Joel Pinheiro da Fonseca

Economista, mestre em filosofia pela USP.

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Joel Pinheiro da Fonseca
Descrição de chapéu guerra israel-hamas

A violência indiscriminada contra civis palestinos é tudo que o Hamas quer

Ou haverá a tão sonhada solução de dois Estados ou genocídio mútuo

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Começo com uma obviedade singela: seja qual for sua causa, ela não justifica que você saia pelas ruas executando idosos, estuprando mulheres e raptando jovens. Disso, chegamos a uma conclusão que deveria servir de mínimo denominador comum moral: o Hamas é um grupo ilegítimo, terrorista, e deve deixar de existir. A resposta militar a ele é justificada. Anos no poder em Gaza em nada reduziram seu extremismo e seu desejo de varrer Israel do mapa. Pelo contrário, seu braço armado se tornou ainda mais ativo.

É um grupo que, ademais, faz uso notório de escudos humanos, colocando suas bases ao lado de escolas e hospitais. Isso levou Israel, no passado, a avisar moradores de áreas residenciais de Gaza antes de um bombardeio, dando-os alguns minutos para fugir. Fica a pergunta: teria o Hamas atitude semelhante se o Exército de Israel usasse escudos humanos? Não precisa responder.

Míssil atinge localidade nas proximidades de Sderot, no sul de Israel, nesta segunda-feira (9) - Amir Cohen/Reuters

Esse julgamento independe da opinião sobre a justiça ou injustiça da causa palestina. Tomemos um exemplo de outro contexto: imagine se a Ucrânia, em vez de responder à invasão atacando alvos militares russos, fizesse incursões para além da fronteira assassinando, estuprando e raptando civis? A própria causa ucraniana —em essência justa— ficaria comprometida.

Enquanto escrevo, o Ministro da Defesa de Israel anuncia o cerco total a Gaza. "Nem eletricidade, nem comida, nem água, nem gás, tudo bloqueado. Estamos lutando contra animais humanos e agindo de acordo." Ou seja, a reação ao terrorismo será o crime de guerra (e não seria o primeiro). Não é preciso ser nenhum gênio político para prever que isso irá aumentar o ódio palestino contra Israel e, portanto, fortalecer o extremismo e aumentar a hostilidade do mundo árabe.

Então por que o governo Netanyahu aposta na revanche indiscriminada? Para aumentar seu apoio interno. Essa é a lógica que permeia toda escalada de violência e que resulta em guerras e genocídios: já que o outro lado quer me destruir, eu preciso tentar destruí-lo também. Minha segurança depende de sua aniquilação. E não é fácil escapar dela, já que qualquer um que traga alguma nuance será acusado de fraco ou mesmo traidor pela ala mais radical.

A chance está no povo entender que essa engrenagem não lhe beneficia. Por meses antes deste ataque do Hamas, as principais notícias vindas de Israel eram da política interna, polarizada entre democratas e uma direita populista, que ameaça a independência da Suprema Corte. (Qualquer semelhança com outros países não é mera coincidência.)

Agora, com os ataques, a população se une: solidariedade no cuidado e coragem para se alistar substituem a briga. Ao mesmo tempo, é um momento de decisão: o governo Netanyahu dividiu o país, enfraquecendo-o perante os inimigos; tem sido um obstáculo a qualquer acordo pragmático com a Palestina; deu mostra de incompetência ao ser pego completamente desprevenido nesse ataque terrorista; e agora toma medidas que apenas aumentarão o ódio árabe e a probabilidade de novos ataques. Mesmo sem equivalência entre seu governo e o Hamas, fica claro que ele é parte do problema. Mas será que o povo israelense, sob a ameaça do Hamas, verá as coisas assim?

Quanto mais distante parece, mais necessária fica a tão sonhada solução de dois Estados. Ela aguarda líderes dotados de coragem, inteligência e grandeza moral para tornar o aparentemente impossível em um futuro vislumbrável pela população. É isso ou já ir inventando justificativas para a próxima leva de assassinatos de crianças, seja de que lado for.

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