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Mais de 3,6 milhões de pessoas deixaram a Ucrânia desde o início da invasão do país pelas tropas russas, evento que completará um mês nesta quinta-feira (24).
O êxodo, como abordamos aqui nesta newsletter, é considerado o de crescimento mais rápido desde a Segunda Guerra Mundial e tem provocado uma rara mobilização de outras nações no anúncio de medidas de acolhimento e assistência a esses refugiados.
A União Europeia, por exemplo, destravou uma norma aprovada em 2001, no contexto da crise dos Bálcãs, e que nunca havia sido usada. O dispositivo legal facilita a permanência temporária de ucranianos, que ficam autorizados a viver e trabalhar nos países do bloco por dois anos —que podem ser prorrogados por mais um, de acordo com a decisão de cada Estado-membro.
Se, por um lado, essa abertura é tida como necessária e até insuficiente diante do tamanho da crise humanitária, por outro vem motivando críticas pelo "duplo padrão de acolhimento" em comparação a outras crises migratórias, como as do Afeganistão e da Síria.
Em entrevista à repórter Flávia Mantovani, o pesquisador Jeff Crisp, que foi diretor de políticas do Acnur (braço da ONU para refugiados) e da Comissão Global para Migrações Internacionais, apontou algumas razões para essa diferença:
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Racismo: os ucranianos são percebidos como "mais parecidos" com a população dos países europeus e não são associados ao terrorismo, enquanto migrantes da África e do Oriente Médio estão mais sujeitos a discriminação e xenofobia;
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Perfil: maioria dos refugiados é formada por mulheres e crianças, já que homens de 18 a 60 anos estão proibidos de sair do país. "Homens jovens acabam sendo vistos como uma ameaça potencial", diz;
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Atenção da mídia: cobertura intensa do conflito torna as pessoas mais sensibilizadas com o tema.
Esse último ponto, o da comoção seletiva, foi abordado pela colunista Djamila Ribeiro em artigo no início do mês:
"Do ponto de vista da guerra recém-iniciada, a classificação racial de quem pode se salvar e de quem não deve ser salvo deveria ser motivo de repúdio equivalente à comoção dos últimos dias —justa, diga-se de passagem, mas, quando posta ao lado do descaso com a população negra, revela como o racismo hierarquiza vidas e prioriza comoções", escreveu.
Marilene Felinto e Helio Schwartsman também trataram da questão do racismo na receptividade de refugiados.
Apesar do esforço inédito, o engajamento mundial para garantir assistência aos ucranianos será colocado à prova ao fim do conflito.
Não se perca
O que os países têm feito para receber os refugiados ucranianos? Damos quatro exemplos:
Brasil: Desde 24 de fevereiro, o país registrou a entrada de 1.104 ucranianos, segundo dados da Polícia Federal atualizados até segunda (21) que incluem residentes e cidadãos de dupla nacionalidade. O governo Bolsonaro anunciou a concessão de visto humanitário de seis meses para esses imigrantes e, de acordo com o Itamaraty, 39 autorizações foram emitidas até agora.
A viagem de parte dessa população é promovida por uma missão religiosa —na sexta, um grupo de 29 pessoas desembarcou no Brasil para ser alojado nas cidades paranaenses de Guarapuava e Prudentópolis —município que concentra, proporcionalmente, a maior comunidade de descendentes de ucranianos do Brasil. Outras 50 devem chegar no sábado.
Estados Unidos: Governo Joe Biden vem priorizando repasses financeiros a fundos humanitários e a países europeus que estão recebendo refugiados, e por isso tem sido pressionado a criar medidas para facilitar a entrada desses migrantes também no território americano. "A vasta maioria dos refugiados quer permanecer nos países vizinhos, é aí que temos concentrado nossas energias", justificou a porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki, na última quinta (17).
União Europeia: Por unanimidade, o bloco de 27 países desengavetou uma norma criada em 2001, nunca usada desde então, que facilita o asilo a ucranianos e autoriza a permanência deles na região por dois anos (que podem ser ampliados para três por decisão de cada país). A Comissão Europeia propôs nesta quarta (23) um pré-financiamento de 3,4 bilhões de euros (R$ 18 bilhões) para aprimorar as estruturas de apoio aos migrantes, como centros de acolhida, nas nações-membro.
Reino Unido: O país criou um auxílio de 350 libras (R$ 2.300) por mês para pessoas e instituições que hospedarem refugiados ucranianos. Mas tem sido criticado pela exigência de um visto especial que coloca cidadãos em situação de guerra na fila de processos burocráticos. O governo Boris Johnson também autorizou a permanência por até três anos, após repercussão de medida semelhante da UE.
O que aconteceu nesta quarta (23)
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Na véspera de cúpula, Otan disse que prepara novas tropas para impedir ataques russos;
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Assessor especial de Putin deixou a Rússia em oposição à guerra na Ucrânia;
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Putin disse que Rússia começará a vender gás para 'países hostis' em rublos;
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Polônia anunciou expulsão de 45 diplomatas russos sob acusação de espionagem.
O que ver para se manter informado
Dois vídeos da TV Folha mostram a luta dos ucranianos pela sobrevivência no próprio país.
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