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Sufoco argentino

Situação financeira do país se revelou mais frágil do que o imaginado

Quadro político se deteriora para o presidente argentino, Mauricio Macri
Quadro político se deteriora para o presidente argentino, Mauricio Macri - Marcos Brindicci/Reuters

Difícil imaginar um país onde o pêndulo entre populismo e austeridade na gestão da economia oscile de maneira tão intensa como na Argentina. Com o esgotamento do kirchnerismo e a chegada de Mauricio Macri ao poder em dezembro de 2015, a alternância se deu na direção da ortodoxia.

Entretanto as expectativas de um desempenho virtuoso se frustraram. Nos últimos meses a situação financeira do país se revelou mais frágil do que o imaginado por investidores e autoridades.

Após acentuada perda de valor do peso e um salto da inflação, o governo optou em maio por recorrer ao Fundo Monetário Internacional, decisão que implica grande custo político para Macri.

A administração teve de se comprometer a antecipar em um ano, para 2020, o objetivo de eliminar o déficit primário —quando as receitas se mostram insuficientes para cobrir as despesas públicas, mesmo sem considerar os encargos com juros da dívida.

O rombo argentino deve equivaler neste ano a 2,7% do Produto Interno Bruto. A cifra brasileira é menor (embora nossas contas estejam em situação pior quando se considera a despesa com os juros, conforme texto acima), e não se projeta um reequilíbrio tão rápido.

Em troca da aceleração do ajuste, o FMI ofereceu crédito de US$ 50 bilhões ao país vizinho —cujo governo se empenha em evitar uma recaída recessiva que comprometa as chances de reeleição de Macri no final do próximo ano.

Ao que parece, no entanto, também o organismo internacional subestimou o problema. Nos últimos dias o peso voltou a despencar. Com a inflação próxima de 30% anuais, o banco central elevou os juros para estratosféricos 60%.

Fica claro, hoje, que o programa liberal argentino foi por demais otimista em sua estratégia de ajuste gradual do Orçamento —contava-se que haveria ampla oferta de empréstimos em moeda forte, dos quais o país depende para cobrir o déficit, e confiança dos mercados na equipe econômica.

Entretanto o cenário internacional se afigura hoje mais hostil aos emergentes, dado que as taxas de juros americanas estão em alta.

Para Macri, também o quadro político se deteriora. Pesquisas mostram queda aguda de sua aprovação, de mais de 50% para algo mais próximo de 30%. A hipótese de derrota eleitoral ficou mais próxima, o que por sua vez assusta credores.

Se o Brasil vive situação distinta, por não depender de capital estrangeiro, a crise ao lado alerta que o prazo para o conserto das contas públicas se tornou mais exíguo.

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