Descrição de chapéu Guerra da Ucrânia Rússia

Veja perguntas e respostas sobre motim de mercenários na Rússia

Relação entre líder do Grupo Wagner e governo russo vinha se deteriorando havia meses

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São Paulo

O motim de mercenários na Rússia representou a maior crise da era Vladimir Putin, iniciada em 1999. As ações contra o governo foram lideradas por Ievguêni Prigojin, ex-aliado do presidente e chefe do Grupo Wagner.

O rebelde disse que o motim explodiu após tropas mercenárias serem atacadas por forças do Ministério da Defesa russo na sexta-feira (23). Em poucas horas, as forças de Prigojin ocuparam prédios administrativos e até um quartel-general na região de Rostov-do-Don, no sul da Rússia. Já o presidente Putin chamou o ex-aliado de traidor e prometeu "esmagar" o movimento.

A crise vinha se desenhando havia meses. Entenda mais sobre o motim a seguir.

Combatentes do grupo mercenário Wagner montam guarda com tanque de guerra em Rostov-do-Don, cidade do sul da Rússia
Combatentes do grupo mercenário Wagner montam guarda com tanque de guerra em Rostov-do-Don, cidade do sul da Rússia - Stringer - 24.jun.23/Reuters

Quando e como a crise explodiu?

A crise escalou na manhã de sexta (23), quando Ievguêni Prigojin, fundador e comandante do Grupo Wagner, postou um vídeo em uniforme militar acusando seu maior rival, o ministro Serguei Choigu (Defesa), de enganar o presidente Vladimir Putin e a população russa.

O motim explodiu horas mais tarde, após ataques contra bases do Wagner em Rostov-do-Don. Prigojin acusou as forças de Choigu de serem as responsáveis pela ação e ordenou ofensivas de seus soldados contra os combatentes federais.

Os atritos entre as partes vinham aumentando nos últimos meses, com Prigojin dizendo que a alta cúpula da Defesa russa boicota seu trabalho. Em uma das declarações mais notórias, o mercenário pergunta, aos berros e cercado de cadáveres, onde estão as munições prometidas. "Choigu! Gerasimov! Onde está a merda da munição?", grita, referindo-se ao ministro Choigu e ao chefe do Estado-Maior, Valeri Gerasimov.

O que é o Grupo Wagner?

É uma empresa militar que atua na Guerra da Ucrânia e em outros conflitos pelo mundo. O grupo foi fundado em 2014, ano em que a Crimeia foi anexada pela Rússia, e tem crescido desde então.

A organização é liderada por Ievguêni Prigoji, ex-aliado de Vladimir Putin. Fazem parte do Wagner milhares de detentos recrutados em prisões para atuarem na guerra —servindo de bucha de canhão, como se viu nos meses da batalha mais sangrenta da guerra, pelo controle de Bakhmut, no leste ucraniano.

O grupo atua na Ucrânia desde 2014 no Donbass, onde estão as duas autoproclamadas repúblicas separatistas pró-Rússia de Donetsk e Lugansk. A organização atua ainda na guerra civil da Síria, em apoio ao regime de Bashar al-Assad, e em conflitos em países africanos, como no Sudão, na Líbia e no Mali.

Qual é a força do Grupo Wagner?

No fim do ano passado, o contingente da organização foi estimado em até 50 mil homens, lutando principalmente pela tomada de Bakhmut, que ocorreu após muitas baixas (16 mil admitidas por Prigojin).

Ao lançar a ofensiva contra a Rússia, o líder mercenário afirmou ter à mão 25 mil soldados bem equipados e "o apoio da maioria das tropas russas". Os números exatos, porém, são incertos.

Quem é o líder dos mercenários, Ievguêni Prigojin?

Prigojin nasceu em Leningrado, hoje São Petersburgo, a mesma cidade natal de Vladimir Putin. Órfão de pai, caiu logo em uma vida de pequenos crimes e, no fim de 1980, foi preso com uma sentença de 13 anos.

Depois de solto, Prigojin passou a vender cachorros-quentes com a mãe. Depois, abriu dois restaurantes, sendo que o mais famoso, o Antiga Aduana, virou um ímã para artistas e políticos de São Petersburgo.

