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O que a Folha pensa

Regular o lobby

Projeto é bom ponto de partida, mas terá de superar a inércia do Legislativo

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Cerimônia no plenário da Câmara dos Deputados - Pedro Ladeira/Folhapress

Um pacote anticorrupção proposto pelo governo de Jair Bolsonaro decerto não inspira grande confiança. Mas há medidas interessantes entre as recém-anunciadas —e merece destaque o projeto de lei que regulamenta o lobby no país.

Embora os termos "lobby" e "lobista" não gozem da melhor das reputações por aqui, a atividade pode ser perfeitamente legítima e legal, uma extensão do direito de peticionar consagrado na Constituição.

Para que o lobby legítimo prevaleça sobre a corrupção e o tráfico de influência, que seriam suas versões degeneradas, é importante que a atividade ocorra sob o primado da transparência e sob regras claras previamente estabelecidas.

O projeto do governo se afigura uma peça bastante técnica, elaborada pela Controladoria-Geral da União, sob inspiração da extensa documentação que a OCDE produziu sobre a matéria.

O texto escapa de velhas armadilhas. Tentativas anteriores de disciplinar o lobby vieram na forma de regulamentação profissional —o que não funciona bem, dado que indivíduos das mais diversas formações, de cientistas a relações públicas, passando pelos influenciadores digitais, podem em princípio fazer as vezes de lobistas.

Em vez disso, o objetivo é regular os relacionamentos entre agentes públicos e a representação de interesses privados por todas as pessoas naturais ou jurídicas.

Também é positiva a insistência do projeto em fomentar a transparência ativa, cobrando o registro e a publicação de todas as interações entre agentes públicos, compreendidos em sua concepção mais ampla, que inclui estatais e fundações, e lobistas, com um detalhamento mínimo do assunto tratado e em tempo hábil (sete dias).

Falta definir melhor os casos em que cabe sigilo, e é preciso deixar mais claro que eles precisam ser exceções. O governo Bolsonaro mostrou que as autoridades não hesitam em decretar sigilo mesmo quando obviamente indevido.

Outro ponto que comporta aperfeiçoamentos é o da distribuição de brindes, presentes e hospitalidades. Nos dois primeiros, o que a experiência dos médicos ensina é que mesmo a distribuição de canetas e calendários com o nome de drogas e laboratórios tem efeito sobre as prescrições.

Isso ocorre porque a mera visão repetida de nomes e logomarcas exerce um efeito que age abaixo do radar da consciência. Já hospitalidades são mais difíceis de regular, mas, ao contrário de presentes, podem servir ao interesse público.

O projeto é um bom ponto de partida para os debates. Cumpre apontar que iniciativas para regulamentar o lobby pipocam no Congresso há décadas sem que tenham avançado. Parece haver um forte lobby para que tudo permaneça como está —nas sombras.

editroiais@grupofolha.com.br

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