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Marilda Silveira

A falta de regras claras compromete a funcionalidade dos mandatos coletivos? SIM

Sem regulamentação, modelo vigoroso provoca insegurança jurídica

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Marilda Silveira

No Brasil, a eleição para vereadores e deputados tem muitas complexidades. Duas, contudo, chamam a atenção quando buscamos entender as candidaturas coletivas: elevado custo de campanha, potencializado pelo número de concorrentes e pela extensão do território em disputa, e competição entre candidatos do mesmo partido, que acaba causando enorme desconexão com o eleitor e dispersão de pautas.

Sem reforma política, os candidatos com poucos recursos e muita criatividade deram um novo formato às suas campanhas: retiraram os apoiadores e cabos eleitorais do anonimato, formaram alianças e anteciparam a composição do gabinete, unindo forças no que autointitularam candidaturas coletivas, cocandidaturas e/ou mandatos coletivos.

As vantagens são evidentes: previne a dispersão de votos da mesma pauta, aumenta a representatividade do grupo, amplia a capacidade de arrecadação e de apoiamento e dá maior visibilidade ao grupo e às suas propostas.

Buscando dar legitimidade ao modelo, termos são assinados, contendo o compromisso de que todos os cocandidatos ocuparão funções no gabinete e que as decisões serão tomadas em conjunto.
Contudo, a ausência de regulamentação tem comprometido a funcionalidade do modelo desde a campanha, mas, sobretudo, no exercício dos mandatos.

Os obstáculos começam já no registro da candidatura, que somente admite um pleiteante com nome de urna que o identifique. Portanto, qualificações ou propagandas que levem o eleitor à crença de que está elegendo um grupo são proibidas.

Por evidente, apenas o candidato registrado terá aferida suas condições de elegibilidade/inelegibilidades, será eleito, diplomado e tomará posse. Significa dizer que apenas este candidato eleito exercerá o mandato para todos os fins constitucionais.

Daí surgem infindáveis questionamentos que seguem sem resposta e mantêm a instabilidade do modelo: 1 - esse compromisso de colegialidade tem algum valor?; 2 - quais as consequências da cisão do grupo que se apresentou ao eleitor?; 3 - regras “interna corporis” para solução de divergências ou cisões no grupo têm valor jurídico?; 4 - a responsabilidade pela prática de atos parlamentares pode ser compartilhada?; 5 - as garantias asseguradas constitucional e legalmente para o regular exercício do mandato podem ser expandidas ao grupo?; 6 - o modelo faria sentido apenas para candidaturas proporcionais ou também para prefeito, governador e presidente?; 7 - a posição adotada por quem foi eleito —e efetivamente detém o mandato— poderia ser suplantada pela opinião da maioria do coletivo?; 8 - o mandato coletivo pode envolver mais de um partido?; 9 - covereadores e codeputados podem mudar de legenda?; 10 - como interpretar as normas constitucionais de proporcionalidade e funcionamento parlamentar nesse cenário?; 11 - a vontade do eleitor direcionada ao grupo tem algum impacto jurídico no exercício do mandato?; e 12 - havendo condenação por ilícito eleitoral, a inelegibilidade atingiria a todos?

Essas são algumas das muitas perguntas sem resposta que, longe de invalidar a engenharia do modelo e suas inúmeras vantagens, tornam mais evidente a necessidade de regulamentação para que tamanha insegurança jurídica não siga comprometendo sua funcionalidade.

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