mulheres de cor.

As negras também enfrentam a violência brutal da polícia, o que frequentemente assume a forma de ataque ou assédio sexual nas mãos de policiais, longe das câmeras e do olhar do público, segundo Ritchie.

E, acrescentou ela, de forma alarmante isso ocorre quando os policiais estão atendendo a pedidos de ajuda por violência doméstica ou agressão sexual.

Breonna Taylor durante cerimônia de graduação em Louisville, no estado de Kentucky
Breonna Taylor durante cerimônia de graduação em Louisville, no estado de Kentucky - Arquivo Pessoal via AFP

É em grande parte por causa dessas camadas de desigualdades que as mulheres negras se ergueram para formar a espinha dorsal de alguns dos maiores movimentos por direitos civis na história dos EUA —da abolição e o sufrágio ao #MeToo.

"Algumas de nossas vozes mais fortes contra a opressão vieram de mulheres negras", disse Monique Morris, fundadora e presidente do Instituto Nacional Justiça para Mulheres Negras.

As jovens negras também formam uma parte importante da "articulação de nossa democracia" —como Claudette Colvin, 15, que se recusou a dar seu lugar no ônibus meses antes de Rosa Parks fazer isso.

Na verdade, foi Darnella Frazier, 17, quem filmou a morte de Floyd em um vídeo que tem instigado protestos em todo o mundo.

O movimento Black Lives Matter também foi fundado por três mulheres —Patrisse Cullors, Alicia Garza e Opal Tometi— que ficaram revoltadas em 2013 com a absolvição de George Zimmerman, o homem que matou a tiros Trayvon Martin, de 17 anos.

"Nós queríamos iniciar um movimento", disse Cullors. "Sabíamos que teríamos tanto sucesso? Não. Mas trabalhamos duro durante anos para garantir que as pessoas vissem o que estava acontecendo e como estava acontecendo."

Os movimentos tendem a se ligar a um único "rosto" ou líder, e para muitos essa imagem ideal é predominantemente um homem hétero, disse Cullors.

​"É mais fácil ser seduzidas pela masculinidade e a ideia de que seremos salvas por um homem negro cristão", disse Cullors, citando como exemplo o apelo em torno de Martin Luther King.

"Isso é um problema. Não entendemos direito como o racismo e o sexismo, o patriarcado e a homofobia impactam nossa comunidade."

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