O grupo Concord, de Prigojin, começou a crescer e oferecer serviços de alimentação de luxo para dignitários estrangeiros. Contratos públicos começaram a surgir, e ele tornou-se o fornecedor da alimentação no Kremlin, além de toda a rede pública de Moscou. Dali veio o apelido "chef de Putin".

Em 2014, Prigojin fundou o seu Grupo Wagner, uma companhia militar privada, quando isso era proibido na Rússia. Segundo analistas militares, o grupo começou modesto, auxiliando os separatistas da Crimeia a realizar o referendo não reconhecido pela ONU que levou a península ucraniana de maioria russa a se integrar à Rússia. Logo depois, estava envolvido em combates na guerra civil do leste do país, o Donbass.

O que disse Prigojin?

O líder mercenário diz que a população russa foi enganada e que não havia motivo para a Guerra da Ucrânia, já que Kiev e forças da Otan, a aliança militar ocidental, não iriam lançar um ataque contra a Rússia. "Estamos banhados de sangue", afirmou.

Prigojin fez uma acusação dura ao sistema de poder de Putin, afirmando que a invasão do vizinho visava tomar controle dos recursos naturais e industriais ucranianos para distribuir à elite russa.

Poucas horas após o início da crise, Prijogin criticou Putin pela primeira vez desde o início do conflito no Leste Europeu —até aqui, ele só havia atacado a liderança militar, a começar pelo ministro Serguei Choigu, da Defesa. "O presidente comete um grande erro quando fala em traição. Somos patriotas, estamos lutando pela pátria-mãe. Não queremos corrupção. Estamos prontos para morrer."

O que disse o presidente Vladimir Putin?

No primeiro discurso após a crise explodir, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, prometeu esmagar a maior rebelião militar em solo russo desde os anos 1990. O líder disse que o motim representa um golpe e falou em traição do grupo mercenário Wagner, liderado por seu agora ex-aliado Ievguêni Prigojin.

"Intrigas e politicagem nas costas do Exército e do povo levaram ao maior choque, a destruição do Exército, o colapso do Estado, a perda de muitos territórios e, no fim, a tragédia e a guerra civil. Russos mataram russos, irmãos mataram irmãos", disse Putin em discurso transmitido em rede nacional da TV.

O presidente se referia ao golpe bolchevista que derrubou o governo que havia removido o czar do poder, em 1917, levando à Guerra Civil Russa, que matou milhões até a formação da União Soviética, em 1922.

Quais foram as primeiras medidas de Putin em resposta ao motim?

Poucas horas após o início de combates entre tropas mercenárias e forças do Exército russo, Putin assinou um decreto permitindo a prisão por 30 dias de quem quebrar regras da lei marcial, imposta desde o ano passado nas quatro regiões anexadas ilegalmente na Ucrânia.

Há um regime de alerta máximo valendo nas áreas da Rússia afetadas pelo motim, mas, por ora, não existe lei marcial em vigor no país, quando há restrição de liberdades civis. Em Moscou, veículos blindados e militares foram posicionados próximos a prédios do governo.

Como o motim terminou?

O motim terminou ainda no sábado (24) após negociações intermediadas pelo ditador belarusso, Aleksandr Lukachenk. O líder do grupo mercenário Wagner, Ievguêni Prigojin, vai se exilar em Belarus após a ação contra o governo russo.

O governo russo ainda se comprometeu a arquivar os processos criminais contra Prigojin. Segundo o Kremlin, os combatentes do Grupo Wagner que participaram das ações contra o governo não serão processados, como parte do reconhecimento pelos serviços prestados anteriormente à Rússia.

Soldados mercenários que não se uniram ao motim assinarão contratos e serão incorporados ao Ministério da Defesa russo.

O que dizem analistas?

Ruslan Pukhov, diretor do Centro de Análise de Estratégias e Tecnologias de Moscou, disse que o motim do Grupo Wagner contra o governo Putin é apenas o começo dos problemas políticos decorrentes do prolongamento da Guerra da Ucrânia, embora não haja risco imediato para o presidente russo.

Já a analista política Tatiana Stanovaia, da consultoria R.Politik, também não vê risco de um golpe, mas aponta a deterioração da posição de Putin ante sua elite política.

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