Descrição de chapéu guerra israel-hamas Rússia

EUA inflamam crise em Israel com porta-aviões, diz Putin

Turco Erdogan também faz críticas e diz que reação de Israel em Gaza é massacre

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São Paulo

O presidente russo, Vladimir Putin, disse nesta quarta (11) que os Estados Unidos estão "inflamando" a crise no Oriente Médio ao enviar um grupo de porta-aviões para a costa de Israel, em apoio a Tel Aviv na guerra declarada após o mega-ataque terrorista do Hamas no sábado (7).

"Eu não entendo o ponto [dos EUA]. Eles vão bombardear o Líbano ou o quê?", afirmou Putin em um evento sobre energia em Moscou.

O porta-aviões de propulsão nuclear americano USS Gerald Ford, o primeiro de sua nova classe, na Noruega
O porta-aviões nuclear americano USS Gerald Ford, o primeiro de sua classe, na Noruega - Terje Pedersen - 24.mai.2023/AFP

Ele se refere ao deslocamento para a região de um grupo liderado pelo mais moderno porta-aviões de propulsão nuclear americano, o USS Gerald Ford, o maior navio de guerra do mundo hoje. Ele chegou a Israel na terça (10).

A medida do governo de Joe Biden visou passar um recado para os vizinhos regionais de Israel que apoiam o Hamas e outros grupos que defendem o fim de Israel, como a Jihad Islâmica, notadamente o Irã —que os financiou ao longo dos anos.

"Ou será que eles [os americanos] só decidiram tentar amedrontar alguém? Há pessoas lá que não têm mais medo de nada. Este não é o caminho para solucionar o problema. É preciso olhar para soluções de compromisso. Claro, estas ações estão inflamando a situação", disse.

Presidente da Turquia de maioria muçulmana e próximo de Putin, com quem conversou na terça (10), Recep Tayyip Erdogan também criticou a abordagem americana. E, nesta quarta, afirmou que a reação de Israel contra Gaza equivale a "um massacre", oferecendo-se para mediar o conflito.

Desde que Tel Aviv declarou guerra ao Hamas, há trocas diárias de fogo entre suas posições de artilharia no norte do país e as forças do Hizbullah, milícia xiita que é o principal ator militar do Líbano, tendo travado diversas guerras pontuais com Israel.

Por ora, essa troca visa delimitar territórios, mas há sempre o risco de uma escalada regional. O Hizbullah tem muito mais capacidade militar do que o Hamas, e seu estoque de foguetes é estimado por especialistas entre 100 mil e 150 mil unidades, o que dá margem para ataques devastadores, em especial se combinado com as barragens que seguem vindo de Gaza apesar do bombardeio israelense.

Além disso, há a questão iraniana. O país tem uma força militar considerável, mas não as cerca de 90 ogivas nucleares à disposição de Israel segundo a referencial Federação dos Cientista Americanos. Com efeito, ante as acusações que se multiplicam na mídia que Teerã organizou o ataque de sábado, até o líder supremo Ali Khamenei foi a público para negar a hipótese.

É fato que o Irã apoia abertamente o Hamas e é contra a aproximação de Israel com o mundo árabe sunita, o ramo majoritário do Islã —o xiismo minoritário é centrado em Teerã. Mas a equação é mais complexa.

Ao longo dos últimos anos, os governos de Binyamin Netanyahu apostaram no namoro com os árabes, que seria consolidado com um acordo com os líderes do grupo, os sauditas, como forma de driblar a questão palestina.

De fato, na etapa inicial da normalização, em 2020 com Emirados Árabes Unidos à frente, os palestinos foram rifados na prática. Ao mesmo tempo, Netanyahu apostou em enfraquecer a liderança reconhecida pela ONU da Palestina, sediada em Ramallah (Cisjordânia), o que fortaleceu seus rivais do Hamas em Gaza.

O resultado foi o acúmulo de uma quantidade enorme de mísseis pelos terroristas e o tempo para orquestrar uma ação militar única em 50 anos contra Israel, que só viu tamanho apagão de preparo quando se viu invadido por duas frentes na Guerra do Yom Kippur —na qual quase recorreu à bomba atômica, segundo a historiografia não admitida por Tel Aviv, para evitar a derrota que acabou não vindo.

Analistas mais sóbrios apontam o fato de que o Hamas toma suas próprias decisões, inclusive as de cunho suicida: pode ter criado o horror do sábado apenas para melar o jogo regional e tentar forçar uma solução negociada que, ante as cenas e relatos que se sucedem de brutalidade contra civis israelenses, é basicamente improvável.

Na linha oposta, o sacrifício de sua população civil em Gaza pelo poderio militar esmagador de Israel seria uma ficha de barganha, por elevar o risco de uma conflagração regional.

Aí, a posição ora confortável de crítico de Putin se complica, pois ele é uma aliado do Irã e da Síria, país em guerra civil onde mantém bases militares. E, com todo seu foco na Guerra da Ucrânia, tudo o que o russo não precisa é de um conflito em que tenha algo a dizer —seu desengajamento no Cáucaso, onde os armênios de Nagorno-Karabakh foram expulsos após três décadas de apoio russo pelos azeris, já sinalizou isso.

Por outro lado, Putin tem boa relação com Netanyahu, apesar de desgastes, e coordena ações com o israelense e os turcos na Síria. Pesa nisso também a população de judeus russos que emigraram depois do fim da União Soviética em 1991, hoje 15% dos 9,8 milhões de israelenses.

Evidentemente, as trocas de artilharia e mísseis na fronteira israelo-libanesa sempre podem sair de controle. O tamanho da reação de Israel, o que parece ser a aposta do Hamas, é o fator que deverá determinar se o risco de escalada pode se tornar uma profecia autorrealizável ou se ficará no campo da especulação.

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