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Obamacare permanece popular em reduto republicano 13 anos após aprovação de lei nos EUA

Marca de programa lançado por Barack Obama e duramente atacado pela oposição na época é onipresente no sul da Flórida

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Patricia Mazzei
Miami | The New York Times

Lídice Hernández abriu uma agência de seguros no ano passado em uma rua movimentada, afixando na fachada um logotipo que se tornou profundamente familiar no sul da Flórida: um sol branco nascendo sobre as listras vermelhas da bandeira americana, tudo envolto por um grande círculo azul.

"Obamacare", está escrito abaixo.

Loja de seguros em Miami anuncia Obamacare
Loja de seguros em Miami anuncia Obamacare - Scott McIntyre - 30.nov.22/The New York Times

Cartazes semelhantes são comuns em algumas das principais vias de Miami, quase 13 anos depois que a política de saúde do ex-presidente Barack Obama, o Decreto de Acesso à Saúde, se tornou lei e os críticos a marcaram com o nome dele. Para onde quer que você olhe, especialmente durante o período de inscrições que vai de novembro a janeiro, verá: Obamacare, Obamacare, Obamacare.

"Se não o usarmos", explica Hernández sobre o apelido, "as pessoas não sabem que o vendemos."

E em Miami as pessoas querem muito disso. À primeira vista, a grande popularidade do programa no sul da Flórida continua sendo um de seus pontos mais intrigantes. A evidência é visível em todos os logotipos do Obamacare utilizados –em vitrines, caminhões, bandeiras e outdoors– para vender seguros-saúde.

A Flórida tem muito mais pessoas inscritas no mercado federal de seguros-saúde criado pela Lei de Acesso à Saúde do que qualquer outro estado, uma distinção que vale desde 2015. O que puxa esses números tem sido a área de Miami, onde hispânicos mais velhos e com tendência republicana pareciam relutantes em abraçar o seguro-saúde subsidiado pelo governo quando a lei foi promulgada. À época, o programa iniciou algumas das batalhas partidárias mais acirradas da história recente do país.

Em particular, alguns moradores de Miami que fugiram de Cuba e outros países latino-americanos se irritaram com a exigência da lei –posteriormente eliminada– de que as pessoas tivessem a cobertura de saúde ou enfrentassem uma penalidade, o que os críticos condenaram como "socialismo".

A região se inclinou mais para os republicanos desde então, ficando vermelha [cor associada ao partido] na corrida para governador no ano passado pela primeira vez em duas décadas. No entanto, em 2022, os dois locais com mais inscritos na cobertura da Lei de Acesso à Saúde em todo o país estavam em Doral e Hialeah, cidades a oeste e a norte de Miami conhecidas por suas comunidades de direita venezuelano-americana e cubano-americana. E o condado com mais inscritos no país continuou sendo Miami-Dade.

"Está arraigado em nossa comunidade", diz Nicholas Duran, ex-deputado estadual democrata que trabalhava para um grupo sem fins lucrativos que incentivava os americanos a se inscrever nos planos Obamacare e agora trabalha para a seguradora de saúde Aetna. "Está emperrado."

Assim como o onipresente logotipo, que começou como símbolo da campanha presidencial de Obama em 2008, segundo Sol Sender, que o projetou. Ele nunca teve a intenção de representar a lei de assistência médica, disse, chamando o uso por agentes de seguros empreendedores de "simplesmente orgânica".

A corretora Lídice Hernández em loja de seguros com logotipo do Obamacare, em Miami
A corretora Lídice Hernández em loja de seguros com logotipo do Obamacare, em Miami - Scott McIntyre - 30.nov.22/The New York Times

O que não quer dizer que os segurados, embora satisfeitos por terem cobertura, estejam sempre satisfeitos com seus planos. Gisselle Llerena, uma das clientes de Hernández, conta que não conseguiu que sua seguradora aprovasse um exame recomendado pelo médico. "Tenho uma ressonância magnética pendente de um século atrás", diz Llerena, 50, em espanhol, ao visitar o escritório de Hernández. "Mas o seguro não quer cobri-la."

