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Preservar a PF

Ingerência de Bolsonaro explicita urgência de tratar órgão como ente de Estado

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Sergio Moro anuncia sua saída do Ministério da Justiça - Pedro Ladeira/Folhapress

O estupefaciente pronunciamento de despedida de Sergio Moro do Ministério da Justiça e Segurança Pública jogou luz sobre uma velha conhecida da política brasileira: a interferência do governo em órgãos que deveriam ser de Estado.

Segundo o relato do ex-ministro, Jair Bolsonaro o fez saber da intenção de alterar o comando da Polícia Federal. A tosca negativa do presidente em sua réplica agora será objeto de exame na Justiça, caso prospere o inquérito pedido pela Procuradoria-Geral da República.

Como não apresentou razões objetivas, afirmou Moro, Bolsonaro foi inquirido acerca de uma justificativa para o fato. O presidente disse, conforme a versão, que era meramente uma questão política.

Ato contínuo, falou sobre a necessidade de poder ligar diretamente para o diretor, consultar relatórios de inteligência. E acerca do temor com o desenrolar das investigações do Supremo Tribunal Federal de seu interesse.

Tais apurações são conhecidas: versam sobre a fábrica de fake news que acompanhou a ascensão do bolsonarismo no país e, agora, sobre os atos golpistas prestigiados pelo presidente em pessoa.

Além disso, tira o sono do mandatário máximo a arqueologia das práticas de seu clã no Rio, por meio dos inquéritos centrados nas relações com práticas ilegais e personagens ligados a milícias.

A autonomia de fato da PF é uma conquista relativamente recente. Foi provada ao longo dos anos do PT no poder, quando, mesmo subordinada a ministros da Justiça que por vezes agiam como advogados do presidente, a entidade apurou inúmeros casos de corrupção.

Em 2018, um diretor-geral simpático às agruras do então presidente Michel Temer (MDB) durou apenas 99 dias no cargo. Apesar deste exemplo virtuoso, é necessário ressaltar que autonomia não significa ausência de controle, prestação de contas e transparência.

A memória de episódios de abuso como a Operação Satiagraha, em 2004, traz lição cautelar.
Isso dito, urge aproveitar a gravidade da situação atual para implementar um sistema que garanta as características de entidade de Estado inerentes ao trabalho da PF.

Um diretor submetido a sabatina no Senado, a exemplo do que se faz no americano FBI, seria desejável, talvez também com mandato.

O reforço da musculatura de corregedoria, também. E uma apuração exemplar dos fatos relatados por Moro, para que a história não venha a se repetir como farsa.

Enquanto isso, medidas como a determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, de preservação dos delegados federais que investigam o caso das fake news constituem, sim, paliativos importantes.

editoriais@grupofolha.com.br

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