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Raisa Pina, Fabio Vaz Ribeiro de Almeida e Lívia Carvalho Moura

Cerrado sob risco

Inpe precisa manter monitoramento na savana mais biodiversa do mundo

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Raisa Pina

Doutoranda em antropologia (UnB) e assessora do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN)

Fabio Vaz Ribeiro de Almeida

Antropólogo, mestre em sociedade, agricultura e desenvolvimento (CPDA/UFRRJ) e coordenador-executivo do ISPN

Lívia Carvalho Moura

Geógrafa, doutora em ecologia (UnB) e assessora técnica do ISPN

O fim dos recursos do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) para monitoramento do desmatamento no cerrado é um problema de segurança global. O bioma é fundamental para o equilíbrio ambiental do planeta e concentra as áreas de maior expansão de monocultura para exportação a países que vêm sofisticando a legislação sobre sustentabilidade. Interromper o monitoramento significa contradizer compromissos assumidos pelo Brasil há três meses na COP26. Os prejuízos econômicos são certos, considerando boicotes levantados por redes europeias de supermercados sobre produtos brasileiros.

O histórico de grilagens, desmatamentos ilegais e incêndios criminosos fez o cerrado perder metade de sua vegetação original e apresentar velocidade crescente de perda do que resta. A região que compreende as fronteiras dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia (Matopiba) é a mais ameaçada pela concentração de uma expansão descontrolada do agronegócio e de altos índices de conflitos agrários.

Área de cerrado desmatada para o plantio de soja no entorno da bacia do rio dos Couros, na Chapada dos Veadeiros - Lalo de Almeida - 22.dez.21/Folhapress

Não monitorar o cerrado permanentemente significa favorecer criminosos, incentivar a violência e condenar brasileiros a apagões de energia, aumento da poluição do ar por incêndios e escassez hídrica.

Por ser uma savana e ter características diferenciadas de outros biomas florestais, o cerrado sofre com a falta de reconhecimento da sua importância. Um estudo publicado no "Journal of Applied Ecology" revela a prevalência das florestas em estudos científicos e no debate público das redes sociais. Cerca de 70% dos estudos de restauração analisados concentraram-se em florestas, apesar de os biomas não florestais (como é o caso do cerrado) se estenderem por 57,1% da faixa tropical e subtropical do planeta.

Outra desatenção sobre o cerrado é com relação a suas comunidades tradicionais. Um levantamento realizado no Matopiba por ISPN (Instituto Sociedade, População e Natureza), Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) e Rede Cerrado mostrou que existem 3,5 vezes mais comunidades tradicionais na região do que mostram os mapas oficiais. Considerando a insegurança jurídica de diversos territórios localizados no cerrado, o monitoramento do desmatamento no bioma representa também uma política pública de proteção a essas populações ainda invisibilizadas.

Considerando a importância do bioma aqui ressaltada, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações e o Ministério do Meio Ambiente devem viabilizar orçamento permanente junto ao Ministério da Economia para a manutenção do Prodes/Deter Cerrado (projeto de monitoramento do cerrado). O valor anual para custeio da equipe é irrisório, considerando o Orçamento nacional e os prejuízos de curto e de longo prazo que a nação sofreria por perder uma de suas principais fontes de água e energia, sem contar a vasta riqueza socioambiental da savana mais biodiversa do mundo.

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