Ainda assim, Ivan A. Herrera, CEO da agência de seguros UniVista, com sede em Miami, que anuncia com destaque os planos Obamacare, afirma ter visto muitas evidências de que a cobertura ajudou as pessoas.

"Conheço clientes que fizeram cirurgia de coração aberto. Nunca foram ao médico, nunca fizeram um exame de sangue, nunca visitaram um especialista. E agora podem cuidar de si mesmos."

Ivan Herrera, presidente e fundador da UniVista Insurance, em Miami
Ivan Herrera, presidente e fundador da UniVista Insurance, em Miami - Scott McIntyre - 10.jan.23/The New York Times

Cerca de 2,7 milhões de moradores do estado de cerca de 22 milhões se inscreveram em um plano por meio do mercado de seguro federal, criado pela lei de saúde, em 2022. Em comparação com o Texas, que tem cerca de 30 milhões de habitantes, mas apenas cerca de 1,8 milhão de inscritos, "a Flórida é como um monstro da lei de saúde", define Katherine Hempstead, consultora de políticas da Robert Wood Johnson Foundation, instituição beneficente voltada para a saúde.

O prêmio mensal médio no ano passado para moradores do estado com planos de mercado foi de US$ 611 (R$ 3.109); para aqueles que se qualificaram para subsídios federais o valor médio foi de US$ 552 (R$ 2.809) por mês, ligeiramente superior à média nacional, de acordo com a Kaiser Family Foundation.

Os primeiros dados federais sugerem que as inscrições aumentaram novamente em 2023, com 15,9 milhões de opções nacionais pelo plano no mercado federal e os administrados por estados, incluindo quase 3,2 milhões –um quinto do total– na Flórida.

O fato de o Obamacare ter se tornado parte da vida na Flórida também é impressionante, dada a oposição inicial à lei liderada por Rick Scott, então governador republicano. Scott, hoje senador, barrou os "navegadores" —aqueles que ajudaram as pessoas a se inscrever para cobertura— dos escritórios do Departamento de Saúde do estado numa tentativa de minar as inscrições.

O Legislativo estadual controlado pelos republicanos não expandiu o Medicaid, programa federal de seguro-saúde para pessoas de baixa renda, conforme permitido pela Lei de Acesso à Saúde, tornando a Flórida um dos únicos 11 estados redutos.

Cerca de 790 mil pessoas atualmente sem seguro da Flórida seriam elegíveis para o Medicaid expandido, de acordo com Kaiser; sem ele, outros residentes de baixa renda recorreram ao mercado federal para obter cobertura subsidiada, um dos motivos pelos quais a Flórida tem tantos inscritos.

O Obamacare também é popular porque o estado é o lar de muitos aposentados com menos de 65 anos e ainda não elegíveis para o Medicare, programa federal de seguro saúde para idosos. Outros optam pelo plano porque se mudaram recentemente e podem estar entre empregos —muitos empregadores não oferecem aos trabalhadores da Flórida benefícios robustos que incluam cobertura de assistência médica.

Shopping em Miami anuncia Obamacare
Shopping em Miami anuncia Obamacare - Scott McIntyre - 30.nov.22/The New York Times

Hernández, que votou em Obama em 2008, mas depois se registrou como republicano, lamentou que o Congresso não tivesse atualizado a lei de saúde para tornar mais pessoas permanentemente elegíveis a subsídios, para ajudar a cobrir seus prêmios de seguro. (Os subsídios foram temporariamente expandidos por meio do Plano de Resgate Americano e da Lei de Redução da Inflação e estão em vigor até 2025 –uma das principais razões para os recentes aumentos das matrículas.)

Mas ela se diz satisfeita com o fato de os legisladores republicanos terem parado de tentar revogar a lei. "O Obamacare precisa ser consertado", afirma. "Mas quando vi como era fácil obtê-lo, pensei: 'Oh, meu Deus, as pessoas não sabem disso. Por que mais pessoas não entendem?'"

Ela e sua família agora estão segurados por meio do programa.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves 

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