Descrição de chapéu China Folhajus

Justiça de Hong Kong reverte condenação de repórter, em rara vitória da imprensa

Bao Choy foi presa sob acusação de enganar autoridades para produzir documentário sobre protestos

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Uma premiada jornalista de Hong Kong ganhou um recurso nesta segunda (5) que anula sua condenação relacionada à produção de um documentário sobre protestos pró-democracia. Trata-se de uma rara decisão judicial a favor da liberdade de imprensa na região.

A jornalista, que usa o nome Bao Choy, foi presa em 2020 sob a acusação de enganar autoridades ao obter registros de propriedade de veículos para fins jornalísticos —ela declarou em um aplicativo que o material seria usado para questões relacionadas a tráfego e transporte.

A jornalista Bao Choy (à frente) durante entrevista em Hong Kong, na China
A jornalista Bao Choy (à frente) durante entrevista em Hong Kong, na China - Tyrone Siu - 7.nov.22/Reuters

A profissional tentava rastrear os autores de um ataque contra manifestantes em uma estação de trem durante protestos antigoverno em 2019. O material foi usado em documentários exibidos pela emissora pública RTHK que buscaram identificar os agressores e esclarecer por que a polícia tardou a agir.

No processo que condenou a jornalista, em 2021, a juíza de primeira instância Ivy Chui argumentou que "os regulamentos locais não permitem que a população obtenha detalhes dos veículos sem limitações" e que "entrevistas e relatórios para a imprensa não estão relacionados a fins de tráfego e transporte".

Derek Chan, advogado da jornalista, argumentou que o aplicativo disponibilizava apenas três opções como justificativa para obter os registros: além de "assuntos de tráfego e transporte", os usuários podiam escolher "processos judiciais relacionados a transporte" ou "venda e compra de veículo".

O argumento foi acolhido pelos juízes, que apontaram uma "injustiça substancial e grave" cometida contra a repórter e refutaram a acusação de que ela mentiu de forma consciente em proveito próprio. A sentença foi divulgada nesta segunda-feira pelo Tribunal Superior de Hong Kong.

Ainda no tribunal, Choy celebrou a decisão e destacou a importância do jornalismo investigativo para a democracia. "A sentença é importante para as liberdades de imprensa e de expressão, constitucionalmente protegidas. Esse é o maior significado da decisão", disse. Não cabem mais recursos.

Em 2021, ao ser condenada pela juíza em primeira instância, a repórter havia dito que a decisão "era sombria para todos os jornalistas em Hong Kong" e que seu caso demonstrava como as autoridades buscavam reprimir a mídia e limitar o acesso a informações que antes eram disponíveis à população.

25 anos devolvida à China após um século e meio sob domínio britânico, Hong Kong tem visto crescer a repressão política exercida por Pequim no território, a despeito do arranjo "um país, dois sistemas", adotado com a promessa de garantir algum grau de autonomia e de liberdades na região.

Os honcongueses desfrutavam de liberdades que não se veem na China continental, entre as quais acesso irrestrito à internet, direito de protesto e imprensa independente. Mas, após grandes atos pró-democracia em 2019, o regime chinês aproveitou a agitação para lançar uma onda de repressão contra opositores.

Em 2020, Pequim impôs uma lei de segurança nacional que criminalizou formas de discurso antigoverno. Em seguida, modificou o sistema eleitoral local, reforçando o controle do poder por parte do establishment pró-China. Parlamentares pró-democracia foram afastados, e o movimento, silenciado.

No ano passado, o chefe-executivo honconguês, John Lee, reforçou a submissão da ilha ao regime chinês, destacando a segurança nacional como uma de suas prioridades. Lee foi chefe de segurança entre 2017 e 2021 e um dos responsáveis por endurecer a repressão aos movimentos pró-democracia no território.

A RTHK é a maior rede pública de rádio e TV de Hong Kong e durante anos veiculou reportagens críticas a Pequim. O estatuto da emissora lhe garante independência editorial, mas, como entidade pertencente ao governo, tem pouca proteção contra autoridades que querem submetê-la a controle mais rígido.

O ataque de 21 de julho de 2019 no distrito de Yuen Long, no norte de Hong Kong, foi um dos episódios mais violentos dos protestos pró-democracia no território. Os agressores espancaram jornalistas, manifestantes e passageiros do metrô, em uma ação que deixou 36 pessoas feridas.

Hong Kong ficou em 140º lugar entre 180 países e territórios no ranking mundial de liberdade de imprensa publicado pela ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) em maio. Segundo a organização, a cidade experimentou um revés sem precedentes desde 2020, quando a lei de segurança foi introduzida. O Brasil aparece em 92º lugar.

Com Reuters

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.