Descrição de chapéu
Vários autores

A negligência ambiental brasileira aos olhos do mundo

País não pode mais fragilizar leis e ficar para trás na economia verde

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

VÁRIOS AUTORES (nomes ao final do texto)

Os últimos dias foram marcados por protestos dos povos originários na Esplanada do Ministérios contra a aprovação do projeto de lei 490, que altera as regras de demarcação das terras indígenas, e também pela queda do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. No mês passado, a imagem do Cristo Redentor, agora usando uma máscara de oxigênio, voltou à capa de uma das mais importantes revistas do mundo, como símbolo da “Década sombria do Brasil”. O mundo está de olho no país, nas escolhas que estamos fazendo e na forma com a qual tratamos os ativos ambientais, que agora estão no centro das atenções.

A emergência climática tem levado países como os Estados Unidos e o Reino Unido a assumirem o compromisso público de reduzir no mínimo em 50% as emissões de gases de efeito estufa até 2030 e de neutralizá-las até 2050. Essas decisões são reflexo da nova economia e geopolítica mundial, que enxerga a questão climática como componente estrutural. O Brasil, no entanto, insiste em ficar na contramão.

Após conflito com a PM, índios protestam próximo à entrada Câmara dos Deputados, em Brasília - Pedro Ladeira - 22.jun.21/Folhapress

Somos o quinto maior emissor mundial de gases de efeito estufa, e mais de 40% das nossas emissões são advindas do desmatamento. Os dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) de junho mostram que estamos longe de atingir as reduções que prometemos publicamente durante a Cúpula do Clima em abril: batemos, pela terceira vez seguida, o recorde mensal de desmatamento da Amazônia Legal. Justamente quando deveríamos estar combatendo o desflorestamento, o governo federal reduz em 26% o orçamento para a fiscalização do meio ambiente, fragilizando órgãos como Ibama e ICMBio.

Essa negligência foi precificada e contabilizada: a devastação ambiental da região vai representar prejuízo de R$ 5,7 bilhões por ano até 2050, com especial queda da produtividade do setor do agronegócio, segundo artigo publicado na revista científica "Nature Communications".

Nas próximas semanas, mais projetos polêmicos como o PL 490 vão entrar em pauta no Congresso Nacional, e os parlamentares terão a chance de intervir nesse cenário e impedir a ampliação de retrocessos ambientais. Quatro proposições são particularmente importantes nesse sentido, a começar pelos projetos de Lei 510/2021, do Senado Federal, e 2633/2020, da Câmara dos Deputados, que pretendem flexibilizar o processo de regularização fundiária, ampliando a concessão de títulos de propriedade àqueles que ocuparam irregularmente terras públicas, o que pode estimular a prática ilegal da grilagem.

Outra pauta importante é o PDL (projeto de decreto legislativo) 177/2021 que, se aprovado na Comissão de Relações Exteriores da Câmara, irá autorizar o Brasil a sair da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), um dos poucos instrumentos legais que asseguram aos indígenas o direito de serem consultados previamente sobre decisões que impactam suas vidas e territórios, algo fundamental no caso brasileiro.

Por último, os senadores poderão rever a aprovação inicial do PL 3729/04, que, a pretexto de criar a necessária Lei Geral de Licenciamento Ambiental, permitiu a isenção de licença para 13 atividades, além do polêmico autolicenciamento para as demais.


O mundo despertou para a emergência climática, e muitos países estão se adaptando a uma nova visão de desenvolvimento, na qual os ecossistemas terrestres, base da vida no planeta, deixam de ser encarados como recursos infinitos à disposição da humanidade para a produção de riqueza. O Brasil precisa dar esse passo se não quiser ficar no passado.

É o momento de demonstrar que há parlamentares que entendem que bens ambientais são bens públicos e patrimônio coletivo, dispostos a combater a fragilização das leis ambientais e a negligência à economia verde. É momento de mostrar que, a despeito do governo federal, há políticos dispostos a fazer as escolhas capazes de colocar o país na direção da política econômica do século 21.

Leila Barros
Senadora da República (PSB-DF)

Eduardo Costa
Deputado federal (PTB-PA)

Professor Israel Batista
Deputado federal (PV-DF)

Leo de Brito
Deputado federal (PT-AC)

Rodrigo Agostinho
Deputado federal (PSB-SP)

Raul Henry
Deputado federal (MDB-PE)

Rafael Motta
Deputado federal (PSB-RN)

Tabata Amaral
Deputada federal (sem partido)

Mônica Sodré
Cientista política e diretora-executiva da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps)

* Todos os autores são membros da Raps

TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.