Escavações revelam possíveis ruínas de teatro do imperador Nero em Roma

Projeto no jardim do Palazzo della Rovere, nos arredores do Vaticano, foi iniciado em 2020 e surpreende arqueólogos

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Elisabetta Povoledo
Roma | The New York Times

Roma é um lugar que nunca deixa de oferecer novas recompensas a arqueólogos. Em um palácio do século 15 situado a poucos passos do Vaticano e que deve ser convertido em um hotel de luxo, arqueólogos fizeram o que sempre fazem: começaram a escavar. Mas ninguém sabia o que sairia dessa exploração preliminar —medida de rotina em canteiros de obras ou projetos de desenvolvimento.

Para surpresa e alegria dos arqueólogos, a escavação trouxe à luz resquícios de um teatro do século 1 que a equipe afirma acreditar ter sido construído por Nero, o imperador de fama contestada por sua tirania, devassidão e o desejo de dar vazão a seus instintos artísticos.

Escavações revelam ruínas que podem ser de teatro do imperador Nero em Roma, em região próxima ao Vaticano - Reprodução/Cultura Euronews no YouTube

Apesar de ter sido registrado por historiadores da era romana, o teatro nunca havia emergido até agora do arqueologicamente fértil subsolo de Roma. "É estupendo, maravilhoso", diz Marzia Di Mento, a arqueóloga responsável pela escavação do Palazzo della Rovere. "É o que todo arqueólogo gostaria de fazer."

Arqueólogos começaram a descobrir paredes —algumas com decoração folheada a ouro— que teriam feito parte do teatro particular de Nero. A escavação também trouxe à tona centenas de artefatos que, embora ainda estejam sendo estudados, já propiciaram novas percepções sobre a vida perto do Vaticano ao longo de séculos.

Entre os objetos estão pequenos amuletos de bronze que peregrinos teriam usado quando estavam a caminho de Roma para ir ao túmulo de São Pedro, além de ossos de animais perfurados para formar contas de rosários —são indicativos da presença de peregrinos, que aumentaram de número à medida que a cristianismo foi se disseminando.

Esses artefatos podem se somar a outras descobertas encontradas nos últimos meses em outras escavações. Elas incluem estátuas, cemitérios e traços de uma estrada que pode ou não fazer parte da célebre Via Ápia —um dos principais caminhos para a Roma antiga.

Depois que os artefatos do local forem estudados e restaurados, alguns dos mais bem preservados serão exibidos dentro do hotel. Eles incluem fragmentos raros que datam do século 10, período que deixou poucos resquícios porque Roma estava "em declínio econômico e demográfico na época", diz Di Mento.

A escavação do jardim do Palazzo della Rovere começou em 2020, antes de ser iniciada uma grande restauração do local, situado na ampla avenida que leva à basílica de São Pedro.

Uma ala do palácio pertence à Ordem Equestre do Santo Sepulcro de Jerusalém e está prevista para ser inaugurada como um hotel da rede Four Seasons em tempo para o Jubileu de 2025 do Vaticano, quando milhões de peregrinos devem ir a Roma. Leonardo Visconti di Modrone, o líder geral da ordem, disse na última quarta (26) que o aluguel do hotel vai ajudar a cobrir os custos de muitas das atividades beneficentes da ordem no Oriente Médio, como escolas e hospitais.

Escavação no Palazzo della Rovere - Reprodução/Cultura Euronews no YouTube

Por lei, os projetos de construção na Itália devem ser precedidos por escavações preliminares para garantir que nenhum dano seja causado ao que está no subsolo. Críticos dizem que a regra cria um obstáculo caro e demorado a projetos de construção e mesmo os interrompe.

"Um exemplo virtuoso em que a arqueologia atua como força motriz de um importante projeto de renovação e construção", diz Alessio de Cristofaro, um dos arqueólogos que supervisionaram a escavação em nome da Prefeitura de Roma.

Mas são as evidências do século 1 que chamaram a atenção, como carimbos em alguns tijolos datam a estrutura. Nero construiu seu palco em um jardim que, segundo textos históricos, teria pertencido a sua avó Agripina e a seu tio Calígula. O historiador romano Plínio, o Velho, que não era fã do imperador, descreveu o teatro como sendo "grande o suficiente para satisfazer até mesmo o desejo de Nero de cantar diante de uma casa cheia".

Apesar de incertezas iniciais em torno da identificação da construção, De Cristofaro diz que a alta qualidade de alguns materiais encontrados —como colunas de mármore africano raro e decoração folheada a ouro— aponta para uma obra com magnitude que seria encomendada por um imperador.

"A arqueologia opera por hipóteses", diz Alessandro Viscogliosi, professor da Universidade La Sapienza, em Roma. Para ele, considerar que os resquícios fazem parte do teatro de Nero é uma teoria razoável, embora ainda seja cedo para a confirmação. "Se continuarem a escavar e encontrarmos assentos, então, sim, teremos certeza."

Quando os arqueólogos concluírem o estudo, incluindo o mapeamento do sítio, as estruturas antigas serão novamente enterradas. "Cobri-las outra vez é a melhor maneira de proteger o sítio", explica Di Mento.

Sua história poderá ser contada por outros meios, incluindo reconstruções tridimensionais, mapas detalhados criados por drones e materiais online que tornarão a estrutura "mais compreensível mesmo para quem não é especialista", diz. Depois disso, os artefatos trazidos à tona terão que ser catalogados. "Vai levar anos para estudar tudo."

Tradução de Clara Allain

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