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Câmara argentina analisa Lei Ônibus reduzida, e Milei diz ter votos necessários

Sessão pode passar de 30 horas com debates sobre pacotão de privatizações, reforma trabalhista e mudança no IR

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Buenos Aires

Os deputados da Argentina começaram nesta segunda-feira (29) o acirrado debate sobre a desidratada Lei Ônibus do presidente Javier Milei, e o governo anunciou que teria os votos necessários —ao menos 129 de 257 legisladores— para aprovar a matéria.

Esse pacotão de reformas abre o caminho para privatizações e para aumentar por tempo limitado os poderes de Milei, além de colocar em marcha uma reforma trabalhista. Junto a ele, um pacote fiscal também analisado nesta rodada reduz a isenção do imposto de renda no país.

Manifestantes protestam nos arredores do Congresso Nacional, em Buenos Aires, durante análise da Lei Ônibus pelos deputados argentinos
Manifestantes protestam nos arredores do Congresso Nacional, em Buenos Aires, durante análise da Lei Ônibus pelos deputados argentinos - Agustin Marcarian/Reuters

Os debates começaram pouco após o meio-dia e prometiam virar a madrugada em uma sessão sem pausas. Ainda que a Casa Rosada diga ter os votos necessários para ver avançar sua prioridade legislativa, os mais comedidos recomendam ter cautela.

Mesmo que os legisladores aprovem o escopo da lei, será necessário negociar capítulo por capítulo. Foi justamente neste processo que o ultraliberal colheu um fracasso em fevereiro.

No início daquele mês deputados aprovaram sua Lei Ônibus original, um calhamaço de mais de 600 artigos. Mas, poucos dias depois, a desidrataram por completo a ponto de a bancada governista retirar o projeto da pauta para que seus anseios não fossem por água abaixo.

Daquele mês até este abril, o governo fez o que ainda não havia feito: sentar e negociar. Diversos governadores e bancadas de deputados foram chamados à Casa Rosada, e dessas conversas foi consensuado o texto que chegou ao Congresso nesta semana.

O resultado foi uma versão do projeto repaginada (são agora mais de 230 artigos) e mais comedida, mas que mantém os pilares defendidos pelo governo.

Entre outras coisas, a Lei Ônibus concede ao Executivo a capacidade de governar sem o Congresso em quatro áreas por um ano. A saber: a administrativa, a econômica, a financeira e a energética. Antes eram 11 as áreas que estariam concentradas nas mãos de Milei.

O mecanismo não é incomum, está previsto na Constituição e já foi usado mesmo por opositores e antecessores do atual governo, como pelo ex-presidente Alberto Fernández, peronista. Ainda assim, a oposição no Congresso alegou durante toda esta segunda que se tratava de uma "abusiva delegação de tarefas" ao presidente.

O pacotão legislativo tem como outro dos principais focos a privatização. Entre as nove empresas privatizáveis estão Aerolíneas Argentinas, Enarsa (companhia petrolífera), Rádio e Televisão Argentina (comunicação) e Intercargo (de assistência às linhas aéreas) —essas quatro passíveis de total privatização.

Na proposta repaginada e apresentada pelo governo há poucas semanas também estava previsto para privatização o Banco da Nação, retirado do projeto nos últimos dias de negociação antes de chegar à Câmara.

Também foi incluído um capítulo sobre reforma trabalhista muito mais comedido do que as ambições iniciais do governo nessa área, que foram barradas pela Justiça argentina. O trecho prevê ampliação do período de experiência para seis meses, elimina multas por erros em registros trabalhistas e levanta a possibilidade de criar um fundo de demissão trabalhista que entre no lugar de indenizações.

O tema promete engrossar os protestos previstos para o feriado desta quarta-feira (1º) no país, quando se celebra o Dia do Trabalho.

A extensa lei —cujo nome "ómnibus" tem relação com a palavra em latim, com o significado de "para todos" devido à amplitude de temas— também precisaria passar pelo Senado argentino, onde o cenário para Milei formar maioria é mais complicado.

O presidente trabalha com um prazo bem específico para ver aprovado seu pacotão legislativo: dia 25 de maio. Ele convocou para essa data o chamado "Pacto de Maio" —um documento de dez prioridades que pretende assinar com os governadores. Outra tarefa, claro, nada fácil, já que enfrenta oposição dos governadores alinhados ao kirchnerismo.

A despeito dos acenos ao diálogo, nestes últimos dias o presidente afirmou que avalia não convidar todos os governadores, notadamente aqueles que não demonstrarem apoio à sua Lei Ônibus.

"A relevância do Pacto de Maio é mais política e simbólica", diz o analista político Ignacio Labaqui. "Em termos de efeitos práticos ou vinculativos, não tem impactos. Foi uma estratégia de Milei para ganhar tempo na negociação em torno do pacote fiscal e da Lei Ônibus."

Ele joga luz na questão com a história. "Em abril de 2002 [governo de Eduardo Duhalde], a maioria dos governadores assinou um documento de 14 pontos para dar um sinal de previsibilidade ao resto do mundo", lembra —o país acabara de passar pela enorme crise financeira e pelos protestos de 2001. "A política econômica da maioria dos anos seguintes não teve relação nenhuma com o que foi assinado ali."

Para ver avançar seus projetos no Legislativo, Milei tem como principal aliado o ex-presidente Maurício Macri, líder do Proposta Republicana, sigla que vota em peso com o governista Liberdade Avança.

Além disso, disputa o apoio da chamada "oposição dialoguista", que diferentemente da oposição vocal do União pela Pátria, de peronistas, ainda negocia com a Casa Rosada.

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