Mulheres estão na linha de frente do Centro para Liberdades Civis da Ucrânia, ONG ganhadora do prêmio Nobel da Paz ao lado do ativista da Belarus Ales Bialiatski e da organização russa Memorial.
De 13 membros de sua equipe, a ONG fundada em 2007 e projetada durante a Guerra da Ucrânia conta com 11 mulheres, de acordo com informações oficias, incluindo a líder do grupo, a advogada Oleksandra Matvitchuk, e a diretora-executiva, Oleksandra Romantsova.
Com agenda voltada para a promoção dos direitos humanos na ex-república soviética, o centro encampou as investigações sobre crimes cometidos desde o início da invasão russa, em fevereiro. Uma das frentes de atuação é o mapeamento de desaparecimentos forçados de ativistas e profissionais de imprensa.
A ONG compõe, por exemplo, o T4P –Tribunal for Putin, ou tribunal para Putin–, coalizão de 21 organizações de direitos humanos lançada em março para investigar, por meio de relatos, redes sociais e imagens e vídeos coletados, incidentes que possam configurar crimes de genocídio, de guerra ou contra a humanidade.
O banco de dados da aliança mostra que ao menos 21 mil incidentes que podem ser crimes de guerra foram documentados desde então, sendo a maioria no mês de março. Os principais alvos seriam prédios residenciais, e a principal forma de ataque, os bombardeios.
"O centro se empenhou em documentar crimes de guerra contra a população ucraniana", disse Berit Reiss-Andersen, do comitê norueguês do Nobel, ao anunciar os laureados nesta sexta (7). Com a escolha, afirmou, a premiação envia um sinal de que "a guerra deve acabar".
A homenagem, por óbvio, foi celebrada pela equipe da ONG, mas também serviu de janela de oportunidade para dar tração a críticas. No Facebook, Matvitchuk pediu que os Estados-membros da ONU decidam pela expulsão da Rússia do Conselho de Segurança, o mais alto colegiado da organização, que tem o país de Vladimir Putin como membro permanente –e, portanto, com poder de veto.
Ela exigiu também que as Nações Unidas abracem a responsabilidade de criar um tribunal internacional que julgue Putin e Aleksandr Lukachenko, ditador da Belarus, por crimes de guerra.
"Vinte anos lutando por liberdade e direitos humanos me mostraram de maneira convincente que pessoas comuns têm muito mais influência do que pensam", escreveu a ucraniana. "A mobilização em massa pode mudar a história mundial mais rapidamente do que a intervenção da ONU. Se não queremos viver em um mundo onde as regras são ditadas por quem tem maior potencial militar, e não pelo Estado de Direito, o estado das coisas precisa mudar."
A ONG tem atuado em certa consonância com o governo do presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, ao pedir apoio internacional. Foi muito crítica, por exemplo, à recusa da Otan a estabelecer uma zona de exclusão aérea sobre o território ucraniano, como pleiteava Kiev.
Antes da guerra, porém, o centro criticou a figura de Zelenski, um ator e outsider político que chegou ao poder em 2019 com grande apoio. Em relatório anual do Centro para Liberdades Civis de 2020, o grupo disse que o presidente, "como um populista clássico", alegava representar a voz do povo contra a elite política corrupta.
Então, adendou: "Mesmo tendo apoio amplo para realizar reformas estruturais, ele não o aproveitou. Zelenski não conseguiu fortalecer as instituições democráticas."
A tarefa, bem como o combate a corrupção, é uma das exigências feitas pela União Europeia (UE) para que, no futuro, o país do Leste Europeu possa se somar ao bloco composto por 27 Estados-membros.
Por parte do governo ucraniano, coube a Mikhailo Podoliak, assessor de Zelenski, comentar o prêmio. Ao menos publicamente, porém, ele não parabenizou a ONG se deu país. No lugar, criticou a escolha do comitê. No Twitter, apontou uma espécie de falsa equivalência.
"O comitê tem uma compreensão interessante da 'paz', já que representantes de dois países que atacam um terceiro recebem o prêmio juntos."
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