Durou muito, demais até, a permanência de Ricardo Salles à frente do Ministério do Meio Ambiente. Mesmo num governo dado à pirraça, como o de Jair Bolsonaro, sua manutenção no cargo nada agregava de benéfico para a Presidência.
Para o Brasil, então, Salles só acarretava opróbrio. Para além dos resultados sinistros de sua gestão, já afrontava o senso de decoro a preservação de um administrador investigado pela Polícia Federal sob suspeita de favorecer exportadores de madeira ilegal.
A folha corrida do auxiliar tardiamente defenestrado é longa. No alto figura a famigerada recomendação, em reunião ministerial de abril de 2020, de aproveitar a atenção dada à pandemia para “passar a boiada” da desregulamentação às cegas do setor ambiental.
Seria só mais uma declaração abjeta no recesso palaciano, ainda que sincera, não correspondesse a ações funestas para o patrimônio natural brasileiro. Ao longo da gestão de Salles, o desmatamento da Amazônia voltou aos cinco dígitos, saltando para 10 mil km² no primeiro ano do governo Bolsonaro e para 11 mil km² em 2020.
Neste ano, a devastação campeia mais uma vez. O alarme chegou ao vice-presidente Hamilton Mourão, que anunciou a volta das Forças Armadas à linha de frente contra o desmate. De novo o Planalto despenderá milhões de reais para contingentes sem experiência realizarem o combate que caberia precipuamente ao ministério.
A razão parece óbvia: Salles obteve sucesso em manietar e aleijar os órgãos de fiscalização e controle sob sua alçada, Ibama e ICMBio.
Tamanha dissociação administrativa representa o melhor sintoma de que, sob Bolsonaro, não se busca de fato resolver nada na Amazônia ou fora dela, somente multiplicar operações cenográficas para o público internacional.
Salles e seu chefe escolheram o lado do agronegócio predador, dos garimpeiros e madeireiros ilegais, dos grileiros que usurpam unidades de conservação e áreas indígenas e outras terras da União.
Na missão ecocida, Bolsonaro e Salles sempre contaram com o apoio da bancada ruralista do Congresso. Nem Bolsonaro nem o Parlamento mudaram. Sai o ministro, segue a política desastrosa.
O presidente nomeou para a pasta Joaquim Pereira Leite, secretário da Amazônia e Serviços Ambientais. Como Salles, tem no currículo passagem pela Sociedade Rural Brasileira. A ver se logrará um mínimo de conciliação entre os interesses dos produtores e a preservação ambiental, como sempre propala a ala mais esclarecida do setor.
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