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Inglacir Delavedova

Pais que não vacinam os filhos devem ser multados? SIM

A negligência pode custar caro

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O tema está em debate: a negativa em vacinar crianças e adolescentes pode gerar a aplicação de multa aos responsáveis. Antes, convém trazer outros aspectos para a discussão.

É bom lembrar o que a Constituição Federal estabelece em seu artigo 227: "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, ... além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência..."

Da norma constitucional derivam direitos e princípios, que foram explicitados e regulamentados no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente, lei 8.069/90). A partir dessas regras, todas as crianças e adolescentes passaram a ser sujeitos de direitos, que possuem prioridade absoluta e podem ser exigidos a qualquer tempo e de qualquer um, em detrimento de interesses conflitantes, inclusive de seus pais ou responsáveis.

Além disso, contam com o princípio da proteção integral e do melhor interesse da criança ou adolescente, postos no ECA. Partindo dessas premissas legais, chegamos ao artigo 14, que torna obrigatória a vacinação; ao artigo 22, que estabelece os deveres parentais; e ao artigo 249, que prevê a aplicação de multa. Assim, qualquer que seja o violador dos direitos está sujeito a ser responsabilizado por isso.

Então, cabe ao Estado, por seus agentes, a tomada de medidas para garantir o direito à saúde, mesmo que isso implique conflito de interesses com os responsáveis, havendo medidas que possam ser tomadas para a efetivação desses direitos, tais como a busca e apreensão para a aplicação da vacina, medida mais efetiva que a multa propriamente dita.

Há quem se insatisfaça com a interferência estatal na vida privada, que não se resume ao caso das crianças e adolescentes, e na limitação dos direitos decorrentes do poder familiar, mas isso existe em diversas outras normas legais no nosso sistema jurídico, sem que haja qualquer irregularidade nisso.

Outrossim, há que se considerar a possível aplicação do artigo 268 do Código Penal, já que as vacinas para o público infanto-juvenil estão inseridas no Programa Nacional de Imunizações. Afora as considerações legais, há que se levar em conta as consequências fáticas da negativa injustificada, ou seja, aquela que não é motivada por critérios médicos. 

Há muita desinformação na internet, as fake news, que contribuem para a disseminação de informações sem fundamento científico ou baseadas em estudos já desmentidos e que trazem imenso prejuízo à saúde de quem deveria ser protegido.

Devemos considerar que há mais de uma geração que foi vacinada e não sofreu os efeitos negativos de ter sequelas graves ou ter ido a óbito, como no caso da varíola, já sem registro de casos pela OMS desde 1980.

Mas também podemos encontrar diversas pessoas que conhecem, em seu círculo de relacionamentos ou familiar, quem tem as marcas resultantes das doenças graves, tais como sarampo e poliomielite (que poderiam ter sido prevenidas), ou até mesmo os que não sobreviveram.

As reações alérgicas à vacina nem sempre são previsíveis —assim como as reações alérgicas em geral, tanto a alimentos como medicamentos— e não devem servir como justificativa, se não eram conhecidas previamente. Ao fim e ao cabo, como referimos, a multa pode ser o menor dos problemas, se comparado à culpa pelas sequelas ou pela morte.

Inglacir Delavedova

Formada em direito pela PUC-RS e diretora da Promotoria da Infância e Juventude de Porto Alegre

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