Brasileiros saem de Gaza após mais de um mês de angústia

Grupo de 32 pessoas aterrissa em Brasília na noite de segunda (13) e a princípio será recebido por Lula

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São Paulo

Dois dias depois de terem sido autorizados a deixar a Faixa de Gaza rumo ao Egito, os 32 brasileiros e palestinos inscritos para repatriação pelo Itamaraty enfim conseguiram sair do território sob ataque de Israel neste domingo (12). Duas pessoas, mãe e filha brasileiras, que constavam da lista original de 34 nomes decidiram permanecer em Gaza por motivos pessoais.

O grupo estava retido porque a fronteira havia sido fechada na sexta-feira (10), permanecendo assim no sábado (11). Agora, eles serão atendidos por equipe com médico, enfermeiro e psicólogo enviada pelo Brasil em um avião VC-2, a versão operada pela FAB (Força Aérea Brasileira) para a Presidência do Embraer-190.

Hassan Rabee mostra grupo de brasileiros que estão deixando Gaza neste domingo (12)
Hassan Rabee mostra grupo de brasileiros que estão deixando Gaza neste domingo (12) - Hassan Rabee

Os brasileiros estão no Egito e foram levados para o Cairo em cinco vans em um percurso que dura em torno de seis horas. O plano é eles passarem a noite na capital egípcia e embarcarem para o Brasil na segunda-feira (13), no décimo voo de repatriação de brasileiros desde o início da guerra Israel-Hamas.

A previsão de decolagem no Cairo é às 11h50 do horário local (6h50 em Brasília). Três paradas estão previstas: em Roma, na Itália; em Las Palmas, na Espanha; e na base aérea do Recife.

O grupo aterrissa em Brasília às 23h30, e a princípio será recebido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), segundo afirmou seu ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, em encontro com jornalistas no Palácio do Itamaraty neste domingo. "Ele tem todo o interesse e manifestou o desejo de recebê-los, a depender dos horários", disse o chanceler.

Ele acrescentou que Lula pretende voltar a tratar do tema da guerra e pedir uma pausa humanitária no Conselho de Segurança da ONU. "A situação desses brasileiros está resolvida, mas a situação do conflito é gravíssima."

O grupo de 32 repatriados que agora se dirige ao Cairo é composto por 22 brasileiros, 7 palestinos que têm RNM (Registro Nacional Migratório) e 3 palestinos que são familiares próximos dos demais integrantes. Desses, 17 são crianças, 9 são mulheres e 6 são homens.

Com ele, a cifra total de cidadãos repatriados pelo Brasil desde o início da guerra Israel-Hamas sobe a 1.477, sendo 1.462 deles brasileiros, além de 53 animais domésticos. Trata-se da maior operação de evacuação de zonas de guerra operada pela Força Aérea na história —mas o drama dos futuros refugiados de Gaza foi mais estático, arrastando-se por quase todo o conflito até aqui.

O Egito havia dado a autorização para a saída —que é coordenada com Tel Aviv sob consulta dos EUA e do Qatar, mediadores do acordo de passagem de estrangeiros—, na sexta. O grupo foi incluído numa leva de quase 600 pessoas autorizadas.

Mas incidentes envolvendo ambulâncias levando feridos graves palestinos, que tem prioridade para a passagem para o Egito, fecharam novamente o posto de Rafah. Na sexta, houve a suspeita de que motoristas de veículos eram terroristas do Hamas tentando deixar Gaza, além de relatos de combates intensos que impediram a saída de pacientes da capital homônima da faixa.

No sábado, o isolamento do principal hospital da capital homônima da faixa, o al-Shifa, impediu que qualquer veículo chegasse a Rafah.

A frustração entre os brasileiros foi grande, até devido ao vaivém das chances de deixar Gaza, mas ao menos a autorização estava dada. Foram seis levas de permissões para estrangeiros até que chegasse a vez dos brasileiros.

A demora levou a insinuações de que Israel estaria vetando a passagem do grupo brasileiros para retaliar contra a condução do país de discussões sobre a guerra no Conselho de Segurança da ONU, que ele presidiu em outubro.

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O grupo de brasileiros repatriados de Gaza ao lado de diplomatas brasileiros e da equipe de resgate em al-Arish, onde pararam para almoçar antes de seguir para o Cairo, no Egito - Divulgação

Não há evidências disso, mas o azedume entre Brasília e Tel Aviv vai além disso, e inclui o encontro do embaixador israelense com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o atrito entre a Polícia Federal e o serviço secreto israelense Mossad acerca da operação que desarticulou ataques do Hezbollah libanês no Brasil.

Nesta semana, a Embaixada de Israel em Brasília rebateu as alegações sobre uma suposta indisposição do país em relação à passagem dos brasileiros, e foi numa conversa entre o chanceler Eli Cohen e o seu homólogo brasileiro, Mauro Vieira, que foi anunciada a entrada do grupo do Itamaraty na lista de autorizações emitida pelo Egito.

Cerca de 4.000 pessoas com passaporte estrangeiro ou dupla nacionalidade já tiveram a autorização para deixar Gaza desde 1º de novembro, mas nem todas conseguiram sair devido às suspensões constantes da passagem. No total, 7.500 terão esse direito, sendo o maior contingente sendo de americanos (1.200 pessoas).

A guerra na região registrou 1.200 mortos, em números revisados nesta sexta, do lado de Israel, e cerca de 11 mil em Gaza, nas contas do Hamas.

A degradação da qualidade de vida em Rafah e Khan Yunis, onde os brasileiros estavam depois de terem sido retirados da Cidade de Gaza, era grande. Faltava tudo, de água a diesel para geradores, passando por alimentos e remédios, embora o Itamaraty tenha custeado a estadia e os gastos das famílias.

Além disso, as cidades ao sul de Gaza seguem sendo bombardeadas dia e noite. Khan Yunis, por exemplo, registrou 13 mortes só neste domingo depois que uma casa foi atingida, segundo as autoridades locais.

Coordenaram os esforços os embaixadores Alessandro Candeas (Cisjordânia), Frederico Meyer (Israel) e Paulino Franco Neto (Egito). Uma equipe da representação no Cairo passou a noite em al-Arish à espera das notícias sobre os brasileiros na fronteira.

Uma vez no Brasil, aqueles refugiados que não têm família no país poderão ficar em abrigos que o Ministério do Desenvolvimento Social já reservou, em São Paulo. A pasta também garantirá a disponibilização de identidade, acesso ao SUS (Sistema Único de Saúde) e de toda a rede de apoio social para refugiados, que inclui opções de refúgio e de regularização.

Colaborou Julia Chaib, de Brasília

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