O STF e a prisão em segunda instância
Pedro Ladeira - 29.set.2017/Folhapress | ||
Vista da frente do Supremo Tribunal Federal, em Brasília |
Vivemos tempos de atirar pedras. Nas redes sociais, "a legião de imbecis", segundo Umberto Eco (1932-2016), adquiriu o direito de falar bobagens que bem entenderem, sem a cerimônia exigida de um prêmio Nobel. Admitir o acerto de alguém é receber uma chuva de pedras a negá-lo em si próprio. Ficou feio reconhecer que alguém acertou.
Trata-se da polêmica instalada nas hostes do direito acerca do restabelecimento da ordem no que tange à execução provisória da pena sem que tenha alcançado o trânsito em julgado da condenação.
O ministro Gilmar Mendes não precisa de defesa. Seus atos são, no plural, carregados de responsabilidades. Certos ou errados, ele responde por eles.
Interessa, aqui, apresentar a justeza de uma singular decisão de seu labor, que qualquer dos seus dez colegas ministros do Supremo Tribunal Federal se sentiria à vontade para referendar, quando, ao deferir pedido liminar, sinalizou a mudança de entendimento em relação à execução provisória da pena, suspendendo-a.
Pende, no seio da corte suprema, a definição mais amadurecida do significado prático do cumprimento das execuções provisórias de pena por decisão de segunda instância. Esse debate desce aos doutrinadores, operadores do direito e instâncias inferiores do Judiciário.
Evidente que essa afirmativa não quer desconhecer o exarado no habeas corpus 126.292, que a permitiu, sem, entretanto, impor o efeito vinculante. Muito menos o preceito constitucional da presunção da inocência (inciso LVII do artigo 5º).
O ministro Gilmar Mendes, ao tratar do tema, disse que seguiria a interpretação do ministro Dias Toffoli, para o qual a execução provisória só seria possível após decisão do Superior Tribunal de Justiça em eventual recurso apresentado à corte.
Disse Gilmar: "Muitas vezes o sujeito foi condenado em regime fechado e consegue, no STJ, direito de ir para o semiaberto, ou coisas do tipo. Toffoli trouxe argumentação, e estamos fazendo essa análise.".
E foi exatamente o que aconteceu: almejando cessar o constrangimento ilegal que sofreu um cidadão brasileiro, os signatários impetraram ordem de habeas corpus, com pedido liminar, no STF (HC 146.815), buscando justiça.
Este pedido foi motivado pelo fato de o cidadão ter iniciado cumprimento da pena sem que houvesse ocorrido o trânsito em julgado. A expectativa era de que a prisão não lhe fosse cabível. Por certo, amoldou-se por completo ao que o ministro Gilmar havia afirmado.
Ao ter a condenação confirmada em segunda instância, o réu recorreu ao STJ e teve apoio do MPF, órgão de acusação, que opinou pelo parcial deferimento para readequar a pena, pois, de igual modo, entendia ter sido esta demasiada.
Na análise do mérito, o STJ decidiu pela redução da pena, alterando-a de prisão para restritivas de direitos. Ou seja, antes mesmo da análise do recurso, ao deferir o pedido liminar no STF, o ministro Gilmar Mendes fez justiça.
O tema é por demais relevante para ser simplificado nas circunstâncias do momento. Uns capitulam, outros se escondem no momento de defesa do Estado de Direito. As violações e as exceções impõem medo à sociedade, ludibriada pelo mantra de se fazer justiça.
Mas, não se enganem, a justiça não é sinônimo de prisão e condenação, como vem sendo difundido. O ministro Gilmar Mendes estava certo!
JOÃO PAULO CUNHA, ex-deputado federal pelo PT e ex-presidente da Câmara, é advogado
LUÍS ALEXANDRE RASSI e ROMERO FERRAZ FILHO também são advogados; todos são do escritório Rassi & Ferraz Advocacia Criminal
PARTICIPAÇÃO
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