Descrição de chapéu
Marcos Fábio Belo Matos

Novas universidades: o que a Folha não disse

Comunidades universitárias lutam há anos por autonomia financeira

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Marcos Fábio Belo Matos

Vice-reitor da UFMA (Universidade Federal do Maranhão), é jornalista e professor dos Cursos de Jornalismo e Pedagogia do CCSST (Centro de Ciências Sociais, Saúde e Tecnologia)

A reportagem "MEC prepara projeto para criar cinco universidades em redutos do centrão" (24/10), publicada na Folha, peca em abrangência e consistência. A reportagem traz dados, estatísticas e extratos de vozes que, ao fim e ao cabo, tentam afirmar que todos os projetos de criação de novas universidades e institutos federais são fruto apenas da negociação política entre governo e centrão. Mas faltou à Folha dizer algumas coisas. Coisas que ou não sabia ou não quis dizer. E por isso construiu uma verdade canhestra.

Faltou à Folha dizer que nem todos os dirigentes de Ifes (Institutos Federais de Ensino Superior) são contrários à criação de universidades. O jornal fez questão de trazer as falas dos reitores que não apoiam a criação das universidades. Mas deixou de fora o fato de que, por exemplo, a UFMA aprovou no dia 24 de setembro de 2020, no seu Conselho Superior, uma "Moção de Apoio à Criação de uma Nova Universidade Federal do Maranhão". Bastava pesquisar.

0
Milton Ribeiro, ministro da Educação, durante cerimônia no Palácio do Planalto - Pedro Ladeira - 11.ago.21/Folhapress

Também faltou ao jornal destacar que, em muitos desses atos de criação de novas universidades e institutos, está embutida uma luta de muitos anos das comunidades universitárias pela busca de autonomia —principalmente financeira. No caso do Maranhão, a luta pela criação de uma nova universidade remonta a 1996 e já teve ao menos quatro tentativas: Ufpam, Univat, Ufmasul e, agora, Ufama. Não é, portanto, uma luta nova nem tampouco vinculada apenas a vontades políticas. Lutando por ela, atualmente, existe um movimento chamado Nova Federal Maranhão e o esforço do senador Roberto Rocha (PSDB-MA).

Faltou igualmente ao jornal explicar que esses projetos de universidade não criam cursos novos, mas já nascem, muitos deles, com uma estrutura consolidada. É o caso do projeto da Ufama, que vai herdar da UFMA sua estrutura de móveis, imóveis e pessoal, além de 15 cursos de graduação, 5 de mestrado e 1 de doutorado.

O jornal cita o caso da UFDPar, recém-desmembrada da UFPI e que fica em Parnaíba (PI), para, por meio de declaração do reitor da UFPI, dizer que o processo de desmembramento deixou pontos negativos. Mas talvez fosse mais efetivo ouvir os reitores das universidades recém-desmembradas para saber o que eles pensam desse desmembramento; ou ainda para verificar, com a própria comunidade, como estão essas universidades depois da divisão.

Há ainda muitas outras questões que talvez valesse a pena abordar, como o ganho para as regiões onde essas universidades e institutos vão se instalar; a potencialidade que elas têm para gerar, no médio e longo prazo, novos cursos; a dificuldade que muitos desses campi sentem em viver isolados; o aporte de pesquisas que vão gerar etc.

A Folha deveria ter ouvido quem realmente está vinculado à questão do desmembramento para colher, no caso do jornalismo (sobretudo aquele feito como reportagem), o melhor retrato, a melhor "verdade dos fatos". Mas isso, infelizmente, não aconteceu. E a consequência é que a matéria acaba por forjar uma verdade desfocada.

TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.​

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.