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Guerra da Ucrânia agrava cisão da oposição russa, que falha em se unir contra Putin

Com representantes presos ou exilados, dissidentes brigam sobre quem deve liderar resistência contra líder do país

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Bruxelas | Financial Times

A oprimida oposição da Rússia se reuniu na semana passada em Bruxelas, na Bélgica, para planejar um caminho de volta à democracia, enquanto os principais rivais de Vladimir Putin estão presos ou exilados e brigam sobre como seguir em frente.

Em vez de unir os liberais russos, a Guerra na Ucrânia aprofundou as divisões existentes e acrescentou controvérsias, como o apoio a uma derrota militar de Moscou e as demandas do governo ucraniano por reparações, que alguns consideram politicamente tóxicas para os russos.

Homem de terno e gravata fala, sentando, usando um microfone de rosto
Mikhail Khodorkovski, político da oposição russa, durante fórum em Bratislava - Michal Cizek - 30.mai.23/AFP

"Eles têm essas brigas internas, e talvez demore algum tempo", disse Andrius Kubilius, eurodeputado lituano que convidou os grupos de oposição russos para irem ao Parlamento Europeu na semana passada. "Seria bom se eles pudessem mostrar maior união em torno de algum tipo de estratégia."

Embora a União Europeia esperasse reuni-los, as divisões ficaram ainda mais claras quando aliados do ativista anticorrupção preso Alexei Navalni, o mais popular líder da oposição russa, recusaram-se a participar do evento no Parlamento Europeu. A Fundação Anticorrupção, de Navalni, que atua fora da Lituânia, recusou convites para a conferência por medo de estar "no mesmo barco" de ativistas rivais que não compartilham suas opiniões, segundo Leonid Volkov, antigo chefe de gabinete de Navalni.

A UE, que enviou altos funcionários à conferência, tentou convencer a oposição a elaborar um plano racional para a democracia e reunir os russos contra a guerra. "Queremos trabalhar com a Rússia, mas uma Rússia diferente", disse Michael Siebert, diretor do serviço diplomático da UE para a Europa Oriental e a Ásia Central. Mas os grupos de oposição permanecem divididos sobre como alcançar essa outra Rússia.

Mikhail Khodorkovski, que já foi o homem mais rico da Rússia e hoje é o mais destacado oponente de Putin depois de Navalni, acusou o grupo deste de perpetuar "situações conflituosas". "Em suas mentes, só pode haver um líder", diz ele. "Não se encaixa na visão de mundo deles que possa haver vários líderes."

Navalni, 47, ganhou fama no início de 2010, em grande parte por ignorar as disputas internas da oposição e se concentrar na criação de um movimento dinâmico e atuante na internet para denunciar a corrupção.

Ao contrário de seus rivais, ele evitou festas em embaixadas ocidentais e viagens para conferências europeias, insistindo que o foco nas preocupações reais dos russos lhe dava mais legitimidade.

Em 2021, ele voltou de Berlim para Moscou, onde estava se recuperando após ser alvo de envenenamento pelo qual culpou Putin. Ele foi imediatamente preso ao retornar, e sua organização, banida.

Qualquer um que se associe ao grupo de Navalni ou proteste contra a guerra corre o risco de ser preso —medida que tornou difícil para seu grupo realizar comícios que, dois anos atrás, reuniam centenas de milhares de pessoas em todo o país. Apenas um pequeno número de seguidores foi às ruas no último domingo para desejar um feliz aniversário a Navalni.

Vladimir Milov, que assessora Navalni informalmente, mas não faz parte da Fundação Anticorrupção, disse que "eles têm esse enorme capital político, desenvolvido com sangue, suor e lágrimas", e que a perspectiva de ser apenas um dos muitos grupos de oposição simplesmente não é interessante para eles.

Khodorkovski, que dedicou a maior parte de sua entrevista de 50 minutos para criticar a equipe de Navalni, disse que a diferença é entre um "partido revolucionário e uma coalizão de frente popular", como na Rússia antes da revolução de outubro de 1917. "Não sabemos de nenhum caso em que um partido revolucionário tenha tomado o poder e a democracia surgisse no final", disse Khodorkovski. "Com uma frente popular, isso não acontece sempre, mas com bastante frequência."

Embora Khodorkovski tenha feito um esforço para formar uma coalizão mais ampla, incluindo ativistas mais jovens, ele também não está imune às disputas. Em outro recente fórum a portas fechadas em Vilna, na Lituânia, ao qual ele e a equipe de Navalni compareceram, um aliado próximo de Khodorkovski criticou fortemente Volkov, até que o moderador retirou seu microfone. As transmissões de Khodorkovski no YouTube até agora não conseguiram igualar o público de Navalni.

No entanto, Khodorkovski disse que a guerra colocou a equipe de Navalni em pé de igualdade com o resto da oposição. "Não tenho nada contra a impotência. Querer trabalhar com pessoas que estão na Rússia é ótimo. Mas podemos ver [pela pequena manifestação pró-Navalni] que eles também não conseguem fazer isso sob um regime totalitário", disse Khodorkovski. "Eles estão na mesma posição que todos os outros. A única diferença é que não estamos prontos para expor os apoiadores [da represália na Rússia]."

Oleksi Arestovitch, ex-autoridade graduada na Ucrânia e comentarista popular no YouTube em língua russa, implorou aos participantes da conferência que resolvessem as diferenças. "Falo sempre com a oposição, e cada frase começa com uma reclamação sobre outro membro da oposição russa", diz ele. "Se eles têm um objetivo comum, uma Rússia aberta e democrática, deveria ser uma base suficiente para atuarem juntos."

Algumas autoridades europeias esperavam que a oposição pudesse seguir seus homólogos belarussos e criassem uma plataforma unida e um escritório central para fazer lobby junto aos ocidentais em nome dos russos e ajudar a diáspora antiguerra. Mas o evento de Bruxelas terminou sem uma perspectiva imediata para tal passo. Kubilius, o legislador da UE, alertou que todas as partes poderão ser surpreendidas pelos acontecimentos. "Quando a revolução começar, e pode surgir do nada, é difícil prever quem será o líder."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves 

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