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Justiça da Guatemala ordena suspensão de partido de líder da oposição

Movimento Semilla é alvo de ação do Ministério Público às vésperas de segundo turno para a Presidência

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São Paulo

Um tribunal da Guatemala ordenou, nesta quarta-feira (12), a suspensãodo Movimento Semilla, partido liderado pelo candidato à Presidência Bernardo Arévalo. A investida aumenta os temores de parte da população e de observadores internacionais, que veem a democracia do país em risco.

Ainda não está claro, porém, se a decisão terá validade, uma vez que o Tribunal Supremo Eleitoral afirmou não ter recebido a notificação. O órgão eleitoral ainda confirmou o segundo turno entre os dois candidatos vencedores das eleições de 25 de junho, após um longo imbróglio motivado por alegações de irregularidades na contagem dos votos.

Candidato à Presidência da Guatemala, Bernardo Arévalo, durante entrevista - Cristina Chiquin - 4.jul.23/Reuters

De acordo com o documento emitido pela Sétima Vara de Instância Criminal do país e obtido pelo jornal local Prensa Libre, o TSE teria 24 horas para acatar a ordem. Caso acatada, a decisão entraria em conflito com a legislação guatemalteca, que proíbe a suspensão de um partido entre a convocação e a celebração de um pleito.

Em entrevista à CNN, Arévalo citou a lei eleitoral e disse que a decisão do juiz não afeta sua vaga no segundo turno, marcado para 20 de agosto. Ele afirmou ainda que nunca recebeu nenhuma notificação sobre supostos problemas na filiação do seu partido —motivação por trás da denúncia do Ministério Público.

Em vídeo publicado no Twitter nesta quarta, o procurador Rafael Curruchiche disse que, em maio de 2022, uma pessoa alegou ter sido filiada ilegalmente ao Semilla. Uma análise posterior, continua, teria concluído que a assinatura foi falsificada e que haveria irregularidades no registro de mais de 5.000 militantes do partido.

Ele afirmou ainda que o Ministério Público tomaria medidas contra "todos que tiveram participação nessas ações, notoriamente ilegais, garantindo sempre o estrito cumprimento da lei". Curruchiche integra a lista Engel, como é conhecido o documento do Departamento de Estado dos Estados Unidos que reúne figuras centro-americanas que se envolveram em casos de corrupção ou atacaram a democracia.

"A situação é muito grave", afirma o cientista político e membro da organização Intrapaz Byron Morales, para quem a suspensão do partido representaria um colapso da democracia no país. "Tudo indica que trata-se de uma manobra para beneficiar o candidato oficial."

Embora considere muito cedo para especular sobre as possíveis consequências da ordem de suspensão, ele diz que o movimento pode ter chamado a atenção para Arévalo, cujo partido tem mais popularidade nas regiões urbanas da Guatemala. "Essa situação de tensão vai se estender até 20 de agosto e até depois, dependendo do resultado", afirma.

Caso se concretize, essa não será a primeira suspensão controversa neste ano de eleições. Em maio, às vésperas das eleições, o Tribunal Constitucional excluiu da corrida o empresário Carlos Pineda, direitista que ganhou popularidade na rede de vídeos TikTok e que liderava as pesquisas de opinião. Segundo a Justiça, seu partido, o Prosperidade Cidadã, teria cometido uma série de ilegalidades durante a assembleia em que ele foi proclamado candidato.

Outra impedida de participar foi Thelma Cabrera, a única indígena num país em que metade da população se identifica como tal. Ela ficou em quarto lugar em 2019, e desta vez foi afastada porque seu candidato a vice, o ex-procurador de direitos humanos Jordán Rodas, foi acusado de corrupção e se exilou na Espanha. Foram suspensas também as candidaturas de Roberto Arzú, filho do ex-presidente Álvaro Arzú, e de Óscar Rodolfo Castañeda.

Com a cédula desfalcada, os guatemaltecos foram às urnas no final de junho. Eles escolheram Sandra Torres, ex-primeira-dama que pendeu da social-democracia para o conservadorismo em suas tentativas de chegar ao poder, e Bernardo Arévalo, filho do ex-presidente reformista Juan José —o primeiro eleito popularmente no país.

Arévalo é considerado o candidato que faz uma oposição mais contundente contra o governo de Alejandro Giammattei. O atual presidenteprotagoniza um mandato repleto de escândalos, como suspeitas de subornos em obras públicas e possíveis irregularidades eleitorais. Em 2021, ele chegou a ser investigado pelo Ministério Público por supostamente receber propinas de empresários russos em troca da concessão de um porto.

Tal desgaste levou Giammattei a empreender, ao lado da Procuradoria-Geral, uma ofensiva contra o Judiciário e a imprensa, pondo em risco a democracia da maior economia da América Central.

Órgãos nacionais e internacionais se pronunciaram sobre uma eventual suspensão. A organização Mirador Electoral, por exemplo, instou o TSE a não cumprir o que considerou "ordens ilegais". Já o vice-diretor para as Américas da ONG Human Rights Watch, Juan Pappier, disse que "qualquer tentativa de criminalizar os partidos políticos na Guatemala neste momento seria percebida pela comunidade internacional como um ataque à democracia e uma tentativa de estabelecer uma ditadura que poderia acabar isolada do mundo como a Nicarágua".

O subsecretário para assuntos do hemisfério ocidental dos EUA, Brian A. Nichols, disse, em publicação no Twitter divulgada pela embaixada do país na Guatemala, que os Estados Unidos estão "profundamente preocupados pelas novas ameaças à democracia eleitoral" do país e que aguardam que a eleição de 20 de agosto seja realizada "com os candidatos anunciados", respeitando "a vontade do povo guatemalteco".

Com Reuters

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