Descrição de chapéu The New York Times

Trumpista filho de brasileiros eleito nos EUA pode ter mentido também sobre origem judaica

George Santos é alvo de acusações acerca de inconsistências em suas versões; republicano não responde reportagem

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Grace Ashford Michael Gold
The New York Times

O deputado Hakeem Jeffries, de Nova York, o próximo líder democrata na Câmara, acusou nesta quarta-feira (21) o deputado eleito George Santos de ser uma "fraude completa e absoluta", depois que uma nova reportagem lançou dúvidas sobre a declaração de Santos quanto à sua ascendência judaica.

"Toda a vida dele é inventada", disse Jeffries em entrevista coletiva em Washington. "Você cometeu uma fraude contra os eleitores do 3º Distrito Congressional de Nova York?"

O deputado eleito George Santos fala em evento em Las Vegas - Wade Vandervort - 19.nov.22 / AFP

Horas antes de Jeffries falar, a publicação judaica The Forward, com sede na cidade de Nova York, relatou que Santos, um republicano, pode ter enganado os eleitores sobre ter ascendência judaica, afirmação que fez em seu site e em declarações durante a campanha eleitoral.

Em sua biografia atual, Santos diz que sua mãe, Fatima Devolder, nasceu no Brasil, filha de imigrantes que "fugiram da perseguição aos judeus na Ucrânia, se estabeleceram na Bélgica e novamente fugiram da perseguição durante a Segunda Guerra Mundial".

Mas de acordo com o The Forward —que citou informações do site de genealogia My Heritage, documentos de imigração brasileiros e bancos de dados de refugiados— os pais de Devolder parecem ter nascido no Brasil antes da Segunda Guerra Mundial. Mais tarde, a CNN publicou uma reportagem semelhante que também citava entrevistas com vários genealogistas.

Fatima Devolder morreu em 2016, segundo um obituário online. Santos disse em uma entrevista em 2020 que sua família se converteu ao cristianismo no Brasil e, na página de Devolder no Facebook, que tem um link para a de Santos, ela compartilhava regularmente imagens cristãs e curtia várias páginas do Facebook associadas a organizações cristãs sediadas no Brasil.

A campanha de Santos, seu advogado e uma empresa de consultoria política que vinha respondendo a perguntas da imprensa não responderam imediatamente a um pedido de comentário.

A Coalizão Judaica Republicana, influente grupo conservador que apoiou Santos e o classificou como um republicano judeu, disse que entrou em contato com o escritório do deputado eleito a respeito da reportagem do The Forward.

"Essas alegações, se verdadeiras, são profundamente preocupantes", afirmou o diretor da coalizão, Matt Brooks. "Dada sua gravidade, o deputado eleito deve uma explicação ao público e estamos ansiosos para ouvi-la."

Santos, cuja vitória em um distrito que abrange partes de Long Island e Queens ajudou seu partido a garantir uma estreita maioria na Câmara no próximo ano, não respondeu diretamente às perguntas sobre seu passado levantadas por um artigo do The New York Times no início desta semana.

A reportagem do Times descobriu que Santos pode ter enganado os eleitores sobre detalhes importantes de seu currículo que estavam em seu site de campanha durante suas duas candidaturas ao Congresso, incluindo sua formatura na faculdade e suposta carreira em Wall Street.

Também descobriu que Santos não incluiu informações importantes sobre sua empresa, a Devolder Organization, nos formulários de divulgação financeira. A organização, registrada em 2021 na Flórida, foi dissolvida por autoridades estaduais em setembro, porque não apresentou um relatório anual. Na terça-feira (20), Santos entrou com a papelada para restabelecê-la.

A alegação de que os avós maternos de Santos fugiram da perseguição aos judeus foi acrescentada a seu site de campanha entre abril e outubro, de acordo com uma análise do Wayback Machine do Internet Archive. Uma versão anterior da biografia de Santos dizia somente que os avós maternos de Santos "fugiram da devastação da Segunda Guerra Mundial na Europa".

Embora Santos tenha se identificado como católico, ele tem alardeado com maior frequência sua herança judaica na campanha eleitoral, mesmo quando se descreve como um judeu não praticante. Já em junho de 2020, durante sua primeira candidatura ao Congresso, ele escreveu no Twitter que era "neto de refugiados do Holocausto".

Na noite de domingo, Santos participou de uma festa de Hanukkah em Long Island realizada pela Coalizão Judaica Republicana. Ele também falou no mês passado na reunião anual da liderança da coalizão em Las Vegas.

Em seu discurso em Washington, Jeffries não abordou as novas questões sobre as origens de Santos. Mas disse que a reportagem do Times o deixou com dúvidas quanto à adequação de Santos para o cargo, o que, na opinião dele, o líder da minoria na Câmara, deputado Kevin McCarthy, precisa resolver.

Especialistas jurídicos disseram que é improvável que a Câmara dos Deputados negue a Santos sua cadeira no Congresso. Existem procedimentos que permitem que candidatos perdedores contestem os resultados de uma eleição para a Câmara. Mas uma decisão da Suprema Corte em 1969 proibiu a Câmara de impedir que os candidatos tomem posse, a menos que não atendam aos requisitos constitucionais de idade, cidadania e residência no estado.

Alguns democratas e grupos de vigilância do governo pediram uma investigação mais profunda das reivindicações anteriores de Santos e das declarações de situação financeira, seja pelo bipartidário Escritório de Ética do Congresso ou pelos promotores federais.

O deputado democrata eleito Dan Goldman, de Nova York, ex-procurador-assistente dos EUA, disse em entrevista na quarta acreditar que haja dois possíveis crimes federais que os promotores devem investigar.

A primeira questão, disse ele, é se Santos fez propositada e intencionalmente declarações falsas em seus formulários de divulgação financeira. Tal violação, disse ele, exigiria que os investigadores se certificassem de que houve uma intenção clara e consciente de omitir ou deturpar informações.

"Como alguém que tinha que fazer essas revelações, elas são feitas sob pena de perjúrio", disse Goldman.

Mas Goldman, que foi o investigador chefe no primeiro caso de impeachment contra o ex-presidente Donald Trump, disse acreditar que as autoridades deveriam investigar se as declarações falsas de Santos podem ser consideradas parte de uma conspiração para fraudar os Estados Unidos.

Tal acusação seria uma abordagem agressiva, disse Goldman. (Foi usada na segunda-feira pelo comitê que investiga Trump sobre o ataque de 6 de janeiro de 2021 ao Capitólio. Santos já foi apoiador de Trump.)

Os promotores precisariam provar que Santos interferiu em uma eleição federal ao divulgar deliberadamente informações falsas e que trabalhou com outros para fazer isso.

"Acho que vale a pena investigar se seus esforços para mentir repetida e amplamente sobre praticamente qualquer coisa chegam ao nível de um esforço para fraudar os eleitores de seu distrito para que votem nele", disse Goldman.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.