Bachelet diz que não buscará novo mandato como comissária de direitos humanos da ONU

Anúncio vem semanas após chilena voltar de missão à China e receber críticas de ativistas, organizações e dos EUA

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Genebra | Reuters e AFP

A chilena Michelle Bachelet, 70, alta comissária para direitos humanos da ONU, disse nesta segunda-feira (13), em um anúncio surpresa, que não disputará mais um mandato à frente do cargo.

O anúncio foi feito durante o início da 50ª sessão do Conselho de Direitos Humanos, em Genebra, e chega poucas semanas após Bachelet retornar de uma visita à China —a primeira de um alto comissário em pelo menos 15 anos—, pela qual foi alvo de críticas de especialistas, ONGs e ativistas de direitos humanos.

A chilena Michelle Bachelet, alta comissária de direitos humanos da ONU, após entrevista coletiva no dia de abertura da 50ª sessão do Conselho de Direitos Humanos - Fabrice Coffrini - 13.jun.22/AFP

Ela, que também é ex-presidente do Chile, foi ao país liderado por Xi Jinping para, entre outras coisas, acompanhar a situação em Xinjiang, província de 1,6 milhão de km² onde o regime chinês é acusado de reprimir e encarcerar a minoria muçulmana uigur.

Ao retornar da visita, Bachelet, frustrando expectativas, afirmou que sua presença no país asiático não havia configurado uma investigação. Ela tampouco divulgou um relatório sobre a situação local, que já estaria pronto e cujo anúncio é amplamente reivindicado por ONGs.

"Como meu mandato de alta comissária chega ao fim, a 50ª sessão do Conselho será a última em que me expresso", disse a chilena, que não forneceu razões para deixar o cargo. Seu nome era cotado como um dos possíveis para substituir o português António Guterres como secretário-geral das Nações Unidas.

Sobre a China, afirmou que seu escritório trabalha numa avaliação sobre Xinjiang e que o conteúdo seria compartilhado com o regime de Xi antes de ser disponibilizado ao público. Nenhum cronograma foi fornecido. Ativistas acusam Bachelet de ter discurso menos crítico em relação a Pequim do que a outras nações em que há violação maciça de direitos humanos, como Mianmar, também na Ásia.

Formada em medicina, Bachelet começou seu ativismo político durante a ditadura militar do general Augusto Pinochet (1973-1990). O pai da chilena foi morto pelo regime, e ela e sua mãe também foram detidas e torturadas. Bachelet chegou a se exilar, primeiro na Austrália e depois na Alemanha Oriental. Ela cumpriu dois mandatos presidenciais: de 2006 a 2010 e de 2014 a 2018.

A pressão em torno de sua postura frente ao regime chinês cresceu na sexta (10), quando 42 relatores especiais da ONU, em comunicado conjunto, pediram uma mudança de postura das autoridades chinesas e mandaram recados à alta comissária. Os especialistas dizem reconhecer a importância do diálogo construtivo de Bachelet com o regime da China, mas salientam que esse compromisso não substitui a "urgente necessidade de uma avaliação completa da situação dos direitos humanos no país, especialmente nas regiões de Xinjiang, Tibete e Hong Kong".

Os Estados Unidos também já haviam se manifestado sobre o assunto, alegando estarem preocupados com o "silêncio da alta comissária frente à indiscutível evidência de atrocidades em Xinjiang".

Ainda durante sua fala nesta segunda, Bachelet mencionou extensa lista de violações de direitos humanos ao redor do mundo. Entre outros, lembrou as prisões de cidadãos da Rússia que se manifestam contra a Guerra da Ucrânia e o cerceamento da liberdade de imprensa no país de Vladimir Putin. "Lamento o aumento da censura e as restrições aos meios de comunicação independentes."

Sobre o México, pediu o fortalecimento de instituições civis para que haja a retirada dos militares da segurança pública, uma das demandas de ativistas ao governo de Andrés Manuel López Obrador.

Bachelet também mencionou os recentes golpes de Estado na África —só no ano passado, Chade, Mali, Guiné e Sudão observaram a tomada inconstitucional do poder, e em 2022 Burkina Fasso se juntou à lista. Falou ainda sobre o aumento da insegurança alimentar e da fome, impulsionados pela pandemia de Covid e pela guerra no Leste Europeu.

O Brasil também esteve presente no discurso da alta comissária. Bachelet disse que as ameaças aos defensores dos direitos humanos e do ambiente são alarmantes e citou casos recentes de violência policial e racismo estrutural. "Apelo às autoridades para que assegurem o respeito pelos direitos fundamentais e as instituições independentes." Bachelet foi indicada ao cargo de alta comissária de direitos humanos da ONU por Guterres em 2018.

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