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O que quis dizer o professor de Yale que sugere suicídio para idosos no Japão

Com declarações polêmicas, Yusuke Narita argumenta se referir à necessidade de ter mais jovens em cargos de liderança

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Motoko Rich Hikari Hida
Tóquio | The New York Times

As falas dificilmente poderiam ser mais dramáticas. Em entrevistas e aparições públicas, Yusuke Narita, professor assistente de economia na Universidade Yale, nos EUA, falou sobre como enfrentar os encargos da sociedade do Japão, que envelhece rapidamente. "Sinto que a única solução é bastante clara", disse ele em 2021. "Não é suicídio em massa e 'seppuku' em massa dos idosos?"

Seppuku é um ato ritual de estripação que era praticado pelos samurais desonrados no século 19.

O professor de Yale Yusuke Narita, em Connecticut
O professor de Yale Yusuke Narita, em Connecticut - Bea Oyster/The New York Times

No ano passado, quando recebeu de um menino em idade escolar um pedido para explicar suas teorias de seppuku em massa, ele descreveu vividamente uma cena de "Midsommar", filme de terror sueco de 2019 no qual um culto envia um de seus membros mais velhos para se suicidar saltando de um penhasco.

"Se isso é bom ou não é uma pergunta mais difícil de responder", disse Narita, 37, enquanto rabiscava anotações. "Se você acha que isso é bom, talvez possa se esforçar para criar uma sociedade como essa."

Em outras ocasiões, ele abordou o tema da eutanásia. "A possibilidade de torná-la obrigatória no futuro será discutida", disse em entrevista.

Narita afirmou que suas declarações foram "tiradas de contexto" e que ele estava abordando principalmente um esforço crescente para tirar as pessoas mais velhas de posições de liderança nos negócios e na política, para abrir espaço para as gerações mais jovens. No entanto, com seus comentários sobre eutanásia e Previdência Social, ele tocou no assunto mais discutido no Japão.

Embora Narita seja desconhecido até mesmo nos círculos acadêmicos dos EUA, suas posições extremas o ajudaram a ganhar centenas de milhares de seguidores nas redes entre jovens frustrados que acreditam que seu progresso econômico foi impedido por uma sociedade gerontocrática –dominada por idosos.

Aparecendo com frequência em programas japoneses usando camiseta, moletom ou jaqueta esportiva e óculos originais com uma lente redonda e outra quadrada, Narita se apoia em sua formação na famosa universidade americana enquanto projeta uma imagem de comunicador radical. Ele está entre os poucos provocadores japoneses que encontraram um público fiel por quebrar animadamente os tabus sociais. Sua biografia no Twitter: "As coisas que dizem que você não pode dizer geralmente são verdadeiras".

Em resposta a perguntas enviadas por email, Narita disse que está "principalmente preocupado com o fenômeno no Japão, onde os mesmos magnatas continuam dominando o mundo da política, as indústrias tradicionais e a mídia, o entretenimento e o jornalismo há muitos anos".

As expressões "suicídio em massa" e "seppuku em massa", escreveu ele, foram "uma metáfora abstrata". "Deveria ter sido mais cuidadoso com suas potenciais conotações negativas", acrescentou. "Depois de certa reflexão, parei de usar as palavras no ano passado."

Seus detratores dizem que seus repetidos comentários sobre o assunto já espalharam ideias perigosas. "É irresponsável", disse Masaki Kubota, jornalista que escreveu sobre Narita. "Pessoas em pânico com o peso econômico de uma sociedade envelhecida podem pensar: 'Ó, meus avós são os que estão vivendo mais'", disse Kubota, "'e devemos simplesmente nos livrar deles'".

Em seu trabalho diário, Narita dirige pesquisas técnicas de algoritmos computadorizados usados em políticas de educação e saúde. Mas, como uma presença habitual em várias plataformas de internet e na televisão do Japão, ele se tornou cada vez mais popular, aparecendo em capas de revistas, programas de humor e em um anúncio de bebidas energéticas. Ele até gerou um imitador no TikTok.

Ele costuma aparecer com agitadores da geração X como Hiroyuki Nishimura, um empresário famoso e proprietário do 4chan, programa de mensagens online em que surgem algumas das ideias mais tóxicas da internet, e Takafumi Horie, empresário polêmico que já foi preso por fraude de títulos mobiliários.

Às vezes, ele ultrapassa os limites do bom gosto. Em um painel organizado pela escola de administração japonesa Globis, Narita disse que "se esta pode se tornar uma sociedade onde pessoas como vocês cometem seppuku uma após a outra, não seria apenas uma política de seguridade social, mas a melhor política de 'Cool Japan'". "Cool Japan" é um programa do governo que promove produtos culturais.

Alguns legisladores dizem que as ideias, chocantes ou não, estão abrindo portas para conversas muito necessárias sobre reforma previdenciária e mudanças na assistência social. "Há críticas de que os idosos estão recebendo muito dinheiro de pensão e os jovens estão sustentando todos os idosos, mesmo os ricos", diz Shun Otokita, 39, membro da Câmara Alta do Parlamento pelo direitista Nippon Ishin no Kai.

Mas os críticos dizem que Narita salienta os problemas de uma população envelhecida sem sugerir políticas realistas que poderiam aliviar algumas das pressões.

"Ele não está se concentrando em estratégias úteis, como melhor acesso a creches ou maior inclusão de mulheres na força de trabalho, ou inclusão mais ampla de imigrantes", diz Alexis Dudden, historiador da Universidade de Connecticut que estuda o Japão moderno. "Coisas que poderiam revigorar o Japão."

Ao abordar a eutanásia, Narita falou publicamente sobre sua mãe, que sofreu um aneurisma quando ele tinha 19 anos. Ele descreveu como, mesmo com seguro e financiamento do governo, o tratamento de sua mãe lhe custou 100 mil ienes (R$ 3.900) por mês.

Algumas pesquisas no Japão indicaram que a maior parte da população apoia a legalização da eutanásia voluntária. Mas a referência de Narita a uma prática obrigatória assusta os especialistas em ética. Atualmente, todos os países que legalizaram a prática apenas "permitem se a própria pessoa quiser", diz Fumika Yamamoto, professora de filosofia na Universidade da Cidade de Tóquio.

Questionado, Narita disse que "a eutanásia voluntária ou involuntária é uma questão complexa e cheia de nuances". "Não estou defendendo sua adoção. Prevejo que isso será discutido de forma mais ampla."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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