A Ucrânia acusou a Rússia de usar as mesmas táticas "genocidas" empregadas contra o país nos anos 1930, quando um período de fome generalizada deixou milhões de mortos. O episódio, chamado de Holodomor, é relembrado neste sábado (26).
A nação do Leste Europeu recorda neste ano o 90º aniversário do período com homenagem às suas vítimas –ao mesmo tempo em que luta para repelir as forças russas e lida com cortes de energia em todo o país causados por ataques à sua infraestrutura.
"Antes eles queriam nos destruir com fome. Agora, com escuridão e frio", afirmou o presidente Volodimir Zelenski no Telegram.
Em novembro de 1932, o líder soviético Josef Stálin enviou forças militares para apreender itens alimentícios, como grãos e gado, das fazendas ucranianas que haviam passado por coletivização. A ação abrangeu sementes necessárias para plantar colheitas futuras.
Milhões de camponeses ucranianos morreram de fome nos meses seguintes. Timothy Snyder, historiador da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, se refere ao período como "assassinato em massa claramente premeditado".
A Rússia tem feito ataques aéreos à infraestrutura ucraniana nas últimas semanas que mataram civis e provocaram quedas de energia em diferentes pontos do país. Moscou, porém, nega ter a população como alvo.
Milhões de ucranianos ainda estavam sem energia depois dos ataques desta semana, disse Zelenski nesta sexta-feira (25).
O Kremlin negou que os ataques foram direcionados a civis e disse na quinta-feira (24) que Kiev poderia "encerrar o sofrimento" atendendo às exigências da Rússia para encerrar a guerra.
Em uma declaração neste sábado, a chancelaria da Ucrânia acusou Moscou de reutilizar as táticas empregadas no episódio da década de 1930. "No 90º aniversário do Holodomor na Ucrânia, a guerra genocida russa persegue o mesmo objetivo de 1932-1933: a eliminação da nação ucraniana e de seu estado."
"As narrativas políticas e ideológicas da era stalinista, em particular a negação da existência da Ucrânia como um estado independente, são ativamente reproduzidas hoje", acrescentou o ministério.
A Ucrânia fez parte da União Soviética, mas declarou independência em 1991. Parte da justificativa do presidente russo, Vladimir Putin, para a invasão perpetrada por Moscou, foi o que ele apresenta como esforço do Ocidente para manter sua influência sobre a Ucrânia —o ele reconhece como uma ameaça para a Rússia.
O ministério ucraniano também criticou o que afirmou ser uma tentativa da Rússia de transformar alimentos em armas, minando um acordo mediado pela ONU para desbloquear as exportações de grãos ucranianos por meio do mar Negro.
Em visita a Kiev, o premiê polonês, Mateusz Morawiecki, falou sobre o assunto. "Agora o mundo enfrenta outra fome artificial", disse ele. "Estamos trabalhando juntos para garantir suprimentos completos da Ucrânia para países africanos e asiáticos."
Os primeiros-ministros da Bélgica, Alexander De Croo, e da Lituânia, Ingrida Simonyte, também visitaram a Ucrânia. O embaixador da Rússia na Turquia deu declarações rejeitando a acusação ucraniana de que a Rússia está retardando o processo de liberação dos grãos.
Grãos da Ucrânia
Neste sábado, o presidente ucraniano organizou uma cúpula em Kiev com nações aliadas para lançar um plano para exportar US$ 150 milhões em grãos para os países mais vulneráveis à fome e à seca.
A iniciativa, chamada de Grãos da Ucrânia, demonstra que a segurança alimentar global "não é apenas palavras vazias" para Kiev, disse ele. A verba foi levantada junto a mais de 20 países e à União Europeia (UE) para exportar grãos para países como Etiópia, Sudão, Sudão do Sul, Somália e Iêmen.
"Planejamos enviar pelo menos 60 embarcações de portos ucranianos para os países que mais enfrentam a ameaça de fome e seca", disse Zelenski no encontro, que contou com a presença dos primeiros-ministros da Bélgica, Polónia e Lituânia e do presidente da Hungria. Os presidentes da Alemanha e da França e o chefe da Comissão Europeia fizeram discursos por vídeo.
Uma declaração conjunta emitida após a cúpula disse que, desde a invasão da Ucrânia pela Rússia em 24 de fevereiro, o mundo recebeu 10 milhões de toneladas a menos de produtos agrícolas do que no mesmo período de 2021.
"Isso significa que a segurança alimentar de milhões de pessoas em todo o mundo está seriamente ameaçada", afirmou o comunicado, culpando o bloqueio russo aos portos ucranianos no início do conflito.
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