O governo da Rússia acusou o diretor de um importante instituto de ciência do país de vazar informações confidenciais à China. Alexander Shipliuk foi preso por suspeita de traição junto com outros dois especialistas em mísseis hipersônicos e corre o risco de receber uma pena de até 20 anos de prisão.
Detido desde agosto, Shipliuk é chefe do Instituto Khristianovich de Mecânica Teórica e Aplicada (ITAM), na Sibéria. Ele é suspeito de entregar material secreto numa conferência no país asiático em 2017.
O diretor nega quaisquer acusações e se diz inocente, sob a alegação de que o material estava disponível gratuitamente online e que não era sigiloso. Shipliuk é o caso mais recente de uma série de prisões de cientistas acusados de vazar informações confidenciais a Pequim, país considerado parceiro da Rússia. Antes, o governo russo já havia detido os técnicos Anatoli Maslov e Valeri Zvegintsev, também do ITAM.
Questionado sobre as detenções, Dmitri Peskov, porta-voz do Kremlin, disse que os serviços de segurança do país estão atentos a possíveis incidentes relacionados à "traição da pátria". Já a chancelaria da China argumentou que as relações entre os dois países seguem os princípios de não alinhamento ou confronto.
O líder russo, Vladimir Putin, afirma repetidamente que seu país é líder mundial em mísseis hipersônicos, armas capazes de transportar cargas a até dez vezes a velocidade do som para burlar sistemas de defesa.
No contexto da Guerra da Ucrânia, o Parlamento russo votou em abril uma mudança na pena máxima por traição, de até 20 anos de detenção para prisão perpétua. E, na última terça-feira, o chefe do comitê de segurança da Câmara Baixa do Parlamento da Rússia apoiou um projeto de lei que restringe o acesso a segredos de Estado, sob a justificativa de que 48 russos foram condenados por traição entre 2017 e 2022.
Considerados ultrassecretos, os casos enfrentados pelos técnicos do ITAM serão julgados a portas fechadas. O processo contra Maslov, 76, correrá no tribunal de São Petersburgo a partir de 1º de junho.
As investigações sobre os três cientistas chamaram a atenção na semana passada, quando seus colegas do ITAM assinaram uma carta aberta em apoio aos profissionais, reclamando de perseguição. De acordo com o manifesto, é impossível para os cientistas realizar seus trabalhos se, ao mesmo tempo, correm o risco de serem presos por escrever artigos ou fazer apresentações em conferências internacionais.
No ano passado, o cientista Dmitri Kolker foi detido e transferido para Moscou quando estava em um hospital numa cidade a 3.360 km da capital russa, tratando um câncer no pâncreas em estado avançado. Ele morreu dois dias após ser detido. Seu advogado, Alexander Fedulov, disse que o profissional havia sido acusado de entregar dados sigilosos para a China, alegação negada pela família dele.
Alexander Lukanin, cientista da cidade siberiana de Tomsk, também foi preso em 2020 por suspeita de passar segredos tecnológicos a Pequim. Ele acabou condenado no ano passado a sete anos de prisão.
Em 2020, Valeri Mitko, diretor da Academia de Ciências do Ártico em São Petersburgo, foi outro a ser acusado de repassar material secreto à China, aonde viajava regularmente para dar palestras, segundo a agência estatal Tass à época. Ele morreu dois anos depois, aos 81, enquanto estava em prisão domiciliar.
Pequim é a maior parceira comercial de Moscou, e as transações entre os países chegaram a US$ 190 milhões (R$ 991,2 milhões) em 2022, de acordo com as autoridades chinesas. Segundo o premiê chinês, Li Qiang, só nos primeiros quatro meses deste ano o valor delas foi de US$ 70 bilhões (R$ 350 bilhões). A expectativa para 2023 é que a Rússia aumente em 40% o envio de combustível para o gigante asiático.
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