Descrição de chapéu Governo Trump

Secretário de Justiça defende ação federal contra ativistas, mas nega ajuda à reeleição de Trump

William Barr depôs no Congresso em processo que investiga abusos de agentes nos protestos

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Washington e São Paulo | Reuters

O secretário de Justiça dos EUA, William Barr, negou que a operação para enviar agentes federais para aplacar protestos antirracistas seja uma tentativa de ajudar a reeleger o presidente Donald Trump.

Em depoimento ao Congresso nesta terça-feira (28), no entanto, ele repetiu discursos similares aos do republicano, culpando manifestantes antifascistas pela violência registrada em alguns atos e defendendo o envio de agentes federais para as cidades, mesmo contra a vontade de prefeitos.

A ação desses agentes, muitas vezes sem identificação, flagrados agredindo manifestantes, intensificou os protestos antirracismo em Portland, no estado do Oregon, e em outras partes do país nos últimos dias.

O presidente americano tenta fazer do discurso de lei e ordem um dos temas de sua campanha, tirando os holofotes da resposta da Casa Branca à pandemia de coronavírus, tema no qual é mal avaliado.

O secretário de Justiça, William Barr, durante depoimento no Congresso - Matt McClain/AFP

Barr prestou depoimento à Comissão de Justiça da Câmara dos Deputados dos EUA durante cinco horas, em um processo que investiga erros na ação federal contra os manifestantes.

O secretário tambem é alvo de uma apuração da Casa que analisa a suspeita de que ele esteja usando os poderes do cargo, que, nos EUA, incluem os de procurador-geral, para favorecer Trump politicamente.

As queixas englobam os casos de Roger Stone, aliado do líder republicano, e Michael Flynn, ex-conselheiro de Segurança Nacional.

No primeiro, o amigo do presidente havia sido condenado a três anos e quatro meses de prisão por mentir no caso da interferência russa nas eleições de 2016, mas recebeu um indulto. No segundo, Barr buscou a retirada de uma acusação criminal contra Flynn, condenado por mentir ao FBI.

Em ambos, Barr é acusado de politizar o sistema de justiça criminal e de ameaçar o Estado de Direito.

"Os amigos do presidente não merecem alívios especiais, mas também não merecem ser tratados com mais severidade do que outras pessoas", disse o secretário. "E, às vezes, é uma decisão difícil de tomar, especialmente quando você sabe que será criticado por isso."

No início da sessão, o líder da comissão parlamentar, o democrata Jerrold Nadler, classificou a gestão de Barr frente ao Departamento de Justiça como "uma guerra persistente contra o núcleo profissional" da pasta, "em um aparente esforço para garantir favores ao presidente", ao que Barr reagiu dizendo que se sente "completamente livre para fazer o que acho certo".


Possíveis ajudas de Barr a Trump

Fevereiro
O Departamento de Justiça defendeu uma pena menor para Roger Stone, amigo de Trump, e procuradores que o acusavam mudaram de postura. Stone foi condenado por mentir sobre a interferência russa nas eleições de 2016, mas, depois, recebeu um indulto presidencial que o desobriga de cumprir a pena.

Maio
Barr buscou a retirada de uma acusação criminal contra Michael Flynn, ex-conselheiro de Segurança Nacional de Trump, condenado por mentir ao FBI.

Junho
O secretário tirou do cargo o procurador-chefe de Manhattan, Geoffrey Berman, que investigou Rudy Giuliani, advogado pessoal de Trump.

Julho
Departamento de Prisões, subordinado a Barr, ordenou que Michael Cohen, ex-advogado de Trump, voltasse a cumprir prisão em regime fechado. Há suspeitas de que o gesto foi uma tentativa de impedir que ele lançasse um livro sobre o presidente.


O envio de agentes federais a várias cidades americanas gerou a revolta de manifestantes que pedem o fim da violência policial. Após a morte de George Floyd, homem negro asfixiado por um policial branco, no final de maio, em Minneapolis, atos contra o racismo explodiram por todo o país.

Diferentemente de outras cidades, que viram a força das manifestações arrefecerem após semanas de protestos diários, Portland segue na mesma toada. Lá, o Fórum de Justiça, de propriedade federal, tornou-se alvo dos ativistas, que tentam quebrar as barreiras em torno do prédio.

Antes, a derrubada de monumentos em homenagem a figuras históricas ligadas à escravidão e ao colonialismo há haviam se tornado uma meta dos manifestantes. Em reação, Trump emitiu um decreto em junho para aumentar a proteção a estátuas federais. O envio de agentes veio como consequência.

"O que acontece todas as noites em torno de tribunais não pode ser razoavelmente chamado de protesto; é, por qualquer medida objetiva, um ataque ao governo dos Estados Unidos", disse Barr.

Enquanto algumas manifestações se tornaram violentas, muitas outras foram pacíficas e abrigaram estudantes do ensino médio, veteranos das Forças Armadas e muitas mães. Um vídeo mostra que, em alguns casos, agentes atacaram ativistas quando não havia ameaça aparente, incluindo o caso de um veterano da Marinha cujas mãos foram esmagadas por oficiais.

Para Nadler, a decisão de enviar militares às cidades serve apenas para produzir imagens para os anúncios da campanha de Trump, e Barr estaria servindo às vontades do chefe. “Você está projetando medo e violência em todo o país em busca de objetivos políticos óbvios. Que vergonha."

Durante o testemunho, também minimizou as acusações sobre discriminação sistemática nas polícias do país. Para o secretário, tratar o problema como algo ligado ao racismo estrutural "seria uma simplificação extrema". "A ameaça às vidas negras representada pelo crime nas ruas é muito maior do que qualquer ameaça representada por má conduta policial", afirmou.

Nesta segunda-feira (27), seis prefeitos de grandes cidades americanas enviaram carta ao Congresso pedindo aos parlamentares que barrem o envio das forças federais para suas localidades. Na mensagem, afirmam que a presença dos agentes de segurança tem escalado a tensão dos protestos.

Segundo o jornal The Washington Post, o governo Trump decidiu, também na segunda, enviar mais cem agentes federais à Portland, o que deve acirrar ainda mais os ânimos —já que a reivindicação dos atos é justamente a retirada desses guardas.

Em Portland, agentes foram flagrados agindo de modo violento contra manifestantes. Vídeos que mostram agressões e prisões sem justificativa, divulgados massivamente em redes sociais, mobilizaram mais manifestantes a irem às ruas e geraram reações de líderes do Partido Democrata.

Na semana passada, o presidente americano anunciou o envio de mais agentes federais para Seattle, Chicago, Albuquerque e outras cidades —o que elevou a temperatura do debate político no país.

A decisão é alvo de questionamento do inspetor-geral do Departamento de Justiça, que abriu investigação sobre uso de força excessiva pelos policiais.

A atuação das forças federais contra manifestantes é mais um componente na corrida presidencial nos meses que precedem a eleição, em 3 de novembro.

Trump, que aparece atrás de seu rival, o democrata Joe Biden, na corrida à Casa Branca, tem usado os protestos antirracistas e o debate em torno dos símbolos nacionais para mobilizar sua base.

O republicano promete seguir enviando mais forças federais para cidades governadas por prefeitos democratas, que ele acusa de não se esforçarem para combater o crime.

Prefeitos, como os de Nova York, Bill de Blasio, e de Chicago, Lori Lightfoot, criticam duramente as medidas do presidente, pois veem o risco de mais confrontos e mortes causadas por forças de segurança —justamente o que os manifestantes exigem que não aconteça mais.

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