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Retrocesso sobre aborto nos EUA serve de alerta para o Brasil

Quase metade dos estados americanos podem vir a proibir a interrupção da gravidez

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Fernanda Perrin

Editora-adjunta de Mercado e mestre em ciência política pela USP

Ao que tudo indica, os Estados Unidos devem em breve se juntar ao seleto grupo de países formado por Polônia, El Salvador e Nicarágua que vêm restringindo o direito ao aborto desde 1994.

A reviravolta no entendimento da Suprema Corte americana consta em rascunho vazado —algo inédito para a instituição— da minuta da votação inicial sobre a sentença Roe vs. Wade, que estabeleceu o direito à interrupção da gravidez em 1973.

Manifestante segura cabide, ferramenta utilizada em abortos clandestinos, durante protesto contra a indicação de que a Suprema Corte americana deve mudar a orientação sobre o direito ao procedimento no país - Evelyn Hockstein/Reuters

Caso a decisão se confirme, cerca de metade dos estados americanos, concentrados principalmente no sul, deve proibir o aborto, de acordo com estimativa do Center for Reproductive Rights.

Nesse cenário, a rede de clínicas deve encolher, e mulheres terão que se deslocar para regiões mais distantes para conseguir um aborto legal. O resultado deve ser uma queda de 14% no número de procedimentos no país, segundo reportagem do The New York Times.

Algumas empresas, como a Apple e o Citigroup, já estão custeando a viagem de funcionárias que moram em estados que dificultaram o acesso ao direito para localidades em que consigam realizar um aborto.

A mudança na legislação, portanto, deve penalizar sobretudo as mulheres mais vulneráveis: desempregadas, sem dinheiro, tempo ou rede de apoio para enfrentar longas distâncias em busca do procedimento —justamente o perfil predominante daquelas que fazem um aborto no país.

(Sem novidades até aqui.)

Mesmo tamanho retrocesso não fará os EUA andarem para trás a ponto de alcançar o Brasil, país que se destaca entre aqueles com uma das legislações mais restritivas do mundo —o procedimento é legal apenas em caso de estupro, anencefalia do feto ou risco de morte para a mulher.

Ainda assim, o governo Bolsonaro atuou para limitar a já reduzida autonomia das mulheres sobre seus direitos reprodutivos, ao tentar dificultar o procedimento mesmo nos casos autorizados por lei.

Uma eventual derrota do presidente em sua tentativa de reeleição não vai eliminar essa ameaça. Trump saiu da Casa Branca, mas os três juízes apontados por ele, fundamentais para a reversão da Roe vs. Wade, continuarão na corte por décadas.

As notícias dos EUA são um alerta sombrio: as sequelas institucionais e políticas do trumpismo e do bolsonarismo vieram para ficar.

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