Nova arma da Rússia contra satélites preocupa governo dos EUA

Armamento espacial pode interromper sistemas de comunicação globais e destruir economias

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Munique

Quando a Rússia fez uma série de lançamentos secretos de satélites militares no começo de 2022, pouco antes de invadir a Ucrânia, autoridades de inteligência dos Estados Unidos começaram a investigar o que, exatamente, os russos estavam fazendo.

Mais tarde, as agências de espionagem descobriram que a Rússia estava trabalhando em um novo tipo de arma espacial que poderia ameaçar os milhares de satélites que mantêm o mundo conectado.

Vladimir Putin em reunião online com membros do Conselho de Segurança
Vladimir Putin em reunião online com membros do Conselho de Segurança - Alexander Kazakov - 13.fev.24/Sputnik/Pool via Reuters

Nas últimas semanas, um novo aviso circulou pelas agências de espionagem dos EUA: outro lançamento pode estar em andamento, e a questão é se a Rússia planeja usá-lo para colocar uma arma nuclear no espaço —o que seria uma violação de um tratado com meio século de existência.

As agências estão divididas sobre a probabilidade de o presidente Vladimir Putin ir tão longe, mas, mesmo assim, o assunto é considerado uma preocupação urgente para o governo Biden.

Mesmo que a Rússia coloque uma arma nuclear em órbita, autoridades dos EUA concordam com a avaliação de que o equipamento não seria detonado. Em vez disso, permaneceria como uma bomba-relógio em órbita baixa, numa espécie de lembrete deixado por Putin de que, se for ainda mais pressionado com sanções ou oposição militar às suas ambições na Ucrânia, ele poderá destruir economias sem atingir humanos na Terra.

Apesar das incertezas, o secretário de Estado, Antony Blinken, levantou a possibilidade de um movimento nuclear russo com colegas da China e da Índia na sexta-feira (16) e neste sábado, à margem da Conferência de Segurança de Munique.

A mensagem de Blinken foi direta: qualquer detonação nuclear no espaço não atingia apenas os satélites americanos, mas também os de Pequim e os de Nova Déli.

Além disso, autoridades americanas e analistas dizem que os sistemas de comunicação globais falhariam, o que interromperia diversos serviços. Detritos da explosão se espalhariam por toda a órbita terrestre baixa e tornariam a navegação difícil, senão impossível, para tudo, desde satélites Starlink, usados para comunicações via internet até satélites espiões.

Como Putin deixa claro seu desprezo pelos Estados Unidos, Blinken disse que caberia aos líderes da China e da Índia —o dirigente Xi Jinping e o primeiro-ministro Narendra Modi— convencê-lo a recuar. Em comunicado divulgado no sábado, o Departamento de Estado disse que, nas reuniões, Blinken "enfatizou que a busca [da Rússia] por essa capacidade [militar] deve ser motivo de preocupação".

"Ele continuará levantando isso em reuniões adicionais na Conferência de Segurança de Munique", acrescentou o comunicado.

Não está claro o quanto Blinken compartilhou da inteligência americana sobre os testes de satélites russos de 2022 nos encontros com o ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, ou com o da Índia, Subrahmanyam Jaishankar.

Algumas autoridades de inteligência se opuseram a compartilhar muitas informações sobre o que os EUA sabem porque os detalhes do programa russo permanecem altamente sigilosos. Mas outras argumentaram que Washington precisava compartilhar o suficiente para convencer a China e a Índia da seriedade da ameaça. Durante as reuniões de Munique, os dois homens teriam "absorvido" as informações, disseram autoridades, e Wang repetiu as declarações habituais da China sobre a importância do uso pacífico do espaço sideral.

"Depender de nosso maior adversário para transmitir mensagens a Moscou não é uma prática excelente, mas, neste caso, [...] a China teria interesse em transmiti-las", disse o deputado Michael Waltz, republicano da Flórida, que está no Comitê de Inteligência da Câmara, em email.

Blinken estava tentando replicar o que autoridades dos EUA acreditam ter sido uma série de advertências bem-sucedidas a Putin em outubro de 2022, quando houve séria preocupação em Washington de que a Rússia estivesse se preparando para usar uma arma nuclear tática na Ucrânia.

Putin recuou das ameaças, embora ainda não esteja claro sob quanta pressão ele estava, especialmente de Xi, que estreitou seus laços com Moscou.

Tanto os EUA quanto a União Soviética testaram brevemente armas nucleares no espaço antes da ratificação do Tratado do Espaço Sideral de 1967, que proíbe armas nucleares de qualquer tipo em órbita, bem como detonações nucleares no espaço.

Um teste feito em 1962 pelos EUA foi particularmente prejudicial. Explodindo a cerca de 400 quilômetros de altitude, o pulso eletromagnético destruiu eletrônicos no Havaí, interrompendo o serviço telefônico, e derrubando pelo menos meia dúzia de satélites em órbita, além de danificar outros.

Percebendo o quão prejudicial foi o teste, um ano depois os EUA e a União Soviética assinaram o Tratado de Proibição Parcial de Testes Nucleares, que proibia testes nucleares na atmosfera ou no espaço sideral.

Se Putin implantar a arma em órbita baixa da Terra, autoridades dos EUA temem que isso fará mais do que simplesmente violar o tratado de 1967. É um dos últimos tratados de controle de armas importantes ainda em vigor. Autoridades do governo Biden manifestaram preocupações de que, se a Rússia violar o tratado, outras nações —como a Coreia do Norte— possam seguir o exemplo.

Para Putin, lançar uma arma nuclear no espaço aumentaria sua crescente confrontação com os EUA e a Europa. Sua incapacidade de assumir o controle da Ucrânia, mesmo com um Exército muito maior, demonstrou os limites das forças convencionais da Rússia. Para as agências de inteligência americanas e europeias, isso o tornou mais dependente de armas nucleares e ciberataques, suas armas assimétricas mais potentes.

Publicamente, a Casa Branca descreveu a nova arma russa apenas como uma tecnologia antisatélite, sem fornecer detalhes. Mas as autoridades insistiram que ela não representa uma ameaça direta às populações humanas.

"Não estamos falando de uma arma que possa ser usada para atacar seres humanos ou causar destruição física aqui na Terra", disse John Kirby, porta-voz de Segurança Nacional da Casa Branca.

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