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China reage a Nancy Pelosi em Taiwan; entenda os desdobramentos

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Igor Patrick

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Como falamos na semana passada, a visita de Nancy Pelosi a Taiwan tinha tudo para colocar ainda mais lenha na fogueira no delicado relacionamento sino-americano, e assim o fez. A China reagiu à visita com retaliações, enquanto proliferavam discussões nos Estados Unidos sobre a viabilidade e os efeitos da estratégia adotada pela presidente da Câmara dos Representantes.

Quase imediatamente após a chegada, Pequim anunciou exercícios militares com munição real no entorno de Taiwan, virtualmente cercando a ilha. Trata-se de uma jogada delicada: com a quantidade de embarcações americanas circulando na região há dias, um erro de cálculo poderia levar a repercussões imprevisíveis.

Parte dos mísseis usados nesse exercício, inclusive, chegou a cruzar a fronteira das águas taiwanesas e internacionais, aterrissando próximo ao Japão. Tóquio reclamou, interpretando o incidente como uma escalada no discurso bélico chinês contra os japoneses.

  • Economicamente, a China também mandou um recado de desaprovação e bloqueou a importação de mercadorias de 35 empresas taiwanesas. Entre os produtos banidos estão biscoitos, doces, itens de pesca e frutas;
  • Executivos de companhias de tecnologia –como das áreas de produção de equipamentos médicos, gerenciamento de cadeia fria e geração de energia solar– também foram proibidos de entrar no território continental chinês;
  • Até agora, porém, nenhuma restrição foi adotada contra a indústria de semicondutores, da qual a China continua dependente e que Taiwan lidera mundialmente.

Por sua parte, Nancy Pelosi publicou no jornal Washington Post um longo ensaio em que explica os motivos da visita. A deputada democrata diz que os americanos devem se lembrar da "promessa solene em apoiar a defesa de Taiwan" e "considerar quaisquer esforços para determinar o futuro da ilha por outros meios que não pacíficos como uma ameaça à paz e à segurança regional no Pacífico."

Por que importa: A visita de Nancy Pelosi pode ter um simbolismo forte dado o cargo que ela ocupa, mas não serve para dissipar uma dúvida que ronda a região há vários anos: se a China atacar, os Estados Unidos socorreriam Taiwan?

Décadas atrás, a resposta seria quase certamente positiva, mas o crescimento econômico chinês e a modernização das Forças Armadas por Pequim poderiam tornar este um conflito custoso e difícil demais de se justificar em Washington. Ao mesmo tempo, abster-se de agir passaria a aliados naquela região a impressão de que não é possível contar com a boa vontade americana, levando a uma corrida armamentista difícil de controlar.

dica da semana

Você já deve ter lido bastante sobre as repercussões políticas da visita de Nancy Pelosi a Taiwan, mas se quiser entender os dilemas militares envolvidos na questão, recomendo assistir a este vídeo do coronel da reserva Paulo Roberto da Silva Gomes Filho. Ele também falou sobre o assunto no nosso blog na Folha.

o que também importa

Um periódico do Partido Comunista Chinês divulgou na quinta (4) um artigo em que instiga a mídia estatal a usar "ofensa como meio de defesa" no trato com questões sensíveis ao país.

Assinado pelo grupo partidário e editorial da Estação Central de Rádio e Televisão da China (CCTV), o texto também destaca a importância da internacionalização de meios chineses e as conquistas alcançadas até o momento.

  • "A propaganda e a introdução do público estrangeiro ao pensamento de Xi Jinping para o socialismo com características chinesas é a nossa principal tarefa política, explicando a audiências internacionais de forma que possam entendê-lo e aceitá-lo, expressando-o em palavras vívidas para integrar chineses e pessoas de outros países", diz o artigo.
  • Os oficiais também destacaram o sucesso de produções como "Frases Clássicas Citadas por Xi Jinping", que entre exibições em estações de TV e acessos online acumulou 4,79 bilhões de views (no Brasil, foi exibida em 2019 por Band News e Arte 1).

O texto diz ainda que a CCTV "se atreve a lutar" e a longo prazo continuará a "usar o ataque" para romper o que chama de "monopólio de longo prazo da mídia ocidental sobre a opinião pública".

O Alibaba, uma das maiores empresas de ecommerce do mundo, divulgou um relatório que reporta queda de 50% no lucro líquido anual. Os números também mostram estagnação nas vendas, registrando ¥ 205,56 bi (R$ 158,76 bi) ante ¥ 205,74 bi (R$ 158,9 bi) no ano passado.

Os resultados superaram levemente a previsão do mercado, mas indicam desaceleração no crescimento de um dos maiores e mais poderosos conglomerados da China.

  • Presidente e executivo-chefe do Alibaba, Daniel Zhang Yong disse ao jornal South China Morning Post que os volumes de mercadorias vendidas em plataformas como Taobao e Tmall sofreram um "declínio percentual de um dígito médio ano a ano";
  • Ele assegurou, porém, que há "sinais de recuperação desde junho, à medida que logística e cadeia de suprimentos melhoram gradualmente após o relaxamento das restrições do Covid" na China.

Reportando os resultados, a Bloomberg destacou que as métricas ruins também são um reflexo da repressão governamental chinesa sobre o setor de big techs, responsável por reduzir em quase US$ 1 trilhão (R$ 5,21 trilhões) o valor de mercado de Alibaba e Tencent em 2021.

fique de olho

O que era "meta" virou "orientação". De acordo com a Bloomberg, autoridades ministeriais e provinciais chineses reconheceram em reunião que a meta de crescimento econômico de 5,5% em 2022 provavelmente não será alcançada. Assim, líderes locais e nacionais deverão usar o número como "orientação", abolindo possíveis penalidades na avaliação de desempenho para quem não conseguir alcançar a meta.

Por que importa: Já há alguns meses, burocratas e líderes políticos na China vêm dando indicativo de que 5,5% seria um número irreal, especialmente após o longo lockdown em Xangai e outras interrupções nas cadeias de produção país afora dada a chegada da ômicron.

Se alcançasse os 5,5%, a China teria o menor crescimento anual desde 1990 —exceto por 2020, quando cresceu 2,24% devido também à pandemia. À época, o país registrou crescimento de 3,92%, sobretudo pelos efeitos do isolamento internacional após o massacre da praça da Paz Celestial. São sinais de que a economia chinesa vacila, com repercussões que serão sentidas mundialmente.

para ir a fundo

  • A Observa China recebe no sábado o historiador e sinólogo Giorgio Sinedino, professor brasileiro lecionando na China há quase 20 anos e pesquisador sobre filosofia, arte e literatura do país. Inscrições aqui. (gratuito, em português)
  • A Universidade de Tóquio abriu inscrições para um evento digital na próxima segunda (8) que discutirá a soberania digital da China e a disputa com os EUA. O tema será apresentado por Aynne Kokas, uma das principais especialistas na área. (gratuito, em inglês)
  • Joe Biden forçou a China a tomar uma resposta mais dura à visita de Pelosi a Taiwan a abrir dissenso público sobre a questão? O Politico acredita que sim e argumenta sobre o assunto neste artigo. (paywall poroso, em inglês)
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