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Gustavo Ferraz de Campos Monaco

Nascidos entre 1º de abril e 30 de junho de 2013 e vida escolar iniciada

Idade mínima para entrar no fundamental pode criar novas formas de segregação

Alunos da rede pública do ensino infantil do Balneário Camboriú (SC)
Alunos da rede pública do ensino infantil do Balneário Camboriú (SC) - Bruno Santos - 25.mai.17/Folhapress

Em sessão plenária no último dia 1º, o STF decidiu o mérito de duas ações correlatas que colocavam em causa decisão do Conselho Nacional de Educação acerca da idade para fins de ingresso na educação infantil e no ensino fundamental.

A apertada maioria é ínsita a decisões colegiadas e merece ser respeitada tanto quanto uma decisão unânime. O posicionamento institucional e a colegialidade devem prevalecer.

As razões substanciais que levaram o Conselho Nacional de Educação a modificar o marco temporal para ingresso do meio do ano para o final do primeiro trimestre foram aplaudidas por educadores.

Há que se aguardar a publicação do acórdão, mas fica questão em aberto a merecer atenção, devendo ser modulada. Um enorme contingente de crianças, nascidas entre 1º de abril e 30 de junho de 2013, completará seis anos em 2019. Boa parte delas, inseridas no sistema educacional público (estadual ou municipal) ou privado, cursando o que se convenciona chamar Jardim II.

O que será feito dessas crianças? Serão separadas de seus colegas de classe e obrigadas a “cursar” novamente o ciclo, com repetição de atividades lúdicas ou formativas, de conteúdos concretos ou abstratos? Serão impedidas de frequentar a escola em 2019 por não se enquadrarem nos novos critérios e terem já frequentado o ano anterior ao primeiro ano? Irão as escolas estabelecer “turma de transição”, naturalmente pequena?

Afinal, os alunos mais velhos (nascidos depois de 1º de julho de 2012) poderão caminhar para o primeiro ano, já que estão completando seis anos no curso deste semestre, o mesmo ocorrendo com os nascidos entre 1º de janeiro e 31 de março de 2013, alcançados pelo novo critério.

O risco de fazê-las repetir o ciclo é o da desmotivação: tendo já realizado as etapas daquele planejamento, qual a razão para —tendo havido pleno aproveitamento— forçá-las a rever o conteúdo? É preciso ponderar, ainda, que para muitos pais, a escola é a opção para o entretenimento com conteúdo e segurança dos filhos durante suas jornadas de trabalho.

Por outro lado, retirar a criança do convívio escolar —para aqueles que puderem se dar a esse “luxo”— pode adquirir a significação de pouca importância da rotina e das obrigações, descortinando o ócio e o lazer plenos.

Por fim, o estabelecimento de turmas de transição para os que tiveram a sorte ou a desventura de nascer no período não significará certo estigma? Por que não puderam avançar para o primeiro ano com o restante da turma? Nesses tempos de constante atenção com bullying e outras formas de intimidação social, não parece ser necessário criar novas formas de segregação.

Assim é que, sem contestar o mérito da proposta do Conselho Nacional de Educação nem a decisão do STF, deixo aqui proposta de modulação dos efeitos que a medida gerará no sistema educacional: que se aplique como critério apenas para os que não frequentavam a escola até a data da publicação do acórdão.

Gustavo Ferraz de Campos Monaco

Professor de direito internacional da Faculdade de Direito da USP e autor de diversos livros sobre direitos das crianças